"Toque do vento"

Peças de roupas espalhadas pelo chão, janelas abertas

escancaravam aos ventos toda a minha ira. Ao canto uma poltrona,

seduzia-me com seu aconchego e beleza. Dava passos cansados.

Ainda instigada pela ferocidade dos meus pensamentos.

Na janela debrucei-me, abri meus braços, recebi do vento a

volúpia quente e sedutora de sua respiração. Eu ainda ouvia os

zunidos ao longe, assobios alucinantes que me deixavam cada vez

mais instigada.

Dialoguei com meus extintos, retirei deles gemidos e palavras

insanas. Sentia a carícia ousada daquele vento indecoroso, a tocar-

me toda, sem pudor e todo faceiro. Beija-me os lábios com destreza;

habilidade jamais sentida, ambicionada e investida.

Repousa em meu pescoço o seu toque, percorrendo com

seus lábios por toda extensão. Realiza, excita e vulgariza cada trecho

pela língua percorrida.

Do pescoço à nuca: pêlos eriçados, pele arrepiada, tremor

de pernas imperceptível, loucuras fervilhando o sangue já

enlouquecido.

Passeia com a destra língua, teimosa e desmedida. Recolhe

os meus mais íntimos segredos e os desvenda. Ainda em mim, deflagra-

se canibal: morde, provoca, suaviza e domina.

Aos lábios meus retorna, repousa ofegante. Contorna ainda

com a língua molhada e excitada. Devora, aprisiona e degusta.

Ao retorno, pescoço. Em declínio, a língua desvanece:

majestosa, perigosa e ardilosa.

Montanhas de pele e calor: a língua sobe e desce, as

fertiliza, umedece e as deixa eretas.

Obelisco sagrado de seus lábios: deleita-se nas montanhas

do meu corpo, consagra-se rei.

Carne, suores, calores e aromas: instigo a descida.

Sussurros, provocações e previsões: “desce, desce e desfrute”.

Passeio de rastejante, a libido acionada. Escorrega por entre

a planície da paixão, sacia sua sede na pele que já transpira.

Desavergonhado olhar a conferir ação: desafia e seduz – em

êxtase!