Em uma manhãzinha pacata de domingo, com leves pancadas de chuva e um intenso frio, uma mulher grávida sofria com as fortes dores do parto. Aquela pobre mulher lutava para aguentar a dor, pois desejava ter sua filha de parto normal.
Foram duas semanas de tormento e angústia, dias sem dormir e sem comer, até que um dia o cansaço a venceu, destruindo seu sonho. E então, ela se preparava para uma cesariana, para a temida cesariana...
No quarto internada, o líquido do soro penetrava suas veias lhe causando ardência e desconforto. O sangue vermelho voltava na mangueirinha toda vez que ela mexia o braço. A hora mais dolorosa se aproximava, o médico anestesista se aproximava..., os olhos da mulher enchiam-se d’água e sua boca secava ao passo do relógio.
A primeira hora chegou, agora, não tinha como ser de outra maneira.
O anestesista chegou.
Pediu a ela que fechasse os olhos e ficasse imóvel. Naquele momento, aplicou-lhe a injeção com toda a força, contudo, algo de errado aconteceu, a agulha não estava presa na seringa. Para sua surpresa, a agulha estava dentro de sua coluna.
A preocupação e as perguntas aumentavam, e a incerteza das respostas também.
A correria no corredor do hospital era barulhenta e inevitável. Enfermeiras chegavam à sala para verem a mulher desacordada sem saber do acontecido. Os médicos, preocupados com o ocorrido, não alarmavam mais pessoas, apenas entraram na sala e disseram:
 
- Hora de conferir o milagre.
 
Mas qual seria o verdadeiro perigo? Por que os médicos se preocupara tanto? A agulha poderia ter perfurado o bebê ou a agulha poderia ter paralisado seus movimentos?
Empurrando a maca da mulher e pensando se seria sorte ou destino, milagre ou fé. Os médicos se preparavam para aquela grande tarefa.
Entraram na sala de cirurgia.
Os olhos das enfermeiras corriam sobre os olhares preocupados dos médicos. Dentro da sala de cirurgia, e com as mãos trêmulas, o doutor pegava o bisturi.
Hora de retirar o bebê e salvar a vida daquela mulher.
Eles pensavam.
Um corte profundo em sua barriga provocou um fluxo sanguíneo intenso, a pressão não aliviava e as horas pareciam não ajudar. Sob pressão e apavorados, os médicos não conseguiam enxergar além do sangue, e a criança presa não se mexia.
Enfermeiras rezando e médicos clamando, a tensão estava cada vez mais inevitável. O cordão umbilical enrolado no pescoço do bebê, dificultava sua saída. Os médicos gritavam desesperados pedindo ajuda.
Naquele momento, todos os olhares se voltaram àquela mulher, aquela pobre mulher que acordava da anestesia mal aplicada, que sentiu todas as dores do parto, que corria o risco de ter sequelas e perder sua filha.
Toda ajuda naquela hora seria necessária.
A retirada do bebê vivo estava cada vez mais impossível, mas a mãe debilitada insistia, forçava os médicos a continuar. Após horas na sala, a bebê finalmente nascia, os médicos já podiam comemorar – ou pelos menos achavam que sim.
A mãe acordada, vendo a cena mais emocionante da sua vida, ainda respirava aflita temendo pela vida de sua filha, estava desesperada com o que acabara de passar – mas o pior ainda estava por acontecer. A mãe estava esperando o choro, o primeiro choro, o choro que simbolizava a entrada da criança no mundo real, o choro da vida, do fruto, o choro do amor.
Contudo, a mãe não ouviu, o médico não ouviu, ninguém ouviu.
Não havia choro, porque a criança estava morta.
Mas na esperança do não, o médico deu lhe um..., deu lhe dois..., deu lhe três tapas, mas a bebê, ainda encoberta pelo sangue da mãe, não reagia. As enfermeiras já cansadas, asseguravam que a bebê tinha partido, mas os médicos não queriam acreditar que perderam, perderam uma vida inocente.
Por qual motivo? Por qual razão?
Depois de mais duas tentativas inúteis, eles se convenciam, se convenciam do fracasso e da impotência e se convenciam também de não ter respostas.
O momento mais temido acontecia..., a mãe estava aflita e ansiosa. Aflita por não ter ouvido o choro da menina e ansiosa por saber que pela primeira vez, iria sentir o maior amor do mundo em seus braços.
Mas ao segurar a filha no colo, sentiu que havia algo errado. A mãe notou que a menina estava gelada, roxa e intacta, como alguém que tivesse morrido. Logo, o desespero tomou conta e ela, não conseguia conter as emoções. A esperançosa mãe, caía em prantos e não conseguia se despedir de sua pequena.
Os médicos não conseguiam assistir aquela cena.
Depois de horas chorando, a mãe “aceitava”..., abalada com sua grande perda, a mãe, ainda abraçada com a filha falecida, dizia-lhe adeus:
 
- Filha, você foi muito, muito, muito amada por mim! Desculpa pelos momentos em que você não sentiu o meu amor, é que a vida não é feita só de amor. Filha, sua vinda trouxe muitas alegrias. Neste pouco tempo que tivemos, foi suficiente para nós duas sentirmos o amor de uma pela outra. Eu te amo, minha amada Maria!
 
A cena da despedida foi silenciosa e dramática.
Naquela sala só restava o choro e a dor.
As enfermeiras pegaram a menina e a levaram dali.
A mãe aos prantos, estava fraca após sua perda. Algo de errado acontecia ali. A pressão da mulher despencava sobre os olhares dos médicos, que não sabiam o que fazer. As enfermeiras paralisadas, olhavam assustadas para os médicos imóveis.
Não tinha mais o que fazer, a mãe morreu assim que entrou em trabalho de parto, morreu quando a agulha penetrava sua coluna, morreu quando não ouviu o choro da menina, morreu quando pegou a filha morta no colo.
Ambas foram amparadas pela morte...
Thayla Haider
Enviado por Thayla Haider em 08/06/2021
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