ROLA A PELOTA... PORCA MISÉRIA !

ROLA A PELOTA... PORCA MISÉRIA !

"De pé em pé / rola a bola pelo chão, /

de Rivelino a Pelé, / Pelé de novo a

Tostão". (trecho de samba de quadra do

BC UNIDOS DE VILA RICA, anos 70)

Essa estória é dos tempos em que partida de futebol ainda se denominava "match", goleiro era "goal keeper", arqueiro ou até "guarda-metas", zagueiro era "defesa", meio de campo "centeraufo" (centerhalf, na Inglaterra), ponta era "lateral e bola... "pelamordedeus", o objeto esférico de couro recebia todo tipo de nome ou apelido, até de "gorduchinha", para desespero das donzelas "cheinhas" ou das matronas "rolha de poço".

Os anos 50 já íam pela metade quando nossa história -- nossa, uma pinóia... minha ! -- começa. "Seu" "Gelão", aliás, Ângelo, italianíssimo, estava perto dos 50 e saíra da Itália ainda jovem, devido a recessão de 1930 em toda a Europa e ao perigo nazista sempre crescente, ameaçando o Mundo. Viera para o Brasil quase às escondidas, num navio cargueiro, vivendo de favor e "lavorando para mangiare". Aqui refizera a vida, casara e tivera o seu "Gelinho" (ou "Luisão"), um "ragazzo" bela pinta que o ajudava no bar da "famiglia", alugando mesas e cadeiras para fora, para melhorar a renda. "Seu Gelão" jogara "calccio" na Itália, entendia do "negócio" e ensinava o neto de um vizinho mecânico, às escondidas do avô. Ensinar era eufemismo (?!) -- traduzindo, força de expressão -- Edinho sabia (de) tudo, nascera sabendo, pois só tinha 5 ou 6 anos. O crioulinho dava at´umas "canetas" e "lençol" no cinquentão, que relevava o abuso, tudo pelo bem do menino. O avô -- um "negão" mais sério que missa de 7º dia -- não queria mais saber de "football", desencantara-se do "esporte bretão" pela derrota recente do "escrete canarinho" em terras cariocas, na Copa de 1950.

"Luisão" era santista, para terror do pai, devoto do "Palestra Itália" que, por imposição dessa ditadura que sempre foi o Brasil, viu-se obrigado a mudar de nome na ´poca do Governo Getúlio Vargas, devido à guerra contra a Alemanha, com os italianos simpatizando com Hitler e o fascista Mussollini. Havia umas palmeiras em frente ao antigo Estádio no bairro da Barra Funda e o presidente dele era marchante (dono de açougue, pombas... preciso explicar tudo ?!) e comerciava principalmente carne de porco. Juntaram uma coisa com a outra e "nasceu" o Palmeiras, digo, "Parmêra", cujo símbolo é um porco, assim como o do Flamengo é urubu, do Santos um peixe... cá estou explicando mais uma vez !

-- "Ahn... "cumé quié" ?! Não é nada disso ?! Eu lhe perguntei alguma coisa ? A história é minha, porca miséria... eu a conto do jeito que quiser, "mascalzone" ! (Não sei o que significa, mas parece palavrão !)

Voltemos à história: 'Gelão" botou o menino num "timeco" armado às pressas com a garotada vizinha, pois haveria um torneio no outro bairro... "Luizão" arrumou um carro velho pro "negão" consertar, trabalho pra 1 semana, "seu" Ângelo pagava tudo. Com consentimento do avô, também Edson, levou o menino "pra passear", "dar uma volta", como se dizia. "Luisão" ficou "ajudando" o mecânico, distraindo-o enquanto as horas voavam. "Gelão" voltou tardezinha, olhos brilhando, taça na mão, sorriso de orelha a orelha:

-- "Ganhamos tudo, Edinho jogou sozinho, fez 6 GOALS numa só partida... é um craque, um gênio" !

Era o que "Gelinho" precisava para levar seu plano avante. Como "olheiro" contratado por times da época, saiu "de fininho" e "voou" para a região praieira paulista, oferecendo o garoto para o time local. Bastou um treino e fecharam o contrato... "Luisão" embolsou uma "bolada federal" ! Difícil foi convencer o avô a largar a oficina mecânica e ir morar em Santos, mas o clube pagava tudo: moradia, os estudos da criança, alimentação, o que precisasse. Não teve jeito: saiu da capital com malas e bagagens !

"Seu" "Gelão", inconformado, berrava pro filho, a cada vitória do "Peixe", pelos pés do garoto infernal:

-- "Cretino, ordinario, furfante, sfuggente, trufattore, farabutto, traditore, mocassino, mascalzone (era palavrão mesmo, quem diria!)... porca miséria" !

No primeiro jogo do "Porco" contra o "Peixe", derrota acachapante do Palmeiras, com o menino "Pelé" arrasando a defesa adversária. "Seu Gelão" quase teve um enfarte... "il piccollo era nostro, pooorrca miséééria" !

"NATO" AZEVEDO (em 1º/abril 2019)