Atlas

O guerreiro suspirou, o ar entrou, saiu, o medo gritou, ele permaneceu em silêncio. Sempre o silêncio. Fortalecia-lhe e machucava. O ferimento da batalha nos seus braços latejava, o peso nos seus ombros o fazia ajoelhar diante de sua autoridade. Estava cansado, a guerra continuava: algumas batalhas eram vencidas, outras lhe causavam cicatrizes profundas. Outras nem curavam. Estavam ali, em seu corpo, como constelações, fazendo-o lembrar que ainda estava vivo.

Mas estava tão cansado... sentia falta de seu mestre, do templo onde treinara, do som do fogo em meio aos pássaros. Queria ir embora dali para seu pequeno paraíso; a responsabilidade nos ombros o fazia ajoelhar novamente e gritava com ele para que esquecesse tudo aquilo e focasse na guerra.

Não conseguia mais continuar, precisava parar. Foi até uma das vilas no qual tinha salvado; pensou que ali teria paz. As pessoas o cercaram, e o receberam com euforia. As crianças impediam suas pernas de andar.

- Quando eu crescer quero ser como você! - elas diziam.

- Nós sabemos que você vai conseguir! Você precisa conseguir! A vida de nossos filhos, nossa família está em jogo! - as pessoas gritavam em seu ouvido, como facas.

O peso de seus ombros aumentou. Ele se ajoelhou no chão mais uma vez, as pessoas o vaiaram. Chamaram-no de fraco. Disseram-lhe que ele precisava ser forte. Mas o guerreiro não conseguia. Sentia carregar o mundo nas costas e entendeu o deus Atlas naquele momento.

Ele conseguiu se levantar e então correu. Tudo doía, mas ele se manteve firme. Correu para muito longe, até onde aguentasse. Queria chegar no templo, queria pedir ajuda a seu mestre. Queria se banhar no lago sagrado que havia no templo e limpar suas cicatrizes. Correu, correu, caiu, levantou, correu...

E então caiu de vez, seu corpo desligou.

Se viu no templo, o campo florido que vivia ao redor, balançava suavemente, recebendo-o. Viu seu mestre no topo das escadas, sorria para ele, de braços abertos. Foi quando percebeu que havia uma mulher ao seu lado. Uma visão, miragem. A mulher sorria, seus olhos eram pura luz, sua presença acolhedora. O guerreiro chorou, disse a ela que não aguentava mais. A mulher sorriu novamente e, como uma mãe, o deitou em seu colo. Afagou seus cabelos, beijou sua testa.

- Nada é eterno, meu guerreiro. Tudo isso irá ter um fim. Mas tu mesmo colocou o mundo nos ombros. Tu és mortal e não um deus. Se falhar, não há problema. Mas se tu desistires, então terá falhado por tua decisão. Teu caminho possui beleza, ouro e flores. Depois de atravessar essas montanhas, você chegará nesse campo florido. Não estás sozinho, pois estou sempre ao teu lado.

O guerreiro acordou em um pulo. Estava deitado na grama onde caíra. Fora um sonho, suspirou tristemente. Mas a voz da mulher continuava a ecoar em seus pensamentos desorganizados.

Ele se levantou, tirou das costas o mundo que carregava, empunhou a espada, e gritou um grito de guerra.

Nicole Brunoro
Enviado por Nicole Brunoro em 13/09/2020
Código do texto: T7062066
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