Melody e a Chave do Vitral - 1.5 Transmissão Regencial

Transmissão Regencial

O hemisfério Norte da Terra foi tomado por uma estranha transmissão naquela tarde, todo e qualquer aparelho que recebesse sinais de ondas foram afetados, rádios transmissores, TVs , Celulares, pulseiras holográficas, óculos cristais e até os painéis de propagandas das ruas estavam repetindo a mesma mensagem. No início só se ouvia estática nos rádios e telas embaçadas, e após alguns instantes, todos os veículos controlados por acesso remoto não respondiam mais, as fábricas que ainda restavam pararam, os ônibus estacionaram nas ruas e trens fluentes em algumas cidades também descansaram naquela hora.

O pânico começou alguns segundo depois alertando todos. As multidões corriam para os abrigos construídos durante todos os séculos de guerras constantes. Todos sabiam o que acontecia na sequência de um apagão eletrônico, é um efeito do Pulso Eletromagnético vindo de uma bomba nuclear. Naquele tempo já não existiam tantas assim para serem lançadas e ninguém sabia quem possuía tamanho armamento ainda, porém era sempre um risco quando essa sequência de eventos começava.

Demorou alguns minutos para todos se darem conta do que estava realmente acontecendo, pois os aparelhos continuavam ligados normalmente, como se estivesse apenas desregulados, ou fora de estação. As luzes mantinham sua frequência e não houve explosão alguma. Tóquio e Londres estavam entre as capitais que não sofreram tantos danos com as guerras e ainda mantinham uma população razoavelmente grande e uma infraestrutura aceitável para atender aos cidadãos, e mesmo assim estavam paradas. As demais “cidades” do globo apenas apreciavam a parada de seus aparelhos em uma esperança de que o pior não aconteça. Grupos de mercenários e bandidos em seus covis, davam pancadas nos aparelhos a fim de fazer o defeito passar, mas sem sucesso, praguejando em suas línguas que aqueles aparelhos não prestavam.

Todas as telas ficaram escuras e os rádios mudos, começou então um toque regressivo típico de cinema, as letras apareciam na tela e se transformavam em fumaça enquanto a seguinte tomava seu lugar com o “bip” curto. Na tela, uma linha começou a se formar, uma linha que lembrava uma foice. O desenho continuou e a lamina da foice se transformou em um grande “C”e dentro apareceram as letras “zar”. O silêncio era tão absurdo que se podia ouvir cada pessoa no norte falando mentalmente a palavra “Czar”. As pessoas se entreolhavam com ar de dúvida. Em Londres, uma senhora dentro do abrigo olhava para a telão na parede levantando-se, soltou as mãos da neta e levou ao peito enquanto lágrimas caiam por entre suas rugas e parecia não ouvir sua neta dizendo estar com medo. O símbolo piscou três vezes e deu lugar a um senhor de cabelos curtos e brancos que aparentava ter seus cinquenta e poucos anos e tinha uma expressão nada amigável.

Uma legenda abaixo da tela descrevia “Adlon Kempinski – 2º Regente da Cidade de Vidro”. Ele falava de uma sala extremamente clara, por de traz de uma mesa ampla valorizando suas vestes cor de prata e tons de azul.

- Caros humanos de classes inferiores (iniciou Adlon) como atual Regente da Cidade de vidro, faço uma convocação a todos, como é de conhecimento geral nossa cidade está isolada de todo o resto do planeta devido a nossa condição evolutiva superior - fez uma pausa. Em outras épocas, poderíamos simplesmente invadir suas cidades e eliminar o que houvesse pela frente que não fosse de nosso agrado, porém, para mostrar nossa misericórdia e sabedoria daremos uma nova chance ao resto de vocês.”

O senhor no vídeo tocou a mesa e um holograma hiper realista apareceu acima de sua mão, a imagem mostrava o busto de um rapaz perto de seus dezoito anos, cabelos loiros bagunçados , usava uma jaqueta de gola alta com faixas amarelas e insígnias pregadas no ombro. O Regente olhou para a imagem e voltou a falar.

“Esse jovem que vocês vêem é o Capitão Lahela (apontou com a mão inteira aberta em um gesto suave), ele era um dos nossos principais oficiais e há algumas horas, e fugiu de nosso convívio em direção ao Sul em um veículo experimental, ele é altamente treinado e pode ser letal mesmo desarmado, mas dada a situação ele levou consigo um pequeno arsenal capaz de causar grande destruição, principalmente a vocês, devido as vossas condições como seres inferiores - fez outra pausa, a imagem de Lahela desapareceu.

- O veículo foi disparado em direção ao portão do Elemental da Terra em Brahim na Indonésia, porém não temos sua localização exata os mapas mostram sua trajetória. Considerado um traidor Lahela será escoltado de volta a Cidade de Vidro por nossas forças especiais que estão posicionadas no eixo Tokio – Hong Kong – Brahim.

O que ordeno a vocês é simples: total cooperação (juntou os dedos formando uma pirâmide trazendo a frente do rosto). Qualquer um que for pego ocultando informação que ou de alguma maneira atrapalhar a operação de extração será considerado um traidor e executado. Aqueles que cooperarem terão suas vidas poupadas e, talvez, lhe será ofertado um um reconhecimento melhor aos que passarem informações sobre o paradeiro do fugitivo. Os pelotões devem chegar em algumas horas nas cidades citadas e qualquer hostilidade será retalhada a altura (Adlon relaxou as mãos por cima da mesa)

Nosso sistema central de informações está dentro de todos os seus aparelhos e temos livre acesso a qualquer comunicação, caso alguém ente vocês queiram esconder-se de nós. Sempre estivemos em paz e fechados em nossa superioridade merecida, não temos interesse em seres desafortunados como vocês, sendo assim não tornem as coisas mais difíceis do que precisam ser (olhava fixamente a ponto de entrar nos olhos dos expectadores). Se, em último caso, ele cruzar a fronteira da divisão, estaremos prontos para enfrentar todo tipo de aberração que tenha crescido por lá, libertando esses seres que muitos acreditam serem (levantou a sobrancelha em um movimento sarcástico) ‘mágicos’. Lembrem-se, isso não é um pedido, é uma ordem.”

Silêncio... seguido de um murmúrio geral, pessoas em todos os lugares comentavam o que estava acontecendo. Alguns protestavam e outros ficaram duvidosos, mas o pânico era geral. As luzes e aparelhos voltavam a funcionar normalmente, estações de trem e metrôs ascenderam ressuscitando os motores em fortes lufadas de ar.

No abrigo de Londres os monitores desligaram e o som parecia o de uma colméia de abelhas gigantes. A Senhora continuava em pé com a mão sobre o peito e mais lágrimas caíram dos olhos castanhos e cansados, sentiu alguém puxar seu xale e ouviu uma voz ao longe:

- Vovó! Vovó...

Uma garotinha puxava o xale e tentava tomar sua atenção até conseguir, fazendo ela olhar para baixo, limpando os olhos e respirando fundo

- Ele é o Imperador da história Vovó? – ela segurava o xale com mais empenho em um pedido de proteção, ao invés de atenção.

- Sim querida, é ele sim... – Fez uma pausa respirando fundo – Vamos indo, precisamos nos apressar.

Segurou a mão da neta, uma garota linda perto de seus dez anos, cabelo cachados negros e olhos estranhamente escuros.

- Vovó! Nós vamos encontrar com ela não é? – uma pergunta com ar feliz, diferente do medo que sentia a pouco.

- Sim... Vamos sim... Mas será um longo caminho até lá, a roda começou a se mover.

Agarrando-se ao braço da avó ela sorriu fechando os olhos e as duas saíram abrindo caminho entre a multidão desorientada. Se o resto do mundo pudesse olhar de cima, veriam o caminho das duas entre as pessoas formando um sulco semelhante ao de alguém que anda no meio do milharal, mas ao contrário de pessoas perdidas em uma plantação, elas sabia exatamente onde estavam indo.

Gabriel Torres Lobo
Enviado por Gabriel Torres Lobo em 20/11/2016
Código do texto: T5829493
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.