Quando o Amor é Verdadeiro.

Quando o Amor é Verdadeiro.

Estava rememorando uma conversa que tive há algum tempo atrás que me impressionou bastante. Há três anos quando fiz uma viagem de férias a Recife, conheci Sofia. Ficamos hospedadas no mesmo hotel. Eu estava sozinha, tentando curar um estresse e ela tentava esfriar a cabeça para recomeçar uma nova vida. Ela era uma jovem senhora, que devia ter mais ou menos 40 anos, de um aspecto ainda muito jovial, era extremamente simpática, e tinha um charme especial que nem sei explicar o que era exatamente. Além de deixar transparecer sua autoconfiança, como se nada, nem ninguém a atingisse. Parecia até que jamais havia conhecido alguma forma de sofrimento. Mas como diz o ditado: as aparências enganam, e era isso mesmo. Sofia já conhecia bastante da vida, já era madura. E com certeza tinha experimentado algum sofrimento. Tornamos-nos amigas, acho que tínhamos alguns pontos em comum, e Sofia me fez um desabafo de sua vida. Contou-me que estava muito decepcionada com o casamento, que acabara de desfazer. Um relacionamento de 15 anos. Embora tivesse três filhas maravilhosas, jamais pôde viver o amor pleno com seu marido, a princípio ela imaginava que com sua dedicação, lealdade, cumplicidade, faria com que o amasse, mas não aconteceu. Ano após ano, as dificuldades aumentaram,mesmo ao lado do marido ela sentia-se muito sozinha, queria algo diferente; queria viver com paixão; e essa pudesse transformar-se em amor verdadeiro. Mas era impossível! Porque o verdadeiro amor ela havia conhecido no início de sua vida adulta, por outra pessoa. Quando estava terminando a Faculdade de Biologia, quando conheceu um jovem, que chamava-se André, de idade semelhante a sua, que havia sido transferido de outra cidade, para trabalhar naquele lugar e estudar; por ironia do destino, em sua turma. Quando se conheceram, sentiram uma afinidade imensa, tornaram-se amigos e com pouco tempo estavam namorando. Sofia acreditava ter encontrado seu príncipe encantado. André era muito atraente, inteligente, romântico, compreensivo, além de ter um porte atlético e bastante bonito. Era encantador!

Foi amor instantâneo. Ela não sabia muito sobre André, a não ser o que captava em seu cotidiano. Ele não falava muito sobre si. Sofia acreditava que André seria seu porto seguro, porque se mostrava muito responsável. E assim passaram-se alguns meses e um belo dia chega a sua casa uma carta; no envelope estava escrito: At.srta. Sofia (confidencial). Que estranho!! Não costumava receber cartas. Ansiosa, abriu o envelope e começou a ler aquele conteúdo. Suas mãos começaram a tremer, seus olhos embaçaram-se, seu coração quase pára. Era uma carta de uma mulher que se dizia esposa de André. Também informava que tinham uma pequena menina, de uns três anos.E pedia para que Sofia se afastasse de seu homem. Para Sofia foi um choque, parecia que aos seus pés tinha uma fenda imensa, que agora ela caia, na velocidade da luz, e não tinha como segurar-se; André nunca tinha falado sobre isso, e ela não conseguia controlar o terror, a dor, como estava sentindo-se, embora ela o amasse demais, sentia-se traída na confiança depositada naquele amor e sua concepção não permitia que ela fosse uma intrusa naquela família, que destruísse um lar. Não podia! Mesmo com todo sofrimento que aquilo tudo lhe causara, ela não o odiava, compreendia que com ele tivesse acontecido o mesmo que acontecera com ela. Haviam se apaixonado. E ela tinha que ter forças para esquecê-lo. Os seus sentimentos ela conhecia e tentava controlar, mas o coração de seu amado, ela não se atrevia decifrar, estava em dúvida, não tinha certeza que dela ele gostasse, se a amava de verdade, se era capaz de fazer qualquer sacrifício por seu amor. E diante de tais obstáculos, só tinha uma saída – afastar-se daquele amor, ela detestava escândalo, mesmo que fosse por amor. Não mais telefonaria e nem atenderia os telefonemas de André, e não mais o encontraria. Até porque, André não se mostrara decidido a lutar por esse sentimento.

E Sofia decidiu que uma nova vida começaria. Sentia-se muito só, e a ausência daquele amor, lhe machucava profundamente, doía demais, seu coração estava dilacerado por tão grande ausência. Precisava urgentemente encontrar pessoas, conversar, prospectar algum possível relacionamento, para tentar esquecer ou adormecer aquele amor, que deixara tantas marcas em seu ser. A vida sempre lhe pregara peças, quando gostava de alguém, haveria de ter um empecilho, estaria fadada a viver sem amor?

Alguns meses depois, uma tia a convidou para um churrasco em sua casa, seria o aniversário de sua filha e ela havia convidado vários jovens da faculdade, seria bom para ela distrair-se, tinha que ir. Era ordem de tia! E assim ela colocou um short jeans, uma camiseta transada, um óculo escuro, deu uma olhada no espelho e até se achou bastante atraente. E resolveu ir. Porque não? Estava decidida. Haveria de encontrar alguém livre que pudesse compartilhar a vida com ela, sair, passear, viajar, namorar sem problemas. Tinha sofrido muito com seu último relacionamento, era tempo de parar. Ficar sofrendo nada adiantaria. Nessa festa da família, ela conheceu um rapaz, chamava-se Sam; logo que a viu ficou impressionado, apresentaram-se e ficaram conversando todo o evento. Na saída, houve a tradicional troca de telefones. Prometeram-se falarem, durante a semana. Mas na mesma noite ele telefonou para ela. Sam mostrava-se muito agitado e ansioso. Conversaram por um longo tempo. E assim foram noites seguidas. Após uma semana, marcaram um novo encontro; saíram para dançar, onde começaram a namorar. O ponto em comum: a solidão de ambos. Passaram-se alguns meses e Sam entusiasmado só falava em casar-se. Sofia era meio arredia. Sentia medo de enfrentar um matrimônio, era coisa séria. E seus sentimentos – o amor – eram poucos por Sam, para passar o resto de seus dias com ele. Por outro lado, já não era nenhuma criança, precisava encarar a vida que sempre sonhara, em formar uma família, ter seus filhos, sua casa; e agora era chegado o momento. E tomou uma decisão: casaria com Sam. Os preparativos foram providenciados.Marcaram a data.

Numa bela tarde, Sofia estava em seu trabalho, quando toca o telefone, era André.Há quanto tempo não se falavam... por volta de um ano. Este do outro lado pedia que ela concedesse alguns minutos à noite para ele. Precisava falar-lhe. Ela relutou. Falou que estava noiva e não podia ouví-lo. Ele foi super insistente e conhecia seus sentimentos, conseguiu. Encontraram-se naquela mesma noite e conversaram bastante. Ela confirmou que seu casamento aconteceria dentro de um mês, ele confessou que a sua vida não era das melhores, mas tinha uma filha para criar e a vida tinha que prosseguir, embora mais por uma conveniência. Foi uma despedida cheia de angústia e para ela a certeza maior de seus sentimentos por André. O amor por ele ainda dominava seu ser. Bastava uma palavra com firmeza, que mudaria tudo, mas veio o silêncio.

Um mês depois estava casada com Sam. Ele não parecia nada romântico. Era bastante egoísta, e cheio de manias. Era de um metodismo, sem igual. A cada dia que passava, Sofia podia perceber o quanto era difícil sua vida junto àquele homem. Ela havia sonhado tanto com o romantismo, mas Sam não era romântico, que frustação! E apesar de tudo, ela era totalmente leal, fiel, companheira, fazia tudo para não criar animosidades, não desagradá-lo, para não gerar discussões. Ela acreditava que, com o passar dos anos, com a convivência a chama da paixão fosse acesa, e chegasse o amor, daqueles que ela sonhava sentir, avassalador, que arrebatasse sua alma e entregasse ao seu marido; ela queria isso, por que não era possível?? Tanta insistência de sua parte e nada acontecia... Também ele não ajudava; em vez de conquistar aquele coração que ali estava, só aborrecia, exigia e traia com quem aparecesse.Com certeza ele não queria perder o conforto do lar. Era conveniente para ele. E chegava até a confessar dizendo: foi sem importância, passou. E tudo aquilo estava sendo somado e multiplicado no coração da pobre Sofia, que se sentia humilhada, explorada e aceitava tudo como se fosse obrigada, porque havia se casado com ele e esse era o preço, então haveria de pagar.

Vieram às filhas, três lindas meninas. Sam as adorava, mas nem assim seu comportamento melhorou. As crianças eram traumatizadas de escutar tantos berros. Ele não tinha autocontrole, qualquer aborrecimento começava a gritaria. E ela não sabia mais como lidar com aquela situação. Separar-se, seria a solução? E como cuidar sozinha de três filhas? Como conciliar a família e o trabalho? Não podia sair do trabalho, porque dele dependia a manutenção dela e das crianças... Então não enxergava alternativa a não ser ficar com aquele homem pelo resto de seus dias, pelo menos para suas filhas terem um pai presente. Pensava: a fase de amar já passou para mim. A vida limitava-se a uma conveniência. Sofia não tinha coragem de ficar sozinha. Achava-se até covarde, diante da situação. Mas por ironia do destino, ela descobriu sem querer que havia uma outra mulher na vida de Sam. Tinham um romance há muitos anos, e ela jamais tinha imaginado que isso estivesse acontecendo. Acreditava que suas saídas fossem algumas escapadas e só. Não um caso duradouro. Foi mais outra decepção gigantesca. Achou-se a pior das mulheres, não tinha conseguido nada de evolução naquele relacionamento. Embora tivesse se doado totalmente, na tentativa da construção de um lar equilibrado, nada dava certo. Agora só conseguia chorar. Todo o seu ser ardia, como se estivesse sido banhada por lavas de um vulcão em erupção, tamanha era a sua dor. Agora era a gota d’água, não mais relevaria. Ainda tinha um pouco de amor próprio, não viveria esse triângulo conscientemente. Sofia resolveu separar-se de Sam. Ficaria livre e o deixaria à vontade, para viver com quem quisesse. Conversou com Sam; agora uma conversa franca, pôs todos os pontos em discussão, ele negou, negou fervorosamente. Mas Sofia tinha toda a verdade dos fatos, era impossível não admitir. Por fim, Sam confessou como tudo ocorrera, e implorou uma nova chance. Estava disposto a passar uma borracha em toda a história e recomeçar: agora seria diferente. Fez-se de vítima. Mas Sofia estava irredutível, não queria mais continuar com uma eterna farsa. Na sua juventude, tinha renunciado ao amor de sua vida, para evitar uma situação semelhante, e agora o destino aprontava para sua direção. Não! E decididamente pediu o divórcio. Apesar de lutar a todo custo por uma reconciliação, Sam cansou em suas tentativas frustradas. E cedeu ao pedido de Sofia. Divorciaram-se. As filhas ficaram com ela, já estavam crescidas – 10 12 e 14 anos. Apoiavam a mãe diante dos fatos ocorridos. Formavam uma parceria para comandar a casa, tendo em vista que Sofia passava o dia no trabalho e só estava em casa a noite. Ela agora era mandante de sua própria vida. Estava livre para tentar ser feliz de verdade. Quem sabe se haveria alguma chance ainda para o amor? Estava tão profundamente adormecido que ela nem ousava imaginar. Será que seu amor da juventude ainda estava guardado em algum lugar? Aquele sim, era avassalador, que fazia tremer da cabeça aos pés. Que realmente encantava, e tudo parecia mágico. Estaria ele ainda ligado a alguém, ou também estava perdido no desencontro da vida? Oh! Como poderia saber? Se não o via há muitos anos e nem tinha notícias... Imaginava assim: se seu amor com André foi verdadeiro, seria igual a bumerangue, voltariam a se encontrarem e concretizariam aquele amor. ...Só o tempo era capaz de trazer uma resposta para suas indagações. Sofia estava disposta a reencontrá-lo e fazer um caminho de volta ao passado, para construir seu futuro.

Então depois da nossa longa conversa, compreendi o porquê de Sofia ter um ar tão superior e decidida. Sua experiência de vida, suas renúncias, a autoconfiança, sua capacidade de lutar para conseguir sua própria felicidade. Vi em Sofia, a força que devemos ter para encontrarmos soluções para nossa vida, que na maioria das vezes, nos acomodamos e esquecemos de lutar por nossa felicidade.

Cellyme
Enviado por Cellyme em 15/07/2007
Reeditado em 20/09/2007
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