O passeio de Celeste
Trezentas e sessenta e cinco igrejas havia na cidade, diriam uma para cada dia do ano, assim havia missa a todo minuto em alguma delas. Maria Celeste em um belo dia de sol resolveu visitá-las. “Tanta igreja linda, vou a quantas puder. “ Desceu a rua das Gamboas, subiu a ladeira da Conceição, atravessou a praça Castro Alves sem pressa, tinha todo o tempo do mundo. A igreja mais próxima era a do Bonfim, majestosa, dourada em seu interior, a mais visitada pelos turistas. Quase no seu destino reconheceu uma velha amiga vindo em sentido contrario, sorriram de longe e logo estavam se abraçando. Após elogios hiperbólicos que seriam tão sinceros como afirmar que choveria granizo naquele belo dia. entraram em uma lanchonete e pediram sanduíches e sucos. O tempo atropelou-se enquanto conversavam. O garçom olhou interessado para Celeste e ela desviou rapidamente o olhar. “A conta senhora”. As palavras quebraram o encanto. As amigas despediram-se a saída e Celeste retomou a trajetória. A Igreja do Bonfim estava ainda a alguns quarteirões e ela pos-se a caminho. Surgiu a mureta baixa da ladeira do Bonfim emoldurando o azul brilhante do mar da cidade. O forte de São Sebastião reluzia ao centro da baia e as longas pernas de Maria Celeste formavam um efeito estroboscopio de encontro as colunas do interminável muro. Adetrou ao templo catolico e então já no seu interior percebeu a presenca de alguém que certa vez havia feito muito mal a ela. Um relâmpago de santidade a iluminou de repente com um sentimento de perdão. Suas faces estavam rubras e os pensamentos explodiam, mas os momentos no interior da igreja a haviam acalmado. Com a roupa ligeiramente amassada pelo banco de madeira, conformou-se com a eventual falta de elegância e se deu conta que .ainda tinha muito que andar. Aquelas horas as pessoas na rua pareciam calmas, mas o povo da cidade já não era o mesmo de tempos atrás. A típica mansidao no falar, tudo havia se transformado em atitudes ríspidas nas ruas e uma generalizada desconfiança no outro grassara na sociedade outrora risonha. Ela permaneceu por algum tempo em um banco da praca antes de descer a avenida central. Pensou que cada templo tinha sua propria atmosfera, a despeito da similaridade dos enfeites e dos icones dourados.Ela sentira no Bonfim algo muito profundo. O misterio era o mesmo, ela era catolica mas sentira o misterio no Bonfim, e um repentino sentimento de perdão universal a dominou. Ela era uma crente não praticante, fora crismada, mas desde entao frequentara ate terreiro de umbanda, já participara da mesa branca no espiritismo, já fora a cultos evangelicos e mesmo já dera o dizimo,ja meditara no zen-budismo, achava que ate tinha levitado, mas nunca continuara em nenhuma religiao, Concluira após algum tempo no catolicismo, que o Espírito Santo na realidade éramos nos mesmos. A forca que reside no interior de cada ser humano. Interrompeu seus pensamentos sabendo que oportunamente voltaria a eles. Olhou o relógio, a próxima igreja ficava a uns dez minutos, era a de Nossa Senhora da Conceição. Iniciava-se a tarde e o mormaço da cidade lhe avivava a face, a contragosto sentiu o cansaço das pernas. Amanha estaria melhor, pensou esperançosa, enquanto apreciava a visão do mar dourado que banhava sua cidade. Reanimada, retomou o caminho de casa.