Antes de Sailor Moon

ANTES DE SAILOR MOON

Miguel Carqueija

 

Quando Serena (Tsukino Usagi) ainda era uma desatenta, desmiolada e sonhadora estudante no Ginásio Juuban Júnior, já existia uma “sailor-scout” em ação. Era Sailor Vênus, aliás Mina (Aino Minako), que atuava em Londres, acompanhada pelo gato guardião e falante Artêmis. Apesar de sua pouca idade — treze anos — era coquete e faceira, e profundamente absorvida em sua missão de defender a civilização.

 

 

Imagine uma garota magra, de bastos cabelos louros, compridos, escorridos, maravilhosos, caindo em franjas na testa. Um olhar vivo, amável e sonhador. Sua roupa é estranha, fazendo lembrar uma marinheira: uma gola típica, enorme e laranja, uma imensa fita azul no peito, com um coração no meio, outra fita, esta avermelhada, nos cabelos e um diadema em “V” na testa, um saiote e sapatos tipo de bailarina. Uma garota linda, de treze anos apenas. Sentada em uma cadeira meio desconjuntada, Mina tem as mãos atadas para trás por uma corda. A menina tem pisaduras no rosto e aparenta um certo desânimo. À sua volta, cinco homens e uma mulher falam em tom ameaçador e debocham. O local é uma espécie de galpão, de oficina para carros enguiçados ou usados. É noite e as luzes, fracas e lúgubres, estão acesas.

Os olhos de Mina estão meio fechados, como se não lhe agradasse assistir a cena da qual é o centro. Um dos homens, de casaco surrado e charuto na mão direita, fala para ela de pouca distância.

— Então esta é a famosa Sailor V e está em nosso poder. Afinal, não é tão poderosa assim. Onde está o seu gato?

Como ela não respondesse, ele encostou a ponta acesa do charuto em seu braço esquerdo, provocando uma contração de dor. Mina, porém, não gritou nem chorou, contendo até o gemido.

— Eu fiz uma pergunta — disse o brutamontes.

— Eu... não sei onde ele está...

— Não importa. Será mais um gato sem dono. Você é muito bonita, sabe? Não é mesmo, gente?

Observações vulgares fizeram-se ouvir e o chefe prosseguiu:

— Em homenagem à sua beleza, nós faremos com você uma sessão múltipla de namoro. Aproveite porque será o seu último prazer na vida.

— Eu estou fora disso — falou a mulher do grupo.

— Pode ficar observando — disse ele. — Bom, e depois sabe o que nós faremos, Sailor V? Como não gostamos de barulho, usaremos as nossas facas. Espero sinceramente que você não demore muito a morrer.

Mina abriu bem os olhos. O homem iniciou um movimento em direção a ela, como para agarrar as suas vestes.

Sailor Vênus se ergueu de repente. O seu pé direito atingiu de ponta a região baixa de seu adversário, que se contorceu numa explosão de dor. No momento seguinte, com as mãos incrivelmente livres, Mina abraçou-se à cintura do bandido e se apossou de sua arma. Era muito rápida. Antes que os outros compreendessem o que estava acontecendo, o tiroteio já havia começado. Dois tombaram mortos ali mesmo. Os outros reagiram, mas os primeiros tiros pegaram apenas o escudo humano de Mina que, largando o bandido, pulou o mais longe que pôde para o chão, rolando e chegando aos engradados, atrás dos quais se colocou.

 

— Oh, meu Deus! Vou chegar atrasada de novo! O que é que eu vou dizer lá?

Arrojando a colcha com motivos de mais-luas e coelhos, Serena pulou da cama e imediatamente escorregou na bola de tênis que esquecera no chão. Caiu sentada e mais nervosa ainda.

— Oh, não! Tudo me acontece! — e começou a chorar...

Mas correu para o chuveiro e depois para o guarda-roupas quase tão rapidamente quanto o Super-Homem.

— Papai e mamãe vão reclamar de novo! Mas o pior vai ser a professora Mônica!

 

— Ela atira muito bem, Small! Não se arrisque à toa! O Prince já foi pegar a metralhadora!

— Ótimo! Vamos transformar essa vadia num queijo suíço! Tânia, vigie desse lado! Ela não pode escapar!

Prince veio se arrastando por trás das caixas.

— Ela continua naquele amontoado?

— Certamente. Me passe isso aqui!

O chefe dos bandidos pegou a metralhadora e cuspiu para o lado, num gesto de cólera.

— Agora ela certamente não escapa! Com isso aqui eu atravesso aquelas caixas todas...

Nesse momento a esguia e graciosa figura de Mina surgiu por cima do amontoado de caixas, numa espécie de vôo que a levou até uma clarabóia quase no teto do galpão. Todos agora eram visíveis para ela.

— Lá! Depressa! — gritou Prince.

Small ergueu a metralhadora, pronto a alvejar a pequena.

Mina apontou com o indicador da mão direita:

— Raio Crescente de Vênus... fulmine!

A faísca luminosa que partiu de Sailor Vênus, espalhando-se pelo ambiente, atingiu os criminosos antes que Small pudesse dar ao gatilho e com efeito letal para todos.

Ao contemplar o resultado da refrega, Mina murmurou, consternada:

— Esse poder que me foi dado me assusta. Eu posso matar. Eles mereciam, meu Deus, mas não é agradável...

 

Serena corria e corria, pelas ruas, rumo ao Ginásio Juuban Júnior, onde cursava a sétima série. De repente perdeu o equilíbrio e se viu de cara no chão.

Um rapaz magro, de óculos, ajudou-a a levantar.

— Por que você corre desse jeito, como uma cabecinha de vento? Dá no que dá...

— Obrigada, mas não me chame dessas coisas! Você é um antipático, isso sim!

E continuou correndo... quase voando.

Darien afastou os óculos e falou para si mesmo:

— Imatura. Garotas de treze anos ainda são muito imaturas.

 

Movendo-se pelos telhados daquelas docas, Mina, iluminada pela lua cheia, escutou um miado familiar.

— Até que enfim eu a encontro, Sailor V. Onde você esteve? Ainda bem que eu pude rastreá-la...

— Artêmis! Como é bom vê-lo, meu amigo...

— Por que você sumiu sem me avisar de nada? Eu estava assustado, porque a Katharina disse que você estava investigando uma quadrilha que explora a prostituição infantil...

— Explorava — corrigiu Mina.

Os olhos de Artêmis se arregalaram.

— O que você andou fazendo? E quem machucou você?

— Estou machucada?

— Seu rosto... e há uma queimadura no seu braço.

— Crianças que eu conheço estavam sendo envolvidas. Desculpe, Artêmis, eu tive que agir. Fui investigar, acabaram me descobrindo... em casa eu lhe conto. Eu não quis arriscar você.

 

Enquanto isso, pelas vigas da replica da Torre Eiffel em Tóquio, movia-se uma gata negra com uma meia-lua na testa.

Luna procurava as suas agulhas no palheiro.

“Sei que elas estão por aqui. As Guerreiras da Lua. Só Vênus está em Londres. Eu tenho que achá-las e achar a Princesa. E tem que ser logo: antes que o inimigo desperte de vez.”

 

 

 

 

NOTA: “Darien” é o nome pelo qual é conhecido, nas versões americana, mexicana e brasileira do seriado de animação, o personagem Mamoru Chiba, namorado de Tsukino Usagi, a Sailor Moon (Serena nas referidas versões). A réplica da Torre Eiffel é chamada a Torre de Tóquio e presença constante nos mangás e animes. Aino Minako (Sailor Vênus) é a precursora das marinheiras-guerreiras (“Sailor-senshi”) tendo começado como uma paladina solo, despertada por Artêmis, e só posteriormente Luna despertou Usagi, que logo reuniu em torno de si as outras guerreiras: Mercúrio, Marte, Júpiter e finalmente Vênus. A Princesa da Lua, que a gata Luna procurava como parte fundamental de sua missão, revelou-se afinal ser a própria Sailor Moon. Quanto a Mônica, no original japonês é a Professora de Inglês Haruna Takurada.

O universo ficcional de Sailor Moon e suas companheiras foi criado e desenvolvido a partir de 1991 pela mangaká (criadora de mangás) Naoko Takeushi, e logo se tornou uma das franquias mais populares do mundo.

 

 

Rio de Janeiro, 7 a 11 de junho de 1999.

 

 

 

 

Miguel Carqueija
Enviado por Miguel Carqueija em 04/11/2021
Código do texto: T7378005
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2021. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.