Os verdadeiros vândalos

 
                  
 

                         Alarico começou a se preocupar com essa história de vândalos quebrando tudo na Cinelândia, no Rio de Janeiro. A última notícia que teve foi de que o povo carioca reprovava quase cem por cento estas depredações do patrimônio público e particular.
                        Alarico morava com sua pequena família na rua Senador Dantas, uma rua que fica atrás da Cinelândia.  Sua mulher, Humerica, também começava a assustar-se.  Frederico e Genserico eram os filhos, um com 10 anos e o outro com 12.
                        Eram todos alemães, vindos da região do Danúbio. Alarico era um modesto ourives e os vizinhos sabiam da origem alemã. Só não sabiam que eram descendentes dos verdadeiros vândalos.  Foi justamente um Alarico que cercou a poderosa Roma, no ano 470 D.C. Roma ficou sitiada por muito tempo. E Alarico comandava todo dia uma depredação geral nos arredores de Roma.  Nunca invadiu a cidade. Gostava mesmo era de depredar.
                        O medo do nosso ourives Alarico era um dia a multidão, irritada, acabar por atacar a sua família, por uma questão de analogia.  Família puro sangue de vândalos verdadeiros. A sua linhagem era bem clara. Descendia do Alarico II, filho do Eurico. Era bisneto de Genserico, irmão de Teodorico e de Odorico. Deste, a história não tomou conhecimento. Só a rede Globo, não se sabe como, é que colocou em evidência o Odorico. Mas era um Odorico tupiniquim. Com o sobrenome Paraguassu não poderia ser outra coisa.
                        O fato é que o nosso Alarico, o da rua Senador Dantas, sabia que uma profecia de sua terra dizia que o Alarico que fosse para o Brasil seria morto depois de um quebra-quebra geral em uma cidade famosa do sudeste brasileiro. Uma cidade afeita, em certos momentos de sua história, a badernas, a molecagens, dizia o impiedoso profeta.  E seria morto por um parente próximo.
                        De fato, os jornais do Rio, um belo dia,  noticiaram a morte de um certo Alarico, que trabalhava como ourives na rua do Passeio.
                        Foi encontrado morto com o corpo incendiado. 
                        Ao seu lado, o delegado Talarico  encontrou o objeto que o matou. Não se sabe ainda quem o matou. A única certeza, por ironia ou gozação da vida,  é que foi morto por um  maçarico!
                         Nem sempre o profeta acerta sua previsão  na íntegra...   No entanto, convenhamos,  o maçarico era bem familiar ao morto.


Nota:  No texto 700 havia me despedido dos amigos neste fim de ano.  No entanto, esqueci-me de publicar este texto-gozação, aproveitando o momento em que vivemos, com as badernas de ruas dos chamados vândalos. Mesmo sem tempo,  é difícil abandonar o Recanto das Letras.