O MUNDO AVERSO - PRÓLOGO

Galhos retorcidos se amontoam ao entorno de uma misteriosa e isolada cabana no interior de uma floresta que se usufrui da primavera. Não é possível ouvir os pássaros, os animais, os insetos e nem mesmo o vento, tudo esta envolto por um absoluto silêncio e uma voz que ecoa na escuridão rompe esse silêncio, soando de forma densa e obscura esta voz é um lamento de um ser que não mais pode se associar a vida, a voz fraca e quase inaudível repete a palavra “suma daqui”.

O som de passos apressados se amontoa ao entorno de uma cabana, a voz se aproxima em conjunto a esses passos e se torna cada vez mais nítido o que esta sendo dito, se trata de uma mulher idosa, que com passos largos a portadora da voz se move por entre as entranhas da mata e vai até a cabana em seu centro, a maneira como anda mostra já estar familiarizada com o local, porém esta claramente muito apreensiva.

Vestindo longas e empoeiradas vestes escuras que cobrem completamente seu corpo, fazendo com que seu rosto esteja ocultado pela sombra de um capuz que esta usando, deixando só os cabelos brancos e quebradiços serem vistos contornando toda a extensão do seu corpo. Ela então retira de suas vestes uma chave velha e enferrujada, usa-a para destrancar a porta da cabana e em seguida a adentra. Logo dentro, seu interior mostra-se um local abandonado, com poeira, teias de aranha e muitos papéis amassados espalhados pelo chão, além de vários livros amontados em todos os cantos, tornando uma visão catastrófica todo o ambiente.

Ela coloca as mãos em sua cabeça, olha para o lado e encontra um pequeno espelho em cima de uma velha mesa de madeira, ela o pega para tentar ver sua imagem e exprimi uma expressão de desprezo em seu rosto.

- Olhe no que me tornei – Pensa ela olhando para o espelho fixamente, porém nada é refletido no espelho e uma voz ecoa pelo ambiente em resposta, mas a voz não vinha da boca daquela idosa e era como se estivesse saindo de dentro da cabeça dela e ecoando por toda a cabana, a voz diz: “Você se tornou aquilo que almejou”.

As feições da idosa mudam drasticamente, se tornam mais tristes agora e ela começa a gesticular baixos murmúrios, abaixa-se no chão e se recolhendo próximo a um dos cantos da parede de sua cabana começa a apoiar-se contra seu joelho, logo lágrimas acinzentadas percorrem seu rosto e caem no chão formam pequenos cristais prateados. Ela então se ajoelha perante a sua imagem cruel, olha para suas mãos enrugadas e deixa sua mente vagar para o passado.

- Por que me tornei isso? – Diz a idosa em um tom baixo.

Sua voz soa pesarosa e fraca, pouca que ecoa pela semiescuridão da cabana, diferente da outra voz de momentos antes que reverberara com mais clareza. Ela então fica olhando para o espelho e movimentando-o com sutileza para os lados, segurando-o firme com seus dedos finos e gélidos. Então o espelho começa a sofrer com ondulações em sua imagem, como se estivesse sendo afetado por algum tipo de distorção, logo da imagem distorcida que nem a idosa refletia, começa a se desenrolar para outra imagem de algo acontecendo em uma região muito distante dali, uma pequena vila em chamas e selvagens a atacando e matando pessoas.

O caos pleno e absoluto tomando conta daquele local, cabanas em chamas, correria para todos os lados, mortos espalhados pelo chão, ao fundo alguns ainda lutando contra alguns dos selvagens e outros que ainda estão no chão, mas ainda estão vivos, porém agonizando de dor.

No meio de intensa batalha um jovem emerge da lama debaixo dos destroços de uma cabana, ele se levanta com dificuldade e tenta remover a pesada lama que encobre seu corpo, ele fica em pé e observa ao seu redor, seus olhos voltam-se para os destroços da cabana e ele se depara com pessoas que ele reconhecia e que estavam ensopadas de sangue, era sua família, seu pai e sua mãe, que agora ele podia ver claramente que estão mortos.

O jovem congela, não demonstra nenhuma reação por alguns instantes e então solta um grito, alto e forte, mas que dura poucos segundos, pois sua mente se esvai repentinamente e ele cai duramente por cima da lama, desmaiado.

A idosa sente algo dentro de si, uma espécie de conexão com aquele rapaz que ela viu na imagem, ela aparentemente presencia algo que não conseguia se lembrar a tempos, mas sua voz fraca emana a palavra certa para definir o que é “Emoções”, diz a idosa.

- Como pude me deixar completar por esse vazio? – As palavras saem pesarosamente, deixando novas lágrimas caírem no chão, logo a idosa afasta o espelho de si, colocando-o afastado no chão.

Novamente algo emana de dentro da cabeça da idosa, uma voz em tom alto e clara reverbera por todo ambiente, “ISTO É UM VÍCIO, UMA DOENÇA”.

- Não pode ser verdade, ele ansiará o mesmo que eu? – Questiona a idosa para com a voz que ela ouvira a pouco e a outra voz responde: “O QUE VÓS ANSIAIS É CONTAMINAR A TODOS COM SEU DESPREZO”.

A idosa deita-se no chão, seu rosto é coberto pelos longos cabelos brancos e as lágrimas enfeitam o chão, se amontoando e formando uma pequena poça prateada.

- Posso matar a negação dentro de mim? – Falando em um tom baixíssimo e quase inaudível diz a idosa.

Novamente a voz reverbera dizendo em um tom mal ameno: “Eu viverei para sempre, dentro dos corações vazios que surgem a cada dia”.

A idosa solta um grito agoniante, fecha seus punhos e soca fortemente o chão de madeira da cabana, ela sente a pele da sua mão se enroscar por uma pequena lasca de madeira, que entra por baixo da pele e a rasga e logo um filete de sangue escorre pela sua mão, ela então levanta seu braço e abre a mão e observa o sangue escorrendo e as pequenas gotas caindo no chão e se misturando aos pequenos cristais prateados oriundos de suas lágrimas.

- Eu nem mesmo me sinto mais viva.

Saah__
Enviado por Saah__ em 24/09/2018
Código do texto: T6458012
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