Os invisíveis
Enclausurado no acrílico esquife cruciforme, Ele a tudo olha, a tudo percebe, angustia-se por estar ali à disposição para ajudar a quem o evoque, mas fica-lhe a nítida impressão de que seu claustro é formado por espelhos falsos, daqueles que se veem em filmes policiais, que permitem que ele veja tudo, mas impedem que os do outro lado o vejam.
Como queria poder abraçar, amparar, tocar, aconselhar àquelas pessoas que caminham sem rumo e sem confiança de que algo ou alguém poderiam dar-lhes o refrigério em meio às vicissitudes da vida.
Não existe nada mais angustiante do que saber que se pode fazer a diferença e ser impedido disso pela descrença alheia.
Do lado de fora, encontra-se, agora, Amanda, uma jovem com os olhos opacos pela falta de esperança, pelo acachapante sentimento de ser uma invisível na sociedade meritocrática que tudo cobra e nada oferece. O sentimento da jovem é o de quem caminha como uma sombra por entre a humanidade, julgando-se desprovida de atrativos físicos ou intelectuais capazes de angariar os olhares de seus pares.
Já faz muito tempo que não recebe atenção além daquela que impõem as regras da boa educação:
Bom dia; Boa tarde; Boa noite!
Como você está? Ah, esta é aquela pergunta que todos fazem por fazer, sem a menor intenção de ouvir outra resposta que não seja um "tudo bem e você?"
Basta alguém começar a explicar sua real situação que o interlocutor logo se apavora, perde o interesse e alega algum compromisso par ausentar-se do diálogo.
Amanda sabe disso muito bem e, em meio a tantas ausências de um ombro amigo, está em vias de desistir de tudo, abandonar de vez as esperanças e lançar-se no escuro túnel que separa a vida do esquecimento permanente.
Dentro do esquife o homem se debate, esmurra a caixa, busca de alguma maneira chamar a atenção daquela jovem que está prestes a sucumbir às pressões martirizantes de sua indigência social.
Um olhar para o alto, buscando seu pai, um pedido de misericórdia por aquela pobre alma, lágrimas que rolam pela sua face, deflagradas pela misericórdia e empatia que tem por toda a raça humana...
Uma luz que se acende no interior do receptáculo, tornando visível o que era impenetrável, segundos atrás, os olhos da moça que se espantam com a descoberta do homem ali instalado. A ação um tanto quanto hesitante de abrir o receptáculo, o homem que, agora liberto, a abraça com candura e amor inconteste, as trevas que se afastam da jovem, agora banhada naquela doce luz.
- Quem é você?- pergunta a jovem-
- Sou teu irmão esquecido, aquele que sempre desejou por este abraço, mas a quem tu não vias, assim como sentes que muitos não te veem, sou Jesus Cristo, o Filho de Deus...