Orinsuke e Os Sete Trovões - Cap 29: Contato Mental

Orinsuke não queria abrir os olhos. A brisa suave que tocava seu rosto transmitia uma sensação de tranquilidade. Poderia ficar ali deitado por muito tempo apreciando aquela serenidade, sentindo a grama tocar seu corpo como um relaxante colchão natural.

Mas algo o tirou do transe. Jurava que estava sozinho, sem ninguém para importuná-lo. Estava enganado, pois uma voz chamou por ele.

“Eu sei que a sensação é boa, mas não consigo manter isso por muito tempo”

Ao abrir os olhos, Orinsuke avistou uma garota distante alguns metros. Vestida num belo quimono, com seus longos cabelos, escuros como a noite, esvoaçando ao sabor do vento, ela estava sentada na grama. Uma flauta em uma de suas mãos chamava a atenção.

“Quem é você?” perguntou Orinsuke

“Estou muito feliz por finalmente estabelecer uma conexão entre nós”

“Conexão? Do que está falando?”

“Essa é minha habilidade, eu conecto mentes. Mas só foi possível porque consegui escutar sua raiva. O que aconteceu para exalar tanta emoção?”

“Eu não….espere um pouco, quer dizer que você não está aqui? Que lugar é esse?”

“Eu já disse, essa é minha habilidade. Costumo chamar esse lugar de Sala de Encontro. O que achou? Meu mestre disse que gostou”

“Seu mestre? Então foi ele que te mandou falar comigo?” Orinsuke tentava entender a situação.

“Sim, ele quer reunir todos nós. Disse que uma grande missão nos espera. Empolgante, não é?” a garota deu um sorriso de satisfação.

“Missão? Do que se trata?” questionou Orinsuke

“Não sei. O mestre disse que só revelará quando estivermos todos reunidos. Mas está bem difícil encontrar os outros. Até agora só mantive contato com você e o outro garoto”

“Espere, há algum tempo atrás eu sonhei com um garoto. Ele disse que uma menina estava nos procurando”

“Que interessante, então você também manteve contato com ele. Mas digo logo que não tive nada a ver com isso. Provavelmente se falaram através de um sonho, e isso é bem empolgante”

“Mas….”

Antes que Orinsuke pudesse verbalizar qualquer coisa, a garota fez uma careta e tocou a testa com a mão, parecendo sentir alguma dor. Na mesma hora o ambiente em volta deles também se modificou. As cores ficaram mais frias, o movimento das árvores mais lento, até a luz perdeu seu brilho. O lugar inteiro ficou mais cinza.

“Desculpe, mas meu tempo está no fim, não vou poder continuar nossa conexão. Nunca fiz tanto esforço numa comunicação. Mas antes de partir, me responda uma coisa: Wanabi, que palavra é essa?”

“É o clã ao qual pertenço” respondeu Orinsuke

“Ah, sim, é o suficiente. Até logo Orinsuke do clã Wanabi. Muito em breve encontraremos você”

“Espere, não me disse seu nom…...”

Um forte clarão interrompeu a comunicação e Orinsuke despertou, abrindo os olhos. Estava de volta à ala médica.

- Olá, Orinsuke, fico feliz que finalmente tenha acordado – falou Aika-sensei, responsável pela ala médica. A mesma estava ao lado da cama de Orinsuke anotando algumas coisas numa prancheta.

- O..olá, sensei – falou Orinsuke. Quando tentou se mexer seu corpo reclamou em várias partes. Percebeu que seus músculos tinham sido bastante exigidos e estavam bem doloridos. Suas mãos também estavam enfaixadas.

- Percebi que estava com o sono agitado – falou a sensei – Chegou até a balbuciar algumas palavras. Foi um pesadelo?

- Na verdade um sonho – disse Orinsuke. O mesmo esfregava a testa, esforçando-se para lembrar os detalhes mas não conseguia por completo – Lembro de uma garota, um bosque tranquilo, uma flauta e alguma coisa sobre uma missão, só isso.

- Humm, certo. Mas por ora, procure não se mexer tanto. Você não teve somente um desgaste físico, mas, principalmente, uma descarga grande de chi o fez apagar. Portanto, vai precisar descansar um pouco mais de tempo até se recuperar totalmente – explicou a sensei.

- Por quanto tempo terei que ficar? O sensei Azura deve estar ….

- Ficará aqui pelo tempo que for necessário – interrompeu Aika – Me informaram para dar dedicação exclusiva a você e estou fazendo o meu melhor, mas não quero apressar demais as coisas. Seu corpo precisa se recuperar sozinho e estou monitorando isso pessoalmente. Agora descanse e não se preocupe, deixe que com o Azura eu me entendo.

- Obrigado, sensei – agradeceu Orinsuke.

- De nada. Ah, já ia esquecendo, tem visita para você aguardando lá fora. Vou permitir que entrem para conversarem um pouco.

A expressão de Orinsuke se alegrou quando Yume, Shimitsu, Asako e Katsuromo entraram no quarto para falar com ele. Percebeu que, assim como ele, os companheiros também traziam no rosto as marcas do intensivo treinamento de kenjutsu pelo qual todos passavam. Pelo visto os outros sensei não estavam pegando leve com eles. O quatro se empolgaram conversando sobre os novos movimentos que aprenderam no combate com espadas e da expectativa em relação ao dia em que receberiam uma katana de verdade.

Diante da conversa acalorada com os amigos, Orinsuke não falou com eles a respeito do sonho com a garota do bosque. Mas assim que todos saíram, ele ficou tentando lembrar mais e encaixar as peças com as poucas imagens que lhe vinham à mente.

Enquanto isso, longe dali, os sensei Azura e Aika se reuniam no local onde anteriormente havia acontecido o treinamento de Orinsuke.

- Realmente é uma imagem impressionante – falou Aika, que se aproximou e ficou parada ao lado de Azura – Mas por quanto tempo vai ficar aqui contemplando isso?

- Como ele está? - perguntou Azura no seu jeito seco de falar.

- Despertou recentemente, mas ainda requer observação. Notei que, apesar de ter uma boa resistência, sua recuperação foi mais lenta do que nas outras vezes, quando só teve danos físicos.

- Preciso desse garoto recuperado o quanto antes, Aika – disse Azura – Tenho ordens da própria shidosha-sama para que ele esteja pronto o mais rápido possível. A missão na Grande Floresta em breve começará, os anciões já aprovaram a operação.

- Estou fazendo o melhor possível no que diz respeito à estrutura orgânica de Orinsuke. Repito, se fosse só o dano físico ele já estaria de pé, mas a situação é mais complexa. Ele quase perdeu toda a sua reserva de chi portanto, seu repouso tem que ser o máximo possível para que o fluxo volta ao normal. Se esse garoto continuar manifestando seu poder de uma forma tão instintual, na base do descontrole emocional, ele pode morrer, com seu chi sugado pelo ambiente em volta como podemos ver aqui.

- É por isso mesmo que ele precisa aprender a focar seu poder, tornando-o mais preciso e poderoso. Estamos diante do usuário de um dos Caminhos Perdidos, Aika. E a shidosha quer utilizar essa arma contra nossos antigos inimigos.

- Então a paz vai ser quebrada e o ciclo recomeçar – falou Aika com voz triste.

- Os Iuchi tinham planos de nos atacar. Foram eles que planejavam acabar com a paz, não nós.

- Está falando como os anciões. Você acredita nisso? - questionou Aika.

- Apesar de vivermos tempos de paz, eu sou um samurai e nasci para a guerra. Sempre devo estar preparado para levar a cabo as ordens dos meus superiores.

- Entendo – disse Aika, que voltou a olhar para frente.

Os dois velhos amigos voltaram a contemplar a paisagem a frente, onde um emaranhado de raízes de árvore haviam brotado do solo, galhos estavam retorcidos e alongados, chegando a tocar o chão, e folhas e flores tinham surgido em todo o lugar. Nada disso havia antes de Orinsuke manifestar seu poder.

MiloSantos
Enviado por MiloSantos em 18/01/2020
Código do texto: T6844522
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