Os Gigantes do Norte, Cap 03

Aconselho a quem ainda não leu as publicações anteriores que leiam para ter o completo entendimento da história.

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A cela de troncos de madeira na qual os viajantes foram capturados era espantosamente grande, mas a atual prisão era ainda maior. Parecia o salão principal de um castelo qualquer. E diferente do tal, não possuía cobertura. Quem estivesse ali, ficaria contemplando as estrelas a cintilar no escuro da noite. E essa era a parte mais harmoniosa que o lugar poderia oferecer.

Quando o capitão ergueu o olhar após a queda para dentro da prisão, ele avistou homens ou talvez quase homens. Eram mínimos detalhes aqueles que os separavam de partilhar da mesma raça. Os seres em questão possuíam a estrutura em comum, mas suas particularidades chamavam toda a atenção. Eram visivelmente mais avantajados em comparação ao homem mais musculoso do Leste. Maior que qualquer carrasco. Tendo em mente que eles tinham de ser robustos e corpulentos, para poder carregar e içar armas pesadas e expor o medo ao condenado e a qualquer um que pretendesse efetuar um crime contra a Coroa.

Porventura, o que mais atraía olhares curiosos, era a grossa pelugem que se espalhava pelo corpo. Seus troncos e braços eram todos cobertos de pelos. Como se fossem os homens mais primitivos já vistos. O capitão pensara se eles não poderiam ser a imagem do passado. De ancestrais que habitavam Caldenhart, antes mesmo que o próprio tivesse este nome.

A estatura também era algo que fugia do comum. Aquilo que era raro no Leste, entre eles, era compartilhado por todos. Não se via nenhum abaixo de dois metros. Mas também, não ultrapassavam muito disso. Em outros tempos, aqueles seres teriam amedrontado o capitão, mas agora ele conhecia uma criatura ainda mais monstruosa. O gigante de pedra.

“Será que falam a língua dos homens?”, pensou o capitão. “Talvez tenham o seu próprio idioma.”

A dúvida se instalava no cárcere. O capitão não sabia se aqueles “quase” homens eram hostis ou não. A aparência condenava que sim, mas não poderia considerar isso como a resposta correta. Ele conhecera homens que asseguravam o semblante da cortesia, mas bastasse uma espada na mão para se transmutarem em verdadeiros selvagens sedentos por sangue.

O capitão marchou placidamente em direção aos estranhos, sem antes deixar de ordenar aos seus vassalos que permanecessem na mesma posição com a atenção redobrada. Eles se equipavam com espadas para qualquer situação eventual que se despontasse.

O grupo extravagante se constituía em sete indivíduos. Quando um deles volveu o olhar ao capitão, fez com que o mesmo, subitamente, cessasse seus passos. O jeito de como aquele ser o fitava, fazia com que a sua respiração acelerasse. Mas ele empunhava a vantagem com uma espada em sua cintura. Isso o fez retomar o passo, desta vez, com a mão na ponta arredondada do cabo da arma.

- Vim para me apresentar. Sir Ugner. – apresentou-se o capitão com a palma da mão esquerda estendida, enquanto a outra permanecia no cabo da espada.

Aquele com quem falava não demonstrou reação. Poderia ser bom ou ruim. Não se sabia ao certo. Era um primitivo, não devia conhecer o aperto de mão, tampouco a linguagem do Leste. Assim, o sir recolheu a mão sem alcançar pleno entendimento do ocorrido. Porém, notou que “perigo” não era a palavra certa para classificar a atmosfera do local.

Repentinamente, o primitivo indivíduo virou-se para o seu grupo e pronunciou um idioma invulgar nunca antes ouvido. Mas o que ele dizia? Estava proferindo palavras ofensivas? Invocava o bando para uma investida? Só restava ao capitão a intensa espera.

Depois que o ser peludo articulou seus últimos dizeres, Sir Ugner deu um passo atrás por mera precaução.

- Tudo bem, senhor? – perguntou um dos homens.

Com um gesto, o capitão pediu para que esperassem calados. Estava apreensivo, mas não queria alarmar os desconhecidos. E então, o homem de dois metros se levantou. Caminhou a passos curtos. Fez menção em tocar no sir, fazendo-o dar outro passo atrás, mas agora, com a mão mais firme no cabo de sua espada. E o inesperado aconteceu. Não era uma ofensiva. Nem perto de ser um ataque. Era uma saudação. O grande tomou a mão do capitão e abaixou a cabeça saudando-o. “Está me reverenciando?”, pensou o sir.

Os vassalos abonançaram. Não seria preciso um conflito ali dentro. O estranho se mostrara amigável. Em seguida, o mesmo puxou o capitão para perto do grupo. Acomodou-o por entre o feno que se espalhava de forma arredondada pelo chão, onde os estranhos se aconchegavam. Posteriormente, quando tudo parecia de fato estar sossegado, Sir Ugner convocou seus homens para que sentassem também. E ali, naquela prisão, a tarde insensata se confirmava. Nem o homem mais embriagado de vinho poderia inventar um dia como aquele. Um gigante de pedra e um grupo de estranhos primitivos, amigáveis e convidativos, com homens que jamais viram.

O aglomerado tentava se entender. De um lado, seres peludos que ditavam palavras mais que selvagens e do outro, homens que pertenciam a uma corte e a uma linguagem por tempos estruturada.

Sir Ugner não sabia se aqueles homens conheciam uma arma, se já forjaram espadas ou algo parecido. Para tirar essa dúvida, subitamente desembainhou a espada apontando-a para o céu, mostrando a todos o gume metálico que ela possuía. Percebeu que não houve espanto da parte deles. Talvez não tivessem medo dela. Logo, entregou-a ao mesmo que antes o reverenciou. Ele a examinou deslizando o dedão, debaixo para cima, no corte da arma. O sangue logo escorreu. Não demonstrou dor. O rosto era sereno. Apenas contemplava a obra forjada. Parecia conhecer um objeto como aquele. Depois o devolveu com uma simples expressão: “khi Tuk”. Assim foi entendido.

- O que quer dizer “Khi Tuk”? – perguntou um vassalo ao outro, que somente acenou com a cabeça mostrando desconhecer o significado.

Conforme mais eles tentavam se comunicar, mais eles se aproximavam. E era importante, pois o capitão pensava em fugir daquele lugar. Poderia juntar forças. Queria voltar ao navio. Para os homens que na praia ficaram. “Uma hora eles irão nos procurar”, pensou. Mas sua reflexão foi interrompida pelo forte tremor no chão e o som retumbante. Assemelhava-se a passos. Passos pesados, de muitas toneladas. Era o gigante caminhando ao encontro deles, mas daquela vez não se parecia com apenas um.

Continua...

RENAN MOTTA
Enviado por RENAN MOTTA em 06/11/2013
Reeditado em 28/04/2014
Código do texto: T4559543
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