No domínio dos bereginyas
A lua brilhava sobre as águas mansas do Cabarkapa e os bancos de neblina que cobriam as terras alagadiças de Umbrareia, quando Ali Santorno desembarcou numa estreita faixa de terra que servia de desembarcadouro para os pantaneiros. Um deles, era o barqueiro que o conduzira desde Badinbohr até ali; e os dois vultos encapuzados que o aguardavam na margem do rio, um deles segurando uma lanterna de ferro, também pertenciam ao grupo de residentes humanos que serviam aos bereginyas em seus domínios.
- Este é o emissário que Gavro Lubarda mandou - informou o barqueiro, antes de começar a remar de volta para a outra margem do rio.
- Sou Ali Santorno - disse o endopaisagista, percebendo preocupado que caso algo desse errado, teria que atravessar o Cabarkapa a nado.
- Persa - identificou-se o vulto encapuzado com a lanterna, revelando ser uma mulher de cabelos escuros e rosto oval, cerca de 30 anos de idade. - E esta é Jela.
Jela era ruiva e teria talvez dez anos a menos do que a outra mulher.
- Encantado - declinou Santorno levando a mão ao peito.
- Lubarda nos disse que você revelou o desejo de falar aos Antigos Mestres, e portanto foi convidado a vir aqui esta noite - disse Persa. - Não muitos do seu povo manifestaram tal vontade desde que firmamos o Pacto, séculos atrás.
- Eu não represento o meu povo - admitiu Santorno.
- O que torna esse pedido ainda mais notável - avaliou Persa. - Por favor, queira me seguir e não se afaste, haja o que houver.
Persa tomou a dianteira, acompanhada de Santorno e Jela logo atrás. Não havia um caminho definido através da superfície escura do pântano, entrecortado aqui e ali por árvores baixas e solitárias; a única fonte de luz era a lanterna de Persa, a qual mal iluminava o ponto onde estavam pisando; chapinhando, talvez fosse um termo melhor. Ocasionalmente, na água parada, estouravam bolhas de gás malcheiroso ou brilhavam fogos-fátuos, gerados pela decomposição da matéria orgânica. No mais, ao redor dos caminhantes só havia escuridão e silêncio.
Atento ao movimento cuidadoso das botas de Persa, à sua frente, Santorno só percebeu que o ambiente ao redor deles começara a mudar quando a luminosidade foi gradualmente aumentando. Ergueu a cabeça e descobriu-se, assombrado, no meio de um círculo do que pareciam fogos-fátuos azulados, que giravam lentamente em torno do grupo enquanto acompanhavam o avanço dele.
- Quem são esses? - Murmurou.
- São os posmatrashi - redarguiu Jela, às suas costas. - Os Guardiões do Caminho.
- Como vê, não é uma tarefa das mais fáceis adentrar Umbrareia sem ser convidado - comentou Persa sem se voltar.
Santorno fez silêncio. Diante deles, surgira um portal retangular de luz azulada e os posmatrashi se detiveram; Persa, contudo, continuou a caminhar e seu vulto pareceu dissolver-se no brilho suave. O endopaisagista respirou fundo; se aquilo era um teste, não iria decepcionar seus anfitriões.
Resolutamente, tomou a mesma direção e o brilho azul o envolveu por todos os lados.
[Continua]
- [07-09-2021]