Orinsuke e Os Sete Trovões - Cap 26: Novas Ordens
A velha Oban socou delicadamente o fumo no cachimbo e encostou um pequeno pedaço de papel em chamas, dando um prolongado trago e expelindo a fumaça no recinto. No mesmo instante, Azura e Tatsugari entravam pela porta da sala.
Azura se deparou com uma pequena reunião. Ao lado da shidosha estavam sua guarda pessoal e os cinco anciões do clã. De fato algo sério tinha acontecido, ou iria acontecer.
- Mandou me chamar, shidosha-sama? - perguntou Azura, fazendo uma reverência à líder Wanabi e aos anciões.
- Sim, Azura, mandei te chamar porque a decisão que foi tomada também diz respeito à sua função como sensei. Na verdade, sua função faz parte da decisão.
- Então do que se trata? - perguntou Azura.
- Em breve daremos início à investida em Baikai – disse a shidosha. Azura a encarou seriamente. A sala ficou mais silenciosa, com os olhares dos anciões voltados para o samurai a frente.
- Achei que demoraria mais tempo até colhermos as informações sobre os Iuchi – disse Azura.
- Recebi relatórios recentes que confirmam que o inconsequente do Nakatomi está em seus últimos dias. A doença corrói seu corpo. O clã está enfrentando uma espécie de contenda interna sobre quem passará a liderá-los, já que não há herdeiros para reivindicar o posto e ninguém foi indicado pelo líder. Muitos capitães foram chamados para a capital no intuito de participarem das discussões, deixando muitos pontos desguarnecidos, e um deles é a Torre de Pedra.
- E essa é uma oportunidade de ouro para nós – disse um dos anciões, um senhor encurvado pela idade e com um rabo de cavalo em seus cabelos ralos e brancos – A dor e a humilhação provocada pelo massacre em Sinchiyo nunca foi devidamente vingada. E por causa daquele ato vil, o lugar virou uma aldeia onde só quem vive são os fantasmas.
- Mas lembrem meus amigos – falou um outro ancião – foi em Baikai que o tratado foi assinado. Ali se tornou um lugar intocado pelos Wanabi, ao ponto que a parte norte da Grande Floresta é lugar proibido para os Iuchi. Desde aquele dia nunca mais houve contendas entre os clãs.
- Você quer dizer que não temos motivo para agir, Daru? - questionou Oban, a shidosha – Esqueceu das informações de que Nakatomi estava mais uma vez planejando uma ação contra nós? Só não conseguiu colocar em prática seu plano porque a doença o pegou antes.
- Não sabemos se as informações são inteiramente corretas – insistiu Darus, defendendo seu ponto de vista apaziguador – O infiltrado ficou de enviar um segundo relatório, que até agora não chegou.
- Mais um motivo para tomarmos uma providência, não acha? - perguntou uma das duas anciãs no recinto – Quem garante que o infiltrado não tenha sido descoberto e eliminado? E como falou nossa líder, o fato do shidosha Iuchi está morrendo não significa que seus anciões e senshi não possam continuar com seus planos de conquista. Desta vez o fator surpresa será nosso.
- Só peço a todos um pouco mais de paciência e aguardemos as informações definitivas…..
Os anciões e a shidosha continuaram discutindo sobre o tema enquanto Azura observava suas argumentações sobre que ação o clã deveria tomar nesse momento. Independente do que fosse decidido, ele era um guerreiro e acataria a determinação de seus superiores sem pestanejar. Tinha participado do conflito com os Iuchi no passado e até hoje carregava cicatrizes em seu corpo.
Por fim, no final da discussão a shidosha fez valer sua posição e encerrou a contenda. O velho Daru, vendo que não adiantava argumentar diante da emoção acirrada dos demais, silenciou e, triste, ficou pensativo.
- Muito bem, Azura – falou a shidosha, finalmente olhando para o samurai que ainda permanecia de pé – Você, como sensei da nova geração de samurais, deverá acelerar os treinamentos dos gakusho e deixá-los prontos para qualquer eventualidade em nossos planos, principalmente o garoto de Kimoto, Orinsuke.
- Sim, e como anda a evolução dele? - perguntou um dos anciãos, levantando os olhos para Azura – Lembre-se que sua rara habilidade é a nossa ponta de lança, de extrema importância para nossos planos futuros.
- Infelizmente mais lento do que imaginava – respondeu o sensei – No primeiro momento seu taijutsu se mostrou inexpressivo, possuindo pouca habilidade na técnica. Mas demonstrou possuir determinação e disciplina, características fundamentais no caminho da espada.
- Mas só isso não é suficiente – disse a shidosha – Você sabe que a essência de um samurai é seu poder de luta, o quanto é forte nas principais técnicas do caminho, principalmente, no caso dele, no controle do seu elemento. E pelo jeito não está satisfeito com o desempenho dele.
- Nada que não possa ser melhorado – afirmou Azura. De fato acreditava que Orinsuke poderia avançar e se tornar um bom guerreiro. Não necessariamente por suas capacidades, mas sim por ele, Azura, ser o melhor professor.
- Então faça isso – falou a líder do clã – A partir de agora a nova ordem é treinamento intensivo. A rápida formação desses gakusho e a capacitação de nossa principal arma está em suas mãos. Temos pouco tempo, faça seu melhor, Azura. Você tem a confiança desse conselho.
- Sim, shidosha-sama.
Os alunos se levantaram quando Azura retornou ao dojo e assumiram suas posições em volta do tatame. Shimitsu e Takeda se posicionaram para o início do combate final do kumite. Mas a fala do sensei logo em seguida pegou todos de surpresa.
- Muito bem, informo que teremos que acelerar nosso treinamento. Para a nossa shidosha, estamos tempo demais nas etapas iniciais e determinaram o avanço imediato na formação de vocês. Portanto, estão todos dispensados e retornaremos no começo da tarde para a nova fase do treinamento, já com algumas mudanças estabelecidas pelos nossos superiores.
- Mas, sensei, essa é a última luta do kumite – falou Takeda, num tom de indignação – nos permita pelo menos definir quem é o melhor de nós.
- Não ouviu o que eu disse, gakusho? - repreendeu o sensei – Recebi ordens diretas para avançar para a próxima fase. Vocês precisam ser formados quanto antes.
- Me desculpe, sensei, mas por que dessa nova ordem? - perguntou Shimitsu.
- No momento certo vocês saberão. Mas agora chega de questionamentos. Saiam e voltem mais tarde. Dispensados.
Irritado, Takeda atravessou o tatame na direção de Shimitsu com um olhar de poucos amigos. Ao ver a cena, Orinsuke e o restante da turma ficaram apreensivos, afinal o garoto temperamental podia aprontar das suas. Shimitsu colocou as mãos para trás, numa postura serena, e o encarou olho no olho.
- Teve muita sorte, garota. Estava pronto para acabar com você, desmanchar essa sua pose.
- Também estava ansiosa pela nossa luta, testar mais uma vez nossas habilidades marciais. Me parece que temos níveis parecidos.
- Você não está no meu nível, garota, não seja arrogante assim.
- Na verdade eu quis dizer exatamente o contrário – disse Shimitsu. Takeda a encarou mais seriamente, mostrando os dentes de raiva – E não sou arrogante, sou confiante. E você o que é, além de valentão?
Takeda cerrou os punhos, contendo-se ao máximo para não iniciar uma briga ali mesmo. Sabia que se fizesse isso, o sensei o puniria severamente. Então ficou ali, barrando a passagem de Shimitsu, pensando em mil formas de machucá-la. Mesmo assim, a garota deu um passo para o lado e passou esbarrando em seu ombro suavemente. Apesar de menor e mais franzina, tinha músculos rígidos.
- Da próxima vez que estivermos frente a frente numa luta, nem o sensei irá me impedir de quebrar alguns de seus ossos – Takeda se virou para falar com Shimitsu.
- Estarei preparada – disse Shimitsu sem olhar para trás. E saiu do dojo.