Diálogo entre o Céu e o Inferno
“…e lá vai mais uma nobre alma satisfeita! Mais um coração enamorado!”
“Perdão, mas o nobre senhor tem certeza disso? Certeza absoluta?”
“Absolutamente que sim! Este aí não poderia estar mais feliz!”
“ Pois acho que o senhor está redondamente enganado…Vejo mais um enganado pelo seu trabalho...”
“Ora, ora, quem és tu para tamanha crítica? És um expert no assunto?”
“Meu caro, eu poderia ser um mero energúmeno para perceber o quanto o senhor está errado!”
“Pois diga, diga, qual o meu erro? Não teria aquela nobre alma encontrado sua alma gêmea?”
“Encontrado não. Induzido ao erro, o alado cavalheiro quer dizer…”
“Vejam isto, o poste mijando no cachorro! O aluno querendo ensinar ao mestre! De onde o cavalheiro tira tanto disparate?”
“De minha própria experiência de vida, logicamente!”
“Senhor, eu sou a experiência em pessoa e asas! Eu, que nunca erro os corações enamorados! Eu que destruo todas as incertezas destas pobres almas! Eu que uno os corações mais…”
“Está bem, está bem! Pode parar sua palestra sobre o Amor! Apenas aparento ser um idiota, porém só aparento. Entendi aonde o senhor quer chegar.”
“Ora, então enfim há de concordar comigo! Compreende agora seu equívoco?”
“ Meu nobre ser alado, longe de eu ter cometido um equívoco. Veja bem; sua função nada mais é do que ser um enganador, uma fraude por assim dizer, um remendo…
“FRAUDE? REMENDO? Está louco, homem?”
“Calma, calma. Agora é minha vez de falar. Como dizia, o senhor faz nada mais do que iludir estas almas. Com suas historinhas de Amor, suas flechas carregadas com o veneno da Ilusão, suas escolhas tão erradas quanto dizemos que os homens são santos. Ao longo da humanidade, suas ações causaram mais destruição do que todas as guerras. O senhor engana estas pobres almas. És na verdade um charlatão de classe maior!”
“Tu fugiste de um manicômio? Ou sofreu algum acidente que afetou seus pensamentos?”
“Longe disto, longe disto…Sou apenas um analista da realidade. E quer um conselho: troque de emprego. Definitivamente este não é para você…”
“Agora entendi! O senhor é um grande piadista, um comediante! Ah, ah,ah, quase me enganou senhor!”
“Enganar és o teu trabalho...Estás se olhando em algum espelho agora?”
“Meu caro, meu tempo é precioso. Nobres almas clamam por minha atenção. Eu devo…”
“Clamam por mais enganação, queres dizer?”
“Bem vejamos…Suponhamos, digo suponhamos, que o senhor…Agora notei que o senhor tem rabo e chifres! A idade vai chegando e nossa visão só piora…Deve concordar comigo pelo menos neste ponto. Bem aonde estávamos…? Ah sim, convença-me! Convença-me que estou errado!”
“Sou o rei da mentira e da trapaça. O senhor nunca quis saber quem é o seu patrão?”
“COMO ASSIM?”
“Ora, pense um pouco…”
“MEU DEUS!”
“Não, não…Deus não…”