Na cave dos bereginyas

Ali Santorno piscou, ao ter a venda retirada e encarar uma luz brilhante jogada sobre seu rosto.

O endopaisagista havia sido apanhado uma hora antes por um fiacre num parque público, seguindo as instruções fornecidas ao seu mentor Vojin Klimenta, ao qual solicitara uma audiência com o líder dos bereginyas urbanos, Gavro Lubarda; dentro do transporte, um homem mascarado o vendara. Agora, após ter sido conduzido ao que parecia ser um porão, ele estava prestes a encarar seu destino.

- Você é Ali Santorno? - Indagou um vulto indistinto sentado à sua frente.

- Sim, sou eu.

- Soube que queria falar comigo.

- Se você for Gavro Lubarda...

- Está diante dele - assegurou o homem.

- Vou ser direto e objetivo: fui contratado pelo seu inimigo, o prefeito Lubelha, para expulsar os bereginyas de Umbrareia e destruir o seu lar ancestral. Devo adverti-lo de que sou muito bom no que faço, e que pode considerar a missão cumprida.

Um silêncio pesado caiu sobre o ambiente; havia outros bereginyas ladeando Lubarda, mas por um momento era como se Santorno estivesse ali sozinho, ouvindo os próprios batimentos cardíacos. Ele piscou, mas os vultos além da luz brilhante continuavam lá.

- Diante de tanta franqueza, sugiro que o mate - disse uma voz à esquerda de Lubarda.

- Fui informado disso quando ele solicitou a audiência - retrucou Lubarda. - Se fosse para matá-lo, não o teria trazido aqui.

- Se o matarmos, ao menos adiamos a realização dos planos do prefeito - ponderou outra voz, por trás do líder.

- Isso também passou pela minha cabeça - admitiu Lubarda. - Mas como disse, "adiamos", não impedimos. Santorno parece ter planos para nos enterrar... mas sabendo que somos sementes.

E eclipsando a luz que recaía sobre o endopaisagista, perguntou calmamente:

- Por que nos acha dignos de merecer uma segunda chance?

- Porque um mundo sem os bereginyas, controlado por gente como o prefeito Lubelha, é um mundo pior e mais pobre - admitiu Santorno. - Está além da minha e da nossa vontade fazer com que ele mude de ideia ou impedir que outro, idêntico, apareça amanhã. Mas podemos abrir mão do que temos hoje, em troca de um futuro em que os bereginyas voltarão, muito mais fortes.

Novamente, silêncio. Em seguida, uma outra voz manifestou-se:

- Eu o sondei desde que ele chegou aqui. Santorno fala a verdade.

- Estão prontos para aceitar os termos do prefeito e abrir mão de Umbrareia? - Indagou Lubarda, erguendo a voz.

Antes mesmo que a resposta fosse dada, Santorno compreendeu que havia saído vencedor.

[Continua]

- [05-09-2021]