Projeto Tenora - Batalha na Montanha Jhéglera
Marchávamos há três semanas agora, mal sabíamos aonde íamos, mas promessas de riqueza e fortuna nos faziam prosseguir por um terreno acidentado e montanhoso. Não víamos sinal de civilização, tampouco alguma fazenda para podermos saquear e nos prover de alguma comida. A que trouxemos estava acabando, limitávamos a um pedaço de pão por dia. Por vezes o conde mandara matar um ou outro cavalo para termos o que comer. Lembro-me de certa noite qual rezei para que um deles machucasse a pata e se tornasse inútil. Nós da infantaria sabíamos quanto os cavalos podiam ser terríveis em batalha, porém não podíamos perder homens para fome.
O Conde de Francis prometera riqueza aos homens que o acompanhassem nessa excursão, íamos para o interior do Reino de Jhegla. Esse caminho entre as montanhas era extenso, difícil, mas era desprotegido. Agora sabia o porquê. Aqui era o caminho para o inferno! Nunca me arrependera antes de uma decisão, não tanto quanto seguir esse mentecapto até aqui. Já perdi dois homens de meu batalhão, restando-me apenas 19. Esses me olhavam duramente, percebi que queriam voltar e, se eu não fizesse nada a respeito, ia perder o respeito deles.
O Conde também está encrencado nesse sentido. Um bom homem ele é, já lutei muitas vezes sob seu comando, mas agora lhe lançava o mesmo olhar que meus homens lançavam a mim. Estávamos parados, e todos os comandantes em sua tenda discutindo o rumo desta excursão. A maioria queria voltar, mas já estávamos tão longe que a volta seria mais difícil que a ida. Os loucos do Conde que se chamavam de magos diziam que havia uma cidade pouco mais de um dia de viagem. E nosso caminho ficou claro, apesar de todos os protestos, iríamos seguir os loucos. Por algum motivo o Conde confiava neles, então resolvi também.
Disse a minha tropa que depois de amanhã, se nada víssemos, iríamos embora. Alguns rugiram dizendo para irmos agora e o Conde podia se fuder, mas os mais sensatos os persuadiram, assim ganhei dois dias.
Eu não pude acreditar nos meus olhos quando vi a mais bela fortaleza da minha vida. Ela surgia no alto em meio às montanhas, Com torres que quase chegavam às nuvens. “Certamente nos viram de lá de cima” comentou Sir Caio, um outro comandante de sagacidade tão afiada quanto seu machado. “O Conde quer nos ver?” perguntei já sabendo a resposta. “Claro”. Na tenda de guerra o Conde apresentava um brilho nos olhos. Era uma excelente fortaleza, mas tinha poucos homens para defendê-la, já que se pensava que esse caminho era intransitável para tropas inimigas. O exército deles estava mais ao sul, lutando contra o exército do nosso rei.
Tínhamos pouco mais de 20 cavaleiros, 50 homens a pé e 30 besteiros. Não podíamos ver quantos havia lá dentro, mas estimávamos que fossem 40 besteiros, e não mais de 10 homens, sem contar com a milícia. O maior problema era que queimamos as escadas para aquecermos nas noites gélidas das montanhas. Se desmontássemos as carroças poderíamos fazer alguns aríetes, mas contra os portões grandes e pesados demais para serem movidos por aríetes improvisados. Não queríamos atear fogo, pois pensávamos na pilhagem. Então como entrar lá? Encarei por minutos a fortaleza até que um dos magos disse: “Eu posso derrubar o portão”. Ri levemente daquela presunção e o Conde me reprimiu severamente com seu olhar: “Continue”. Ele apenas insistiu que derrubaria o portão se os besteiros mantivessem os deles escondidos, e precisaria da ajuda de um homem. Acho que de raiva de meu riso ele me escolheu.
O Conde passou minha tropa para o comando de Caio enquanto eu ajudava o velho louco a colher ervas na montanha. Meus soldados me zombaram quando me viram, mas apenas um olhar e se calaram. “O que você pretende fazer? Explodir a porta com uma bola de fogo?” zombei dele. “Algo mais sutil” ele me respondeu como se nem percebesse meu sarcasmo. Apenas suspirei fundo e continuei o serviço.
O conde ordenou o ataque, o mago saiu correndo e as flechas começaram a chover. O velho corre para cacete! Tiver dificuldade em protegê-lo das setas. Sorte os besteiros daqui serem mal treinados, pois, se não, teria morrido. O mago pegou as ervas e começou a esfregá-las nas mãos, meu braço estava cansado de segurar o escudo e meu capacete já fora atingido duas vezes. Da próxima me matam. O sangue escorria pela minha face me cegando de um olho. O louco dançava e cantava alto. Nossos besteiros faziam um ótimo serviço. Eu vou morrer aqui do lado de um caralho de um mago insano! E de repente, sem explicação, o portão abriu. Havia 15 homens bem armados me encarando com as caras mais confusas que vi na minha vida. Mais atrás a milícia começou a gritar falando algo sobre assombrações e demônios. O mago olhou para mim com um brilho triunfal no seu olhar. Que porra aconteceu?! Que me importa? Desembainhei a espada e ouvi os passos pesados dos homens atrás de mim. Loucos por algum ouro. O mago me disse “Vai!” e fui.
Naquela tarde matamos os homens, roubamos sua riqueza e ficamos com suas mulheres. De noite, fartos e satisfeitos fomos dormir, há outras cidades para pilhar.