872-O OÁSIS DA ABUNDÂNCIA- Uma história de Jesus de Nazaré
Caminhavam com dificuldade pelas areias do deserto, sob o sol inclemente e rajadas de vento forte que levantava a poeira arenosa, qual agulhas de fogo queimando a pele dos corajosos peregrinos.
Eram treze homens, em trajes simples: uma túnica que se estendia dos ombros aos pés; calçavam rústicas sandálias. Cabelos e barbas compridas, escondendo as feições as quais, se pudessem ser vistas através da cortina de pó, revelariam a origem judaica.
Embora se assemelhassem entre si na forma paciente e determinada de caminhar, nas vestes e nas feições, tinham um guia, que chamavam de Mestre.
Nada carregavam pacotes, mochilas ou embornais, nada que pudesse retardar a caminhada ou servir-lhes de abrigo nas noites frias do deserto. Quando a noite chegava, sempre encontravam uma família caridosa que lhes davam o que comer e lhes oferecia lugar para passarem a noite.
O Mestre, homem sábio e filósofo, mas ao mesmo tempo cuidadoso com seus amigos, sempre encontrava uma maneira de suavizar a caminhada e aliviar-lhes o cansaço, a fome e a sede.
A região era árida mas nem por isso totalmente deserta. De tempos em tempos, encontravam caravanas e se deparavam com oásis: grandes ou pequenos, constituíam sempre lugar de refrigério, descanso e paz.
Assim, foi com grande alegria e alívio que viram um oásis, uma mancha verde cercada por todos os lados pelas areias douradas do deserto.
O Mestre e os seguidores caminharam até o local. De longe percebiam que seria um oásis de tamareiras; e adivinhavam que haveria uma fonte de água cristalina para se dessedentarem.
Ao chegarem às bordas das tamareiras, se supreenderam com uma choupana feita de palmas e troncos de tamareiras. Parecia até inabitado, mas um casal de idosos ali vivia.
O grupo de peregrinos poderia se espalhar pelo pequeno bosque de tamareiras e comer o que pudessem. Mas, não. O Mestre preferiu chegar à porta do barraco humilde e pedir ao casal de velhinhos que lá estava:
— Meu bondoso velhinho, posso comer algumas tâmaras do oásis? E tomar um pouco da água da mina que vejo acolá?
O velho, olhando para a mulher, disse:
— Sim, mas não é preciso ir até as tamareiras. Temos aqui uma vasilha com tâmaras já preparadas, estão suaves como o néctar das flores. Temos uma pequena taça de mel que lhe ofereço. E beba da água do pote, é mais fresca do que a da mina.
Antes de pegar uma tâmara, o Mestre disse:
— Tenho alguns amigos que me acompanham. Posso chamá-los para participarem desta refeição?
O velho olhou para a esposa, e ambos cochicharam entre si. O velho voltou e disse ao Mestre:
— Só temos aqui estas tâmaras, esta taça de mel e este pequeno pote de água. Mas, sim, manda seus amigos entrarem. Eu mesmo vou colher mais tâmaras, e trarei mais água.
O Mestre então disse:
— Aqui, onde come um, comem cem. Não precisa colher mais tâmaras nem buscar mais água, nem se preocupar com o mel. O que temos aqui é suficiente. – Disse o Mestre, fazendo um gesto com a mão direita, sobre o prato, a taça e o pote.
E chamou os discípulos, que se sentaram no chão, pelos cantos da humilde choupana. E repetiu:
— Aqui, onde come um, comem cem.
Em seguida, passou o prato de tâmaras, a taça de mel e o pote d’água entre os discípulos. Cada qual comeu o quanto quis e se fartou bebendo do pote.
O velho e sua mulher ficaram surpresos ao verem que o prato de tâmaras não se esvaziava. O mesmo acontecia com a tacinha de mel e com a bilha com água. Assim, eles também participaram da refeição e comeram como há tempo não o faziam. Quando terminaram, o prato tinha mais tâmaras, a taça estava plena de mel até a borda e o pote d’água estava cheio até o bico.
Os dois velhinhos estavam assustados, pois sabiam, na sua simplicidade, que haviam presenciado um milagre. Sentiam que estavam na presença de um homem muito especial. Ainda assim, ela falou com o Mestre:
— Aqui não há lugar para todos dormirem. Mas meu marido irá cortar mais folhas das tamareiras e prepararei o local para todos.
O Mestre aceitou. E embora os três minúsculos cômodos do barraco fossem suficientes só para o casal, neles dormiram o Mestre e os doze seguidores.
No dia seguinte, antes de amanhecer, o Mestre se pôs de pé e acordou os seus seguidores. Os velhinhos também acordaram. A anciã não queria que eles partissem, e disse ao Mestre:
— Fique conosco mais algum tempo.
Ele respondeu:
— Devemos seguir nosso caminho. Agradeço a vocês dois e os abençôo. Lembrem-se de que aqui, onde come um, comem cem.
E seguiram.
A partir daquela visita, os velhinhos notaram que a cada dia que passava, as tamareiras se multiplicavam, aumentando o tamanho do oásis, produzindo mais e mais tâmaras. As abelhas vinham fazer suas colméias nas proximidades do barraco; e a fonte, cada vez mais, jorrava água límpida e refrescante.
Não demorou muito tempo e o oásis ficou conhecido dos caravaneiros que por ali passavam como o Oásis da Abundância.
ANTONIO ROQUE GOBBO
Belo Horizonte, 3 de dezembro de 2014.
Conto # 872 da Série 1.OOO Histórias