O ANJO DA GUARDA - capìtulo X
"- Começo a pensar que meu tio não é nem um pouco bondoso... Se não, por que viveria num lugar cheio de maldade?"
Ao término do beijo descabido, o anjo outra vez apunhalava o próprio peito com um tanto de culpa, no entanto, tinha em mente que havia gostado daquilo, o mesmo ocorria com Evangeline e os dois se desculpavam a todo instante.
- Tudo bem, estou recuando, prometo que isso não mais acontecerá! Perdão.
Falava o anjo. Eis que, inesperadamente, surgiu aos tropeços uma mulher vestida de branco e azul-metálico, era Ilusory, a dona da ilusão, fantasiada da andorinha. Ela avançou para cima de Evangeline dizendo quase sem fôlego:
- Evangeline! Até que enfim te encontrei!
O anjo pôs-se ligeiramente na frente da garota, a escudando, e perguntou para Ilusory:
- Quem é você?
No que ela respondeu dizendo:
- Sou uma andorinha solitária que migrava para o Norte e que foi mandada para cá com um recado... E quase não chego, ufa! Aqueles corvos me perseguiam e queriam me capturar de todo jeito, mas ainda bem que te encontrei, menina! E trago um recado de seu pai.
De repente, os olhos de Evangeline brilharam cheios de esperança e ela indagou:
- Um recado de meu pai?
- Sim, um recado de Bemasas.
- E como está meu pai? Ele está bem?
- Bom... Preciso conversar em particular com você, querida.
Mas o anjo disse em controvérsia:
- Não, isso não.
E Ilusory, olhando para o anjo, falou:
- Fique calmo, Bemasas manda te dizer que pode confiar em mim! Mas, preciso ter uma conversa à sós com Evangeline, por favor...
Evangeline chegou bem perto do anjo da guarda e num tom de súplica, murmurou:
- Tudo bem, anjo, ela é de confiança. Me deixe conversar à sós com ela, preciso saber sobre meu pai.
- Por que sempre me pede coisas tão difíceis?
Disse o anjo da guarda, tomando um pouco de distância e deixando Evangeline e a dona da ilusão conversarem ali.
- Então, andorinha, diga! Como está meu pai?
Questionou a garota. Nisso, Ilusory segurou as mãos de Evangeline e com um olhar desfalecido disse:
- Eu sinto muito em te dizer isso, mas, seu pai está aprisionado e foi condenado à morte por um de seus inimigos.
- O-o quê? Não, isso não!
- Então ele me pediu para vir até você e lhe dizer que não poderá mais vê-la, mas que Malasas cuidará mutto bem de você.
Sabendo disso, Evangeline caiu em prantos e Ilusory aproveitou para pegar a faca que estava escondida em seu busto. O anjo viu de longe Evangeline chorar e seu semblante também entristeceu, entretanto, ao ver como a mulher "andorinha" batia enfurecida nos insetos que a rodeavam, o anjo ficou intrigado e, aproximando-se dela, gritou:
- Ei, você não é uma andorinha!
Ilusory levantou a faca contra Evangeline, mas o anjo a reteu, segurando seu braço e tentando arrancar-lhe a faca, ao passo que Evangeline contemplava em espanto a astúcia de seu anjo da guarda e a repulsa de Ilusory. Os dois enfrentavam-se como feras que competiam por uma única presa e a força de ambos era incalculável! Ilusory conseguiu derrubar o anjo, deitou sobre ele, prendeu seus braços contra o chão e falou em seu rosto:
- Um anjinho tão lindo... Quem diria que fosse tão agressivo!? Mas, o que você não sabe é que também tenho meu poder, querido, e você não é pairo para mim!
Contudo, nasceu no anjo uma força magnífica e seus punhos se livraram das garras de Ilusory e ele bateu forte contra o rosto dela, no que esta caiu. Levantou-se o anjo e ergueu a mulher pelo pescoço, a face dela estava com uma vermilhidão e seus lábios cortados; porém, ela continuava desafiando o anjo! Apertou o braço dele e suas unhas perfuraram a carne, ele largou Ilusory e ela apanhou a faca e o feriu no pescoço, mas nenhuma gota de sangue viu pingar do corte, o que a deixou estupefata. Então o anjo sorriu, tomou a faca das mãos da mulher e a partiu no meio com todo seu poder.
- Há algo que você não sabe sobre os anjos da guarda...
Dizia o anjo, avançando com suas grandes asas exuberantes contra Ilusory, à medida que ela dava passos para trás e se aproximava do abismo.
- Quando somos destinados a guardar a vida de uma pessoa, fazemos tudo o que for preciso fazer, sem hesitar em momento algum...
Ele continuou dizendo, quando Ilusory já estava a um passo do abismo e o fitava com muito temor. Ora pois, o anjo a tocou no ombro e concluiu:
- E isso é por ter intentado contra a vida da minha protegida...
- Não...
Disse Ilusory, e o anjo a empurrou e ela foi lançada de uma grande altura, só ouviu-se o seu grito em ecos morrer lá embaixo da neblina. O anjo então correu até Evangeline e passou a analisá-la prestativamente.
- Você está bem?
Ele perguntou, inquieto e, meneando positivamente a cabeça, respondeu Evangeline:
- Sim, estou bem.
- Me desculpe, não devia ter te deixado com aquela farsante! Bem que algo me dizia que ela não era de confiança.
O anjo abraçou Evangeline com o coração a mil e ela murmurou com a cabeça em seu peito:
- Começo a pensar que meu tio não é nem um pouco bondoso... Se não, por que viveria num lugar cheio de maldade?
E lá na cidade de luz, Bemasas ainda aguardava irrequieto pela andorinha que enviara a Corvus, porém, vinha-lhe tão somente o amigo Anil para apoiar-se em seu ombro e dizer:
- Ainda tem esperança de que a andorinha volte? Não quero ser pessimista mas, andorinhas só retornam na primavera.
Bemasas baixou a cabeça e suspirou profundamente, quando disse mais Anil:
- Bem, agora é minha hora de ir.
- E como fará isso?
Bemasas perguntou.
- Manda-Chuva vai me ajudar.
Manda-Chuva fez descer uma chuva passageira e depois do sol ressurgir veio com ele também os irmãos arco-íris, que sem Anil eram somente seis.
- Adeus, amigos, e boa sorte!
Falou Anil despedindo-se e indo para junto de seus irmãos. Ouviu-se em sequência um trovejar e Manda-Chuva falou em alerta:
- É um chamado do rei Chuva! Preciso voltar também.
- E onde você vive?
Questionou Bemasas.
- Entre as nuvens!
- Bom... Então adeus.
Manda-Chuva transformou-se em gota dágua e evaporando com os raios de sol ele subiu até as nuvens. Restando agora a fada Grina e os gêmeos Dici e Onário, Bemasas pediu humildimente à fada da prosperidade:
- Grina, antes que decida ir embora, poderia reconstruir a ponte? Pois como vê, roubaram todos os brilhantes e aquela ponte eu havia passado anos a construir, só para Evangeline.
- Claro!
Disse a fada que, sobrevoando o local da ponte, chacoalhou sua varinha de condão e refez toda a ponte com milhares de diamantes e pedras coloridas, de ponta a ponta. Depois disso, Bemasas agradeceu à fada e ela se foi. Porém, Dici e Onário montaram no urso gigante Ponpon e gritaram para o anjo do bem:
- A Cidade das Palavras fica mais à frente, então vamos com Ponpon!
E Bemasas falou:
- Esperem! Eu vou com vocês! Para onde eu vou também fica por esse caminho.
Então o anjo do bem também subiu nas costas do urso e deixaram a cidade de Luz; Dici e Onário iam para a Cidade das Palavras e Bemasas buscar a filha.
Continua...