Canção no Bosque

Canção no Bosque

A Lua está a brilhar mais que nos outros dias. À medida que exibe o charme de selene faceira, tendo em volta um cortejo de estrelas radiantes, zomba dos corações solitários que se entregam ao doce clarão de seus raios benéficos. Aqui, neste pedaço de paraíso, a clorofila dá lugar à brancura da neve, tão argêntea é a suavidade do luar que se descortina como um longo e diáfano véu de noiva.

Costumo vir a este santuário da natureza, sempre que sinto necessidade de respirar um pouco de ar puro. Este silêncio me faz reviver momentos agradáveis, inesquecíveis, quando minh’alma, sempre voltada para a simplicidade das coisas, mantém com elas um colóquio de abertura espiritual, cujo alívio me faz levitar e me transportar aos lugares mais longínquos que tendem a se perder no receptor de minha memória.

Em um recanto desses, qualquer ser vivo tem a impressão, a sensibilidade de estar no paraíso. No verde alcatifado de flores, enfileiram-se árvores esbeltas e elegantes, de folhagem delicada e transparente, formando uma divisória entre o céu de um azul profundo e belo, onde passeiam delicados flocos de nuvens muito brancas em formas de animais fofos. Na parte inferior, à margem do riacho, toda a beleza do quadro transmite uma mensagem de paz e multiplicidade de tudo o que existe na natureza.

A exuberância das árvores, este córrego cristalino, a companhia inseparável do meu acordeon, me trazem de volta os sons de uma bela canção que ouvia tocar nos rádios em minha cidade, quando me dirigia à escola, onde cursava as primeiras séries elementares. _ Vamos, amigo, afinar os primeiros acordes e cantarei o que me lembrar:

(acordes) “Brilha no firmamento doce luar/ a brisa vem de leve e passa a cantar/ e um perfume suave vem lá do bosque/ noite assim bonita me faz sonhar...

Vem ver, é a estrada do bosque....”

Essa foi a canção que cantei, em italiano, ao som de um violino, no encerramento do meu Curso Normal. Momento de felicidade, pois tinha os olhos voltados para o futuro, uma jornada a palmilhar à luz do saber. Missão cumprida, estou aqui, décadas depois a reviver um dos momentos mais felizes da minha vida. Esta paisagem me traz o perfume da brisa, a candura do luar, a beleza das plantas e esta estrada que me faz lembrar “A Strada nel Bosco” que apresentei, trajando um lindo vestido longo de cor branca, naquele dia longínquo, em que conduzida pelo braço de meu pai, recebi neu diploma de professora normalista. Não sei quem compôs essa maravilha de música, de uma coisa porém, tenho certeza: possuia grande sensibilidade artística lítero-musical. Aproveitando para uma singela homenagem ao autor e compositor, transcrevo aqui um trecho da bela canção:

_ (acordes, afinando um ré maior) _ Vamos lá amigo! Ajuda-me a segurar esta emoção que invade o meu ser, neste momento em que minh’alma se transporta numa profusão de lembranças e saudade a momentos tão significativos de minha existência:

“Le prime stelle in ciello brillano già/ tra i biancospini il vento mormora e va/ lembro un incanto il bosco sotto la luna/ favole appassionate narra per te....

Vienni, c’e una strada nel bosco/ Il suo nome conosco/ vuoi connoscerlo tu...

Vienni, c’e una strada nel cuore/ dove nasce l’amore...”

Che non muore mai più / Laggiu tra gli alberi/ inderecciato coi rami in fior/

C’è um nido semplice/ como sogna Il tuo cuor/

Vieni c’e una strada nel Bosco/ Il suo nome conosco/

Vuoi conorcerlo tu...”

O acordeon vibra comigo como se houvesse em suas entranhas um sentimento igual ao meu. A suave harmonia que se evola dos acordes sonoros, sempre ao lado da bela melodia, leva minhas saudades, meus pensamentos, minhas noites de insônia, amenizando as agruras da existência nos seus glissandos contínuos.

A lua, cada vez mais radiante, envia a ternura de seu olhar para o meu show solitário, como a dizer: _ Por que sofres o mistério da noite, se estou a te abraçar e te envolver com a suavidade do meu manto, no aconchego do meu silêncio? Também sou solitária e minha estrada é única, sem plantas, perfumes de flores, regatos cristalinos, cantos de passarinhos, nem sons de acordeons. Sinto-me porém, feliz em proporcionar luz e tranquilidade aos que necessitam de um momento de paz.

Diante de tanto carinho e desvelo, abracei-me ao acordeon e saí pela estrada perfumada do bosque, sentindo na alma uma doce paz celestial.

***

Maria de Jesus Araújo Carvalho

Fortaleza, 02/05/2014.

Maria de Jesus
Enviado por Maria de Jesus em 02/05/2014
Reeditado em 02/05/2014
Código do texto: T4791280
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