SEM NENHUM TOM DE CINZA
 
Foi tudo tão de repente. Nunca gostei de carnaval. Caminhava tranquilamente no calçadão naquela manhã de sábado ensolarado. A rua estava movimentada. Muitos foliões fantasiados convergiam para o local de concentração do bloco que desfilaria em pouco tempo.  Ouvi ao longe os clarins e os tambores provavelmente aquecendo-se para o desfile.
Enquanto caminhava eu pensava na vida e ouvia músicas no fone de ouvido. Vivia só nesta cidade e a saudade dos familiares incomodava, sobretudo em época de feriado prolongado em que eu bem poderia ter viajado para ficar com a família mas impossibilitado pelo trabalho não pude fazê-lo.
O desfile do bloco começou e não dei muita importância continuando a caminhada. Logo fui alcançado por aquela horda de foliões que dançava e cantava músicas de carnaval. Em pouco tempo toda a rua foi tomada pelo povo que acompanhava o bloco e inevitavelmente tive que interromper a caminhada e esperar que passassem.
Coloquei-me estrategicamente encostado em uma parede onde pude observar o desfile da agremiação esperando que passasse logo para que eu pudesse retomar a caminhada.
De onde eu estava como num passe de mágica, notei uma linda mulher no meio daquela multidão, que pulava e cantava olhando para mim sorrindo. Não pude deixar de retribuir com um sorriso, tamanha era a insistência do seu olhar.
Ela saiu do meio do povo e veio em minha direção pegando minha mão e me levando para brincar o carnaval com ela. Meio deslocado entre aquelas pessoas procurei acompanhá-la sem a perder de vista enquanto ela sambava e rodopiava.Terminado o desfile fomos tomar banho de mar e acabamos passando o dia juntos. Almoçamos e fomos para o hotel onde ela estava hospedada e descansamos durante a tarde, saindo à noite.
Ela era só felicidade e alegria. Aproveitava cada momento e procurava divertir-se sempre. Notei que tinha um sotaque de fora. Perguntei por curiosidade de onde ela era e a resposta foi: Apenas fiquemos juntos sem perguntas e sem cobranças. Silenciei e aproveitei sua agradável companhia.  E assim foi durante todo o carnaval.
Confesso que aquela mulher me cativou de tal maneira que ao me despedir dela na quarta-feira de cinzas senti um vazio repentino como se estivesse perdendo um grande amor. Ela embarcou num táxi rumo ao aeroporto e da janela mandou-me um beijo e disse: Adeus lindo arlequim.
Enquanto o táxi se afastava meu olhar perdia-se no vazio envolto nas lembranças daquela colombina que me encantou naquele carnaval e partiu sem sequer me falar seu nome.

 

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Valdir Barreto Ramos
Enviado por Valdir Barreto Ramos em 15/02/2015
Reeditado em 15/02/2015
Código do texto: T5138549
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