O CAÇADOR DE NÚMEROS

O escritor voltou da cozinha trazendo o seu delgado copo de vermute com limão, soda e gelo – muito inspiradores. Sentou-se à mesa com a poltrona confortável, daquelas de braços, inicializou o “laptop”, riu da fotinho do filho na tela de fundo, abriu o arquivo e retomou o texto:

 “(…) Breno jogou o seu corpo magro, ornado pela cabeça pensante, na poltrona retrátil de três acentos e diversas almofadas – parecia um náufrago no tecido azul turquesa. Tomou do controle e iniciou a reflexiva melodia ‘new age’, demorada, doze minutos, como era de seu gosto. Foi relaxando mais e mais. Não era o som que assediava os seus ouvidos, mas estes que sorviam as notas em adágio. Um clima, um tudo. Olhos fechados, ele acessava o mundo da fantasia mais dileta. Oh, santa e doce Matemática! Ele ia mesclando notas instrumentais e cadenciadas com a sortida de considerações sobre os números. A ideia lhe ocorrera num longínquo e agitado fim de tarde; desde aí fora possível esquadrinhar o instigante achado. Nesta portentosa era do som digital – vejam só, que suave harmonia em sétima diminuta; estas, absolutas; apenas três em toda a extensão da escala musical – som digital, ia pensando, todas as músicas se traduzem e se resumem em um imenso número binário. Primeiro, a onda sonora é fatiada (24.400 fatias por segundo, no sistema usual); cada fatia tem a sua magnitude convertida a um bite cujo valor a representa e este corresponde a oito bits (binary digit); o ouvido humano já não percebe a transição entre bites, as fatias. Depois, o efeito capacitivo inerente ao sistema de reprodução se encarrega de “arredondar” a onda sonora, deixando-a o mais próximo da original. Tudo se reduz, no final, a uma sequência absurdamente grande – uau, essa dissonância foi irada, “deu corpo” – de 0 e 1; olhem só, isso adiante é um ínfimo de fatia da melodia ali soante:
(...)


Deixo de incluir a íntegra do conto aqui pois a formatação da página, mesmo que "avançada", não permite a notação matemática. Aliás, nem mesmo permite distinguir os dois planos do conto, o do "escritor" (personagem anonima) e o de Breno, exceto pelo recuo maior.. Quem se interessar pode acessar a íntegra o link abaixo:

 

https://www.dropbox.com/scl/fi/yyqt9zp0t80eocp6lymlp/O-CA-ADOR-DE-N-MEROSed.docx?rlkey=y5whqa8g0m3kni9t5prfkrf32&dl=0



Apreciaria saber se este estilo de conto agrada aos leitores do RL. Deixe o seu comentário, por favor.