O Lobo Solitário
E o lobo solitário, prateado, porque a lua, com sua luz de empréstimo, banha-o todo na glória fria dos ventos outonais, retorna. Retorna o lobo solitário.
Ele é feroz, não por raiva pura e simples, mas porque não aprendeu a expurgar suas frustrações doutra forma.
Ele vaga. A neve, que é pouca e branca, mais que seu pelo, é amassada devagar, levemente, sutilmente, com os passos lentos e insinuantes do lobo solitário. Ele insinua uma dança - sua dança - porque anda leve e suave, mas ele tem firmeza, porque sabe onde pisa, porque sabe que caminho trilha.
Oito anos atrás foi quando ele se descobriu lobo. E solitário. Descansava, sentado - jamais deitado, "deitar-se somente na segurança do lar" - sobre o último degrau da escada de concreto à vista. A lua o coroava, sobre sua cabeça descansava, reluzindo contra o pano preto furado. Nos degraus inferiores beijam-se e acariciam-se casais. Amam-se, decerto.
O clima é agradável. O vento se amiúda, mas não cessa.
Ainda que aguce os ouvidos ele nada escuta.
Silente, imóvel, descansa.
A lua precisava coroar alguém, afinal.
"Não se desligue de mim!", gritou o lobo, inutilmente. O dia já raiava. E sempre que o dia renasce, ressurge com ele a luz que expõe as chagas ainda abertas, as cicatrizes.
"E como é claro o dia que vem", disse nosso herói, "seguirei trilhando, pois a viagem é longa".