Orinsuke e Os Sete Trovões - Cap 19: Honra Feminina

Algo inusitado aconteceu um dia antes de começar o kumite. A turma, que iniciou com dezoito gakusho, recebeu sua primeira e marcante baixa depois de um mês de treinamentos. Seis deles pediram desistência, alegando incapacidade de seguir o caminho da espada.

- Covardes, isso é o que vocês são. Verdadeiros covardes, vergonha para suas famílias e para nosso clã – Azura-sensei gritava para os desistentes caídos no chão depois que ele os punira fisicamente de forma severa.

A cena de ver seus companheiros de treinamento humilhados e chorando aos pés do sensei embrulhou o estômago de Orinsuke. Já tinha sentido a dureza do sensei em muitas ocasiões, achando que tudo aquilo era necessário para fortalecer o corpo e a mente dos alunos, como ele mesmo sempre dizia, mas jamais imaginaria se deparar com aquela face do sensei.

Os gakusho desistentes foram expulsos do dojo, jogados porta fora de Jinkai, levando consigo a vergonha para suas famílias de não terem sido fortes o suficiente para continuar na formação samurai.

Não poderia pelo menos ser considerado o fato de terem tentado até o fim, pensou Orinsuke ao ver os alunos serem arrastados para fora da área de treinamento. Mal sabia ele que, a partir daquele momento, algo também mudaria dentro de si

.

No dia do kumite, o sensei Azura preparou o dojo, demarcou o tatame e apresentou as regras aos gakusho, além de lembrar que estaria vigilante em relação à falta de lealdade no combate, algo que seria devidamente punido. Ranko também estava presente, sempre auxiliando o mestre quando solicitado.

As regras do kumite se resumiam a apenas uma: sairia vencedor aquele que eliminasse qualquer possibilidade de reação do adversário, incapacitando-o para continuar o combate.

- O kumite serve para avaliar suas habilidades como usuários de taijutsu, como também para testar a resistência de seus corpos, a força de seus braços e pernas, a agilidade dos reflexos e a inteligência e estratégia nas situações de combate. Não permitirei deslealdade, mas deem tudo de si, aplicando o que aprenderam. E que vença o mais forte e capaz.

Ao terminar de falar, o sensei Azura chamou a primeira dupla para iniciar as lutas.

- Taira, Jorubo, em posição. Preparados? Comecem.

Os dois primeiros lutadores não demonstraram ter um repertório amplo de investidas e defesas, aplicando sequências repetidas de chutes e socos. O grande vencedor do combate sem dúvida alguma foi o cansaço, que cobrou dos lutadores a falta de resistência física, principalmente de Jorubo.

Já exausto, o mesmo acertou o vazio quando tentou atingir Taira com um soco direto. Aproveitando a lentidão do oponente, a garota agachou para esquivar e avançou, agarrando o quimono do adversário, girando o corpo e arremessando-o com toda a força que lhe restava de costas no chão.

Completamente derrotado, Jorubo continuou deitado de costas, ofegante e sem forças para se erguer.

- Declaro Taira vencedora do primeiro combate do kumite – falou em voz alta o sensei – Que venha a segunda dupla: Yume e Zenpo.

Sem perder tempo, o sensei ordenou que a segunda dupla de lutadores se posicionasse. De maneira gentil, Taira ajudou Jorubo a sair do tatame.

Yume rolou no chão depois que foi atingida no rosto pelo golpe de Zenpo. Orinsuke apertou o punho ao ver a amiga com o lado direito do rosto vermelho e um filete de sangue escorrendo dos lábios. Zenpo mal dera tempo de reação à oponente e logo partiu para o ataque.

Ainda atordoada pela rapidez do golpe, Yume se ergueu e logo se colocou em posição de defesa, exatamente na hora em que Zenpo desferiu uma sequência de soco, chute e joelhada. Conseguiu se safar do chute e soco, mas não teve tanta sorte com a joelhada. A dor que Yume sentiu no estômago foi intensa, fazendo-a cair de joelhos no chão, puxando o ar com força.

Zenpo, seguro de que a oponente não mais reagiria, resolveu humilhá-la antes de encerrar a luta. Segurou Yume pelo cabelo e a ergueu para encará-la.

- Não gosto de lutar com mulheres. Vocês são fracas. Então desista e não a machucarei mais. O que me diz?

Yume levantou a cabeça para encarar Zenpo e sua resposta foi um olhar severo, repleto de raiva, na direção do garoto.

- Não me subestime.

Yume agarrou o braço do adversário com as duas mãos, numa manobra de imobilização, jogou o corpo para trás, apoiando um dos pés no peito de Zenpo e o arremessando para trás. O garoto caiu de costas no tatame e não teve tempo de reação pois logo em seguida só deu tempo de ver Yume girando no ar acima dele e acertando um forte chute no peito.

Esforçando-se para recuperar o ar, Zenpo ainda teve reflexo para reagir e segurar o pé de Yume, prendê-lo ao corpo e rolar no chão. O movimento de torção fez Yume gritar quando um forte estalo ecoou no ar.

- Hei, isso é permitido? - protestou Orinsuke enquanto avançava pelo tatame para ajudar Yume. A gakusho segurava o tornozelo com uma terrível expressão de dor. A maior parte da turma também ficou tensa com o desfecho do combate.

Sensei Azura observava a situação atento.

- Calma, não se mexa muito. Consegue se levantar? – perguntou Orinsuke, bastante preocupado com a amiga.

Apoiada por Orinsuke, Yume, suportando uma forte dor, levantou-se devagar e olhou na direção de Zenpo. O garoto estava em pé, ofegante, prestando atenção nas palavras de Yume, proferidas logo em seguida.

- Estamos todos trilhando o caminho da espada, Zenpo. Sou tão aprendiz de samurai quanto você. Portanto, nunca mais me subestime outra vez. Pode ter quebrado meu pé, mas não minha honra como mulher - falou Yume, rangendo os dentes de dor.

MiloSantos
Enviado por MiloSantos em 18/12/2019
Código do texto: T6821834
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