Era tarde, mas nada que fosse me fazer acordar como um zumbi no outro dia. Ela surgiu vestida de branco, era magra, séria, branca, seus cabelos eram ondulados até a bunda, seus lábios eram grossos e seus olhos eram tão negros quanto minha pele.
 
 - Visagem. – Sussurrei, sorrindo.
 - Não dessa vez. – Ela respondeu com um olhar impassível.

 
Os pelos do meu corpo eriçaram e tive a impressão de que eu fosse cair. Aquele tipo de queda, em que parece que foi o chão que veio até nós! Era quase engraçado... 
 
- Então... do que se trata? – Perguntei me sentando na cama, ao lado da escrivaninha.
- Eu sou a Solidão.
- Cheguei ao ponto de ser recebido pela solidão?! Em meu quarto?! Será que eu posso ser um pouquinho mais perdedor?

 
Ela andou pelo quarto. Parecia uma humana comum, de pés descalços... uma hippie talvez. E exalava um cheiro de flores. Brinquedos estavam espalhados pelo chão, o quarto estava uma bagunça, mas ela não tropeçava em nada. Parecia já ter estado em meu quarto.
 
- Essa sua ironia... é pra que? – Ela perguntou, quase sorrindo.
- É meu charme, eu acho. Eu rio de mim mesmo... daí você ri de mim..., eu te levo pra casa... coisas acontecem. Mais ou menos assim.
-
Nossa. E isso tem funcionado? Tem dado certo? – Ela olhou nos meus olhos sorrindo. Era muito linda. Talvez a mulher mais linda que já tinha visto na vida.

Eu vestia um short vermelho, com desenho de flores. Ridículo. E tinha os olhos caídos de sono, mas meus cabelos estavam raspados e a barba, bem-feita. Meu cheiro estava impecável. Pra mim um homem que fede é um homem morto. É... eu levo bem à sério, essa coisa do cheiro.  
 
- Não. Não tem funcionado...
- E você sabe por que...?

 
Parecia que ela estava prestes a me humilhar... senti meu rosto ficando quente de vergonha.

- Seja sincero. – Ela disse, me olhando nos olhos. Cristo, como era bonita!
- Acho... acho que... talvez, porque agora eu realmente estou incomodado com  a solidão. OPA. Desculpa... incomodado com VOCÊ! Não leve pro lado pessoal, gata.

 
Ela se sentou ao meu lado, rente comigo, e seu cheiro me lembrou flores do campo..., mas não era exatamente isso, era uma fragrância que talvez nem existisse na terra. Encostou sua bochecha na minha e eu pensei que fosse me beijar.
 
- Cacete! Eu vou traçar a SOLIDÃO. - Pensei, alegre e atordoado ao mesmo tempo.
- Não vai não. – Ela respondeu, rindo.
- EPA! Não leia meus pensamentos! – Reclamei.
- Tenho que ir.

 
Se até solidão me abandona. O que eu vou fazer? Pensei comigo, com os olhos que ameaçavam chorar.
 
- Se eu pudesse subir em você... subia em você agora mesmo! Levante essa autoestima e vá ser feliz. – Ela disse sumindo em seguida.
- É. – Respondi.

 

E depois respondi de novo, e de novo... até o sono chegar.
 
 

 
Henrique Britto
Enviado por Henrique Britto em 24/03/2017
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