Orinsuke - Capítulo 07: Despedida
O silêncio já durava uma eternidade. Pai e filho estavam a alguns minutos sem dizer nada um para o outro. Quando Orinsuke entrou no quarto, o Sr. Onoke estava sentado, olhando para baixo, pensativo. Até o momento não havia erguido os olhos para encarar o garoto a sua frente. Por sua vez, Orinsuke, de joelhos e sentado sobre os calcanhares, também não conseguia olhar para o velho.
Por respeito ao pai, aguardava que o mesmo começasse a falar algo, mas conforme o silêncio persistia, a pressão se tornava cada vez pior. Depois de três dias hospedados na melhor estalagem de Damari, finalmente tinha chegado a hora de acompanhar Kiha e Katayama na viagem até a aldeia-capital.
Para Orinsuke, a nova realidade que se descortinava à sua frente parecia surreal. Um filme começou a passar em sua mente, lembrando-o de todo o tempo vivido em Kimoto ao lado do Sr. Onoke, dos momentos da infância, das brincadeiras e aventuras ao lado dos amigos e, claro, das obrigações com a plantação e com os animais. Eram lembranças felizes e dolorosas.
Uma parte de si olhava o futuro, o horizonte, com alegria e empolgação, por ter a chance de realizar a maior de todas as aventuras. Uma aventura real, imprevisível, mas que representava a concretização do desejo mais secreto em seu coração, um sonho inalcançável, e que agora estava inacreditavelmente diante dele. Se tornar um samurai era tudo que queria.
Por outro lado, com a mesma intensidade, sentia como se estivesse abandonando sua atual vida, traindo o Sr. Onoke, o pai adotivo que cuidou dele com tanto empenho. Como poderia deixá-lo sozinho, cuidando da propriedade, com suas mãos doentes e necessitando de cuidados, com tantas tarefas para realizar todos os dias. Essa parte de si não queria partir, deixar sua vida calma de aldeão e suas rotinas costumeiras.
Orinsuke não aguentava mais a pressão. Precisava dizer algo.
- Desculpe, Sr. Onoke – foi a única frase que saiu.
- Você sempre pedindo desculpas. Quando vai parar com essa mania – falou o Sr. Onoke, quebrando seu silêncio.
- Se eu pudesse voltar atrás, escolheria não passar por tudo isso. Por minha causa o senhor vai ficar sozinho. Eu não queria…
- Não tenha pena de mim, garoto. Já vivi muita coisa na vida e sei me virar muito bem sozinho. Lembre que antes de você chegar eu já era um homem sozinho – o velho Onoke passou a olhar para as mãos, examinando-as.
- Eu sei, Sr. Onoke. Eu entendo que foi muito difícil para o senhor cuidar de alguém que apareceu de repente na sua casa, deixando as coisas mais complicadas. Desculpe se eu…
- Não fale bobagem, Orinsuke – dessa vez o Sr. Onoke falou com bastante seriedade. Pela primeira vez encarou o garoto. - Você nunca complicou minha vida. Apareceu justamente no momento em que achava que sem minha esposa, e sem a profissão que tanto gostava, eu estaria acabado de vez.
Orinsuke estava surpreso com as palavras do velho. Nunca foi de falar tanto sobre seus sentimentos, muito menos sobre sua vida.
- O.. obrigado, Sr. Onoke – Orinsuke sentiu os olhos lacrimejarem.
- Não me agradeça, pois não cuidei de você como um favor. Tudo que fiz foi porque….porque é meu filho.
Tomados pela emoção, os dois se abraçaram pela primeira vez em muito tempo. Orinsuke sabia que o pai não era tão afeito a contatos físicos, já estava acostumado, mas sentir-se acolhido em seus braços foi uma experiência nova em sua relação com ele.
- Kiha me disse que conversou com o senhor a respeito do que aconteceu – falou Orinsuke.
- Sim, nós tivemos uma longa conversa.
- Estou confuso, não sei o que fazer. Não queria deixar o senhor, mas….
- Você acha que não fiquei assim também quando descobri que minhas mãos já não eram mais as mesmas? Acha que foi fácil decidir sair da capital e parar com o meu ofício? Que não fiquei sem saber o que fazer da vida quando minha querida Hinamura partiu para o céu infinito? Uma coisa aprendi com meu pai. Quando os deuses colocam um novo destino à nossa frente, é porque o anterior não nos serve mais, entende.
- Acho que sim.
- Portanto, seja lá o que for essa coisa de magia que manifestou, significa que os deuses te mostraram um novo destino. A samurai falou a respeito dos riscos caso você voltasse para Kimoto comigo. Vi o quanto aquela guerreira estava falando sério, seu olhar não deixava dúvidas. Então vá, vá com eles Orinsuke.
O garoto ficou olhando para o pai sem saber o que dizer. Lágrimas corriam em sua face.
- Numa situação de perigo eu não poderia fazer nada por você, nem por nós. Nesse momento não há lugar mais seguro do que ao lado desses samurais. A vida deles não é fácil, é repleta de riscos, de conflitos e de sofrimento. Essa sempre foi e sempre será minha opinião. Mas, querendo ou não, são eles nossos maiores defensores, e através de suas habilidades, nos protegem a muitas gerações. Portanto, siga em frente sem olhar para trás, meu garoto. Treine com eles, aprenda com eles. E se for da vontade do deuses…..torne-se um deles.
- Obrigado, Sr….obrigado, pai.
Pai e filho mais uma vez se abraçaram carinhosamente.