ATÉ QUALQUER DIA

Miriam acordou com a música de Gonzaguinha na cabeça: Viver e não ter a vergonha de ser feliz. Cantar... (e cantar e cantar...) A beleza de ser um eterno aprendiz...

Enquanto escovava o sofá ela pensava em Pablo. Por que ele se fora daquela forma?

Eles sempre se deram bem. Não deram?

Mordiscando uma unha lascada ela falou:

̶ Onde foi que errei?

̶ Mas eu errei? Putz, fiz tudo para dar certo este namoro. Até engoli sapo. Suportei a chata da tia dele e aquela prima horrorosa.

Resolveu colocar um CD para tocar e começou a dançar.

Chorar porque o namorado a deixara? Nem pensar. Chega o que já chorara por Artur.

Conheceu Pablo no mesmo barzinho onde um dia o esposo lhe dissera adeus.

Algo a estava intrigando. Por que os homens sempre se afastavam dela mesmo sendo bonita e boazinha? Pelo menos era o que diziam: que era bonita e boazinha.

Não gostou do CD escolhido e pegou outro no estojo. O CD do Gonzaguinha não estava ali. Onde teria deixado?

Ah! Tudo bem. Uma hora encontrarei.

Escolheu um do Raça Negra e continuou a faxinar o apartamento.

Quando te encontrei juro não pensei que iria me apaixonar...

Ficou prestando atenção na letra da música e se perguntando: Por que não se apaixonara por Pablo?

Até que tentara ser feliz com ele.

Será que era por que não conseguira ainda tirar Artur da cabeça?

De repente o estalo lhe chegara. Não conseguira esquecer o esposo. Como ele estaria? Teria se esquecido completamente dela?

Artur lhe dera tantos CDS do Raça Negra. Ele sabia que ela gostava.

Volta pra mim, não faz assim, meu coração sabe o quanto eu te amei...

No primeiro ano do casamento tentara engravidar e não acontecera. Como gostaria de ter um filho dele!

Já fazia dois anos que, diante do juiz, eles se separaram.

Que dor voltar para casa sozinha! Que dor ver os armários do lado dele vazios!

Tentara suprir esta ausência com festas e flertes.

De que adiantara? No primeiro ano até que conseguira. Depois ficara seis meses na maior deprê. Então apareceu o Pablo e as coisas até que iam bem. Ou não iam?

Ele era órfão e morava com a tia e a prima desde pequeno.

“O meu coração já tem um novo amor”

As frases das músicas lhe tocavam o coração. Que pena que não era verdade!

Que novo amor, que nada!

Não o esquecera.

Soubera através de Lucia que Artur voltara a morar em Campos.

Tudo bem, ele devia estar bem. Devia ter encontrado outra.

Pronto! Está impecável meu AP. Mas pra quê? Pra quem?

Estou perdida, estou carente...

Que inferno de música!

Tirou o CD e dobrou as roupas que já estavam secas no varal. Olhou pela janela. Lá embaixo viu alguém se aproximando do prédio.

Pablo! Seria ele?

Fechou a janela rapidamente e sentou-se no sofá.

Melhor deixar tudo como está, pensou. Lembrou-se que ele não usou a palavra adeus. Ele dissera simplesmente: Até qualquer dia.

Não atenderia o interfone.

Não atenderia.

No coração somente existia lugar para um homem: Artur.

Chega de tentar me enganar.

Ligou a TV e ficou vendo um documentário.

Duas horas depois acordou.

̶ Nossa! Dormi vendo TV.

Resolveu tomar um banho e em seguida foi preparar alguma coisa para comer.

Não era Pablo, pensou. Melhor assim.

Estava virando o frango na frigideira quando o celular tocou.

Nem olhou o número no visor e atendeu.

̶ Miriam?

̶ Sim. Sou eu.

Aquela voz! Deus! Era Artur.

̶ Podemos nos ver? Preciso falar com você.

Artur? Ela não podia acreditar... Artur? O que ele estaria querendo com ela? Ele lhe dissera adeus. Adeus.

Atônita, a voz lhe sumiu.

̶ Está aí, Miriam?

Gaguejando ela respondeu que estava.

̶ Posso lhe ver agora?

̶ Agora? Não estou vestida adequadamente.

̶ E por acaso a mulher que amo precisa estar vestida adequadamente para mim?

̶ O que você falou? Mulher que você ama?

̶ Sim. Eu descobri que não consigo viver sem você.

̶ Seu bobo! Para de brincar comigo.

̶ Então volta e fala pra mim que é mentira, que não vai me deixar por ninguém...

̶ Foi você que partiu, foi você que me disse adeus.

̶ Eu sou um besta. Demorei a entender.

̶ Demorou a entender o quê?

̶ Que eu te amo, sua boba! Já terminou com aquele babaca?

̶ Você soube que eu estava namorando? Achei que você já estava morando com outra.

̶ Vá até a janela.

Miriam abriu a persiana e viu o carro de Artur estacionado.

̶ Estou subindo.

̶ Espera.

̶ O quê? Você não está sozinha?

̶ Claro que estou.

No minuto seguinte ela estava cantando de novo a música do Gonzaguinha. Não era a toa que neste dia acordara com aquela música na cabeça: Cantar e cantar e cantar...

Cinco minutos depois estava nos braços de seu amor. Sim, Artur era o homem que seu coração guardara. Era ele que ela queria pra sempre.

Estreitados num abraço beijaram-se apaixonadamente.

SONIA DELSIN
Enviado por SONIA DELSIN em 10/05/2016
Código do texto: T5630987
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