Dafne e Os Guardiões Espaciais - Cap 1: Presente Inesperado

Kanteia, menor lua do planeta Heluus, antigo sítio de mineração.

O pequeno robô auxiliar ia à frente, iluminando o caminho dentro do túnel. A luz era intensa o suficiente para se ver as paredes, o teto e alguns metros adentro. Logo atrás um experiente minerador chamado Cassian observava atentamente a estrutura rochosa, analisando o melhor ponto para iniciar seu trabalho. Carregando uma broca manual, que mais parecia uma arma grande, ele parou num determinado ponto, examinando a rocha logo a frente.

- Aqui, Binn, vamos perfurar este ponto – falou para o robô.

Confiando em sua experiência, Cassian ainda apostava que nesses velhos túneis existiam reservas não exploradas dos preciosos cristais lunares, possuidores de alta capacidade de armazenamento de energia e utilizados para vários fins, além de custarem uma excelente quantia no mercado. O trabalho consertando equipamentos e máquinas muitas vezes não lhe rendia o necessário.

Deixados de lado pelas grandes mineradoras, Cassian sabia que alguns resídios dos cristais sempre ficavam para trás sem a devida exploração nos túneis. E era por essa reserva escondida que mineradores autônomos como ele percorriam a escuridão dos túneis nas várias luas do sistema, em busca do sustento de suas famílias.

A principal causa disso tudo, de todo seu esforço, estava bem ao lado nesse momento.

- Dafne, acione os abafadores e os óculos de proteção.

- Sim, pai – respondeu a garota, apertando um pequeno botão na lateral do capacete que usava, acionando os protetores auriculares e o visor.

Dafne tinha belos e curiosos olhos cor de mel, pele morena e cabelos encaracolados. Dois dias atrás tinha completado treze anos e recebeu de presente um kit com vestimenta, mochila, capacete e outros utensílios utilizados pelos mineradores, inclusive um localizador geoenergético, equipamento utilizado para rastrear as emanações de energia dos cristais.

Dafne não se sentia confortável com a pressão em seguir um caminho que não queria, mas não ousava reclamar com o pai. Ele sempre dizia que depois de ensiná-la a utilizar os utensílios básicos, daria sua primeira aula prática no manuseio da broca hidráulica manual, o equipamento padrão de todo minerador. Afinal, ela representaria a quinta geração de profissionais na família. Seu tataravô, bisavô, avô e pai seguiram uma tradição de renomados mineradores.

Num determinado momento, enquanto seu pai perfurava a parede com a broca, com o pequeno Binn colhendo os resíduos numa bandeja e peneirando, as reflexões de Dafne foram interrompidas quando o monitor do localizador começou a piscar, chamando sua atenção. Não querendo atrapalhar o pai e atiçada pela curiosidade, saiu caminhando na direção indicada pelo aparelho e adentrou pelos túneis até se deparar com um ponto sem saída, onde o caminho terminava numa parede.

Tateou a superfície rochosa, imaginando que poderia haver ali uma passagem secreta, e escutou alguns estalos nas pedras. Seria a passagem secreta se abrindo? Provavelmente teria que usar mais força para abrir. Com a esperança renovada, bateu com as mãos e pés e por fim, numa última tentativa, se afastou e depois correu na direção da parede, dando um encontrão com o ombro. De fato deu resultado, pois a parede rachou e cedeu, gerando uma abertura para um fosso escuro por onde Dafne caiu gritando.

Longe dali, sentindo um alerta em seu coração, Cassian parou de perfurar e desligou a broca.

- Dafne?….Dafne, onde você está? - Na falta de resposta, Cassian saiu em disparada pelos corredores de pedra – Rápido, Binn, venha comigo – o robozinho acionou a tração em suas rodas e acompanhou seu dono.

Dafne despencou e se chocou contra o chão duro alguns metros abaixo. Por um longo tempo ficou parada e chorando, com o corpo todo dolorido pela queda, mergulhada na escuridão, agarrada no único ponto de luz, a tela do localizador. Só conseguia enxergar um palmo a sua frente naquele lugar. Parecia ser amplo pois seu choro ecoava ao longe, carregado pela brisa fria e constante.

De repente ago mais lhe chamou a atenção. Um pequeno foco de luz dourada brilhava ao longe, um minúsculo sol no meio da escuridão. Por um tempo Dafne ficou ali, parada, contemplando a luz, mas logo depois ouviu uma voz sussurrante, carregada pelo vento, chamando pelo seu nome. Irresistivelmente atraída, caminhou na direção da luz, iluminando o caminho com o localizador. Quando chegou ao destino, tomou o maior susto de sua vida.

O corpo da mulher estava sentado, encostado numa pedra. Sua pele parecia um pano velho de tão ressequida e seus cabelos desgrenhados pendiam por sobre os ombros. Mesmo com aquela aparência cadavérica, com seus olhos fechados, a expressão em seu rosto transmitia uma serenidade estranha. O que havia acontecido com ela? Estaria ali por quanto tempo? E que joias fascinantes eram aquelas em seus pulsos, fonte daquela hipnotizante luz dourada?

Dafne não resistiu e tocou os braceletes da múmia. Nesse momento uma explosão de luz dourada a envolveu, transportando-a por um túnel iluminado em alta velocidade até parar repentinamente num ambiente totalmente diferente.

O local era um aposento amplo, com belos móveis espalhados. Uma figura feminina estava de frente para um janelão, ao que parecia tentando contemplar a paisagem lá fora. Era alta, vestia um manto nas cores azul e dourada, e seus belos cabelos prateados chamavam muito a atenção de Dafne.

- Se aproxime, minha criança, eu a estava aguardando – falou a enigmática mulher, girando a cabeça na direção da garota.

- A senhora me conhece? - perguntou Dafne ao se aproximar e ficar ao lado da figura. Ambas se entreolharam e a garota viu o semblante mais lindo que já vira na vida. A mulher tinha uma pele clara e belíssimos e profundos olhos azuis.

- Não necessariamente, mas percebi que possui sintonia e isso é o suficiente para que minha missão se encerre e a sua comece. Me chamo Maiera Nari, sacerdotisa da Ordem dos Guardiões, e a você transmito meu legado – a sacerdotisa estendeu as mãos, entregando os braceletes dourados para Dafne.

- Mas o que farei com isso?

- O que lhe transmito não são apenas objetos, mas, se assim escolher, o início de um novo caminho. Não é isso o que quer?

Dafne não conseguiu evitar de pensar sobre o destino que lhe estava sendo imposto, mesmo com a melhor das intensões, pelo pai. Sentia claramente que não estava seguindo o que seu coração pedia. Sempre sonhou em viajar pelo espaço, sair da monotonia de viver em sua pequena aldeia, conhecer outros mundos, expandir seus limites. Amava o pai, mas não queria viver os sonhos dele, e sim os seus.

Olhando os braceletes oferecidos pela sacerdotisa, Dafne se viu numa encruzilhada, num ponto onde qualquer decisão que tomasse não haveria como retornar atrás.

- Sim, é isso que eu quero – falou a garota, tomando sua decisão. Tocou os braceletes e automaticamente o local onde estava desapareceu junto com a linda figura de Maiera.

Dafne estava de volta à caverna escura, olhando para os pulsos e imaginando como os braceletes foram colocados ali. Um forte vórtice de energias douradas começou a rodopiar a sua volta, arrastando tudo numa nuvem de detritos. A garota voltou a encarar o rosto cadavérico da sacerdotisa, que estranhamente parecia observar o que ocorria naquele momento por debaixo das pálpebras cerradas. De repente uma luz forte iluminou a caverna. Desta vez era a potente lanterna do robô Binn. Ao lado do assistente artificial, seu pai gritou seu nome.

Foi a última coisa que Dafne ouviu antes de desmaiar, envolta nas energias douradas.

MiloSantos
Enviado por MiloSantos em 27/05/2020
Código do texto: T6960078
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