Meu Quarto
Li num livro que o quarto de uma pessoa mostra o que ela é, e quando entrei no meu quarto fiquei pensando nisso, e pensei mesmo, nossa, como sou transparente, como sou verdadeira, meu quarto é tão eu! Ali dentro, do meu quarto, as coisas, os sentimentos se revelam. Ele não é a parte da minha casa que passo mais tempo, mas é ali que minha identidade vem à tona.
Ali eu me abro pra mim mesmo, me reconheço, me sinto viva, me sinto eu. É no meu quarto que me aqueço das madrugadas frias que faz no rigoroso inverno, e que me sinto fresca nas noites calorosas do verão, sim do verão, enquanto suam lá fora, me refresco no meu quarto.
No meu quarto, vejo parte da minha alma, do meu coração batendo, vivendo, respirando em outro ser. Ali repousa além de mim, partes da minha existência, do ar que respiro. Meu quarto é simples, como eu, como minha vida, como aquilo que preciso para ser feliz. Tenho dois espelhos, que refletem minha alma, minhas verdades, minhas tolices. Em um deles, enxergo uma face e um corpo que todos enxergam, que todos veem. Noutro, esconde aquilo que ninguém além de mim, consegue perceber. Aquilo que realmente se mostra apenas ali, no meu quarto, na frente daquele espelho. Minha cama é grande, demonstra meu espaço, necessito de espaço.
Em uma das paredes, pedras, pedras duras, fortes e com cores quentes, como eu, que sou mais forte e quente do que fogo quando queima em seu clímax total. Ali transbordo de felicidade, mas também choro com o coração partido. Ali, eu sou eu. Ali sinto o cheiro que preciso para lembrar que eu existo. Ah, o cheiro, quem nunca entrou em seu quarto e não sentiu aquele cheiro de alívio, de identidade, o cheiro da própria vida. Meu cheiro é calmante, é sensação de estar revivendo novamente. O encontro ali, no meu quarto, nas minhas roupas guardadas dentro do guarda-roupa encostado na parede.
Meu guarda-roupa guarda um segredo sobre mim, que apenas meu quarto o conhece. Mas isso me tranquiliza, segredo a gente não fala, e ainda bem que guarda-roupa também não fala. Deito-me nas noites com o coração tranquilo e levanto-me nas manhãs com a alma renovada. Além dos espelhos, do cheiro, da imagem forte das pedras na parede, do guarda-roupa, guardo muitos outros segredos ali, e o único cúmplice desses segredos é fiel, e sei que jamais ninguém saberá, pois se tenho um amigo em quem posso confiar cegamente, é nele, em meu quarto.