O ANJO DA GUARDA - capítulo III

"Ó, minha amada Angelina, minha estrela eterna, que todas as noites me segue com teus olhos brilhantes... Se fiz o que fiz, foi pelo bem de Evangeline, não reduza teu brilho assim diante de mim! Não se esconda por entre as nuvens de fumaça!"

Atravessando a montanha, o anjo fez pouso sobre o chão e desceu Evangeline, assim ele aproveitou para alongar as costas e livrou-se das pancadas nas costelas. Um pouco à frente, havia um gigantesco portão de bronze e apontando para ele, Evangeline disse:

- Olha! Que portão grande!

- Acho que chegamos na cidade de seu tio. Vamos até lá.

Falou o anjo e eles foram caminhando pela longa estrada (porque o anjo já estava exausto de bater asas) e Evangeline perguntou:

- É verdade que os anjos da guarda conseguem ficar invisíveis?

E respondeu o anjo:

- Sim.

- Me mostra! Me mostra!

E de supetão o anjo ficou invisível, como uma mágica. Pousando em cima de uma árvore, o corvo servo de Malasas avistou a menina, somente, e foi voando falar com seu mestre.

- Sua sobrinha já se aproxima dos portões da cidade.

Ele disse.

- É?

Perguntou Malasas, desgostoso.

- Sim... E vem sozinha.

- Sozinha?

- Sozinha.

- Ótimo! Então dê logo um fim nela antes que entre na cidade, não quero ainda ter que ver a cara da filhinha de Bemasas.

O corvo soprou um ar de exaustão e deu de ombros, mas Malasas o interrogou:

- E como vai fazer?

E o corvo, virando-se para ele, disse:

- Eu me aproximo da garota e... Splash!

- Splash? O que é splash?

- Eu sufoco ela. Splash!

- Vá, depressa!

O corvo foi até a entrada da cidade, vendo a menina só, ele se aproximou transformado em homem, sem ela perceber e preparou-se para atacá-la, mas foi surpreendido pelo anjo que retomou sua visibilidade e se pôs de frente à Evangeline.

- Fique longe dela!

Bradou o anjo, e o corvo, recuando, falou:

- Calma, eu não ia lhe fazer mal! Só queria dar as boas vindas e... Ajudá-los! Sim, ajudá-los! Olha, o portão de entrada para Corvus está bem ali!

- Já tínhamos notado isso.

O anjo disse e, segurando a mão de Evangeline, foi até o portão, ao passo que dizia o homem negro:

- Mas, caso não saibam, para poder entrar na cidade de Corvus, é preciso pingar três gotas de sangue do próprio pulso na fechadura dos portões, para que eles possam se abrir. E, pelo que sei, você não pode jamais ferir e nem deixar que firam a menina, e você é um anjo, não tem sangue. Então, como vai fazer?

O anjo olhou desconsolado para Evangeline e soprou um ar de aflição, quando disse ainda o homem corvo:

- Mas, se caso resolver abrir uma excessão, eu posso ajudar a retirar as gotinhas da menina. É só me chamar!

Ele transformou-se em corvo e ficou sobre o galho da árvore e disse ao anjo:

- Estarei bem aqui.

O anjo da guarda olhou com piedade para Evangeline e depois para o corvo lá no alto, mas falou para a criança:

- Fique aqui.

Então ele voou para o topo dos portões, para saber se havia como atravessá-los por cima, foi quando as grades dos portões se transformaram em braços e se alongarão até as nuvens do céu e ficou impossível o anjo passar para o outro lado, no que ele voltou para o chão e soprou um ar de impaciência. Evangeline perguntou:

- E agora? Como vamos atravessar?

E, passeando os olhos por todos os lados e observando os corvos que cobriam o céu, o anjo falou alto:

- Tenho percebido que os corvos daqui são todos covardes!

Nesse instante, o corvo que estava na árvore baixou a cabeça com indignação para o anjo e este outro continuou dizendo:

- Sim, porque zombam de nós por não podermos atravessar o portão, mas isso é fácil para corvos que já são daqui e podem passar de um lado para o outro quando bem quiserem e nem ao menos sabem o que é atravessar um portão!

O corvo, revoltado, desceu até o anjo e tornando-se homem, falou:

- Isso não é verdade!

- Não? Duvidam que saibam ao menos o que é abrir um portão! Se é que os portões se abrem com gotas de sangue de corvos.

- Pois vou te mostrar como está enganado e que posso sim atravessar o portão!

O homem corvo cortou o pulso numa planta espinhosa que se trepava nas grades e pingou três gotas do sangue na fechadura do portão e ele começou a se abrir, num ruído ensurdecedor, e o corvo atravessou facilmente para o outro lado e disse olhando para trás:

- Viram? Eu consegui atravessar e vocês ainda estão aí do lado de fo...

O corvo percebeu que o anjo e a menina já haviam atravessado o portão e corriam longe, no que ralhou:

- Malditos!

Malasas estava na varanda de nuvens negras, adimirando seu mundo negrume, quando surgiu o corvo pelas suas costas e ficou quieto, com as mãos nos bolsos.

- Diga algo!

Falou Malasas, e o homem corvo disse:

- Algo.

- Não provoque meu furor. Acabou com a menina?

- Eu... Não consegui.

- Como assim não conseguiu?

- Ela estava com o anjo da guarda!

- "Ela estava com o anjo da guarda!" Seu inútil! Acha que essa é uma boa desculpa?

- Mas, mestre, ele é muito inteligente!

- Ou você que é muito burro?

Malasas começou a caminhar de um lado para o ouro, apertando as mãos de raiva e disse:

- Está vendo? É por isso que o bem sempre vence o mal! Porque ele trabalha com sabedoria e eu com um bando de idiotas! Suma daqui e me deixe pensar em algo.

Enquanto isso, Bemasas era levado como presente para a rainha Casma, ela reinava na cidade de Estemar, bem distante da cidade de Luz, e tanto quanto Malasas, almejava destruir Bemasas, porquanto não suportava sua prosperidade e grande era sua inveja e, como agradecimento por Casma ter ajudado em tantas situações, Har quis entregar em suas mãos Bemasas, para que Casma fizesse dele o que bem desejasse. Bemasas era levado num trem de duzentos vagões que andava por cima de trilhos voadores, a mais de cem metros do chão e já era noite e a viagem duraria até o amanhecer. Aprisionado em um dos vagões, olhando o céu cheio de estrelas pela pequena janela, o anjo do bem falava em lamúria:

- Perdoe-me, querida Angelina, por entregar nossa filhinha nas mãos de Malasas, mas acredito que o anjo cuidará dela... Você mesmo me disse que ele a guardaria de todo o mal, por onde quer que ela fosse! Ó, minha amada Angelina, minha estrela eterna, que todas as noites me segue com teus olhos brilhantes... Se fiz o que fiz, foi pelo bem de Evangeline, não reduza teu brilho assim diante de mim! Não se esconda por entre as nuvens de fumaça! Me deixe te ver até a aurora, até minha chegada à Estemar, de lá, volte seus olhos para nossa menina, que meu destino só está nas mãos de Casma.

Continua...

Lyta Santos
Enviado por Lyta Santos em 12/05/2016
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