O menino e o grifo - Parte 1.
A luz da manhã entrava cálida pelas frestas na rocha amarela, o menino tinha subido até ali para observar o deserto pela manhã; ele gostava de ver o sol inclemente surgir escarlate pela borda das terras áridas que cercavam o seu cárcere, subir até o topo e observar a imensidão dava uma sensação de liberdade.
O garoto estava preso naquele palácio desde que nasceu. Não odiava o lugar, o palácio era enorme construído em uma formação rochosa, sendo que parte do complexo eram cavernas naturais dentro das montanhas ou escavadas nessas; assim como a torre natural onde o menino se encontrava. Mas mesmo vivendo neste palácio, com serviçais que cumpriam todas as necessidades de sua família, eles ainda eram reféns, sem liberdade, prisioneiros.
Seus pensamentos voavam enquanto ele subia pela caverna poeirenta, com o sol entrando por frestas naturais e pelas feitas por mãos humanas. Tecnicamente falando era proibido para o jovem subir até o topo, mas ninguém nunca ficava vigiando, então não fazia diferença. Ele foi chegando ao topo da torre; distraído em seus pensamentos demorou alguns momentos para perceber que havia algo errado.
Seus pés chutaram algumas pedras e a luz do sol bateu direto em sua face, o menino protegeu o rosto com a mão direita, não deveria haver tanta luz ali em cima, as janelas eram muito estreitas, e nem tantos pedregulhos no chão. Antes do garoto poder se mexer uma silueta cortou a luz forte, algo grande, forte. Grandes asas se abriram em fúria, poeira e pedras se levantaram do chão, um grito estridente percorreu o interior da montanha enquanto o menino, paralisado, morria de medo.
Então a silueta despencou, o garoto ouviu o som de algo pesado caindo no chão. Ele ficou parado alguns segundos, as pernas tremendo, suor frio descendo pela face, um pio baixinho veio do chão, isso pegou o garoto de surpresa, ele se mexeu, tirando a luz dos olhos. No chão a sua frente havia uma criatura grande; asas poderosas da cor das areias do deserto; pelagem dourada, metálica, sobre o corpo felino. As patas se mexeram com desconforto, revelando garras brancas e afiadas, a criatura mexeu a cabeça, olhando para o garoto; sua cabeça era de um pássaro, uma ave de rapina, como um gavião ou uma águia, seu bico era de um amarelo profundo, os olhos eram estranhos, ele tinha uma íris dourada, mas a parte que deveria ser branca era negra como ébano. Era um grifo.
O menino nunca tinha visto um de perto, sempre houve vários grifos em volta do palácio, pelo menos umas três vezes por mês um bando deles atacava o lugar e era repelido pelos carcereiros; seu professor tinha lhe explicado que isso acontecia por que o palácio tinha sido construído dentro do território dos grifos, e estes são territorialistas; sua mãe sempre reclamava dos ataques, ela dizia que o tio do garoto os tinha mandado para lá por que os grifos eram mais um obstáculo; ninguém poderia tentar passar pelas criaturas sem vários guerreiros, então uma fuga era improvável.
O grifo piou irritado, acordando o garoto de sua contemplação, ele olhou em volta, e um pensamento lhe veio, “e se alguém tiver ouvido?” com certeza alguém deveria ter ouvido, a torre era alta, mas a besta tinha pulmões muito fortes, os ouvidos do menino ainda não tinham se recuperado do primeiro guincho. Ele olhou nervoso para a passagem de onde veio, não ouviu nada, mas os guardas poderiam estar subindo com cuidado, talvez até soubessem que o grifo estava ali, se o garoto fosse encontrado seria punido. Ele olhou para a saída, com muito cuidado foi se aproximando, não ouviu nada vindo de baixo, então começou a descer, tinha que ir embora antes que alguém o descobrisse, mas então outro pio o deteve. O grifo o olhava, parecia perguntar se o menino o ia deixar ali, largado. “Droga” praguejou o garoto e desceu correndo. Ele chegou ao pé da torre em tempo recorde (realmente não havia ninguém subindo) e se aproximou com muito cuidado da porta, abriu uma fresta mínima. Dois guardas passavam pela frente da pesada porta, seus rifles iam á posição de descanso.
-Acho que a gente deveria subir lá, tenho certeza que ouvi.
-Afe!! Você ta ouvindo coisas! Você acha que um desses bichos ia conseguir entrar aqui??
-Eu não estou ouvindo coisas, tenho certeza!
Os dois pararam na frente da porta, o garoto segurou a respiração e ficou imóvel, tentando apagar a sua presença o máximo possível.
-Pode estar lá em cima! O Fasir me disse que viu uma dessas coisas batendo na montanha enquanto a gente atirava neles ontem!!
-Olha garoto você é novo aqui, só ta impressionado, e eu não vou subir lá em cima, nessa porcaria de torre só pra você ficar tranquilo...
-Mas...
-Mais nada!! Para de torrar meu saco!
Os dois foram se afastando, o guarda mais novo parecia contrariado, mas seguiu o companheiro, o garoto respirou aliviado e fechou a porta. A torre era alta o bastante, e as pedras grossas o bastante para abafar os ruídos da besta. No dia anterior um bando de grifos tinha avançado contra o castelo, vários foram abatidos, mas em todos esses anos ele nunca tinha ouvido falar de um caindo vivo dentro do palácio.
O menino subiu até o topo de novo, o grifo ainda estava lá, na mesma posição que ele tinha deixado, ele foi se aproximando com cuidado, pé ante pé, da criatura. O grifo o olhava com cuidado, sua calda de leão começou a chicotear o chão, como a de um gato. O rosto da criatura não tinha expressão, como a de um pássaro, mas ia ficando mais inquieto á medida que o garoto se aproximava, ele foi tentando chegar perto até que o grifo abriu seu bico dourado e soltou um bufo, como o de um gato. O menino olhou para os olhos da criatura, as pupilas estavam dilatadas, e o grifo respirava rápido, ele estava com medo. Ele recuou alguns paços, até perceber que a fera se acalmava um pouco; então o garoto entendeu que não podia se aproximar mais de dois metros. Ele rodeou o grifo, mantendo a distancia permitida pela criatura; foi olhando a atentamente, o garoto conseguiu identificar algumas escoriações na fera, mas nada que explicasse o porquê dela estar deste jeito. Então o menino começou a observar a caverna com cuidado, aqui e ali podia ver marcas de sangue nas paredes, as pedras estavam largadas em várias direções, como se tivessem sido jogadas através do lugar.
O garoto sentou num canto, ele achava que o grifo tinha ficado a noite inteira se batendo nas paredes, pelas marcas no portal de saída a fera tinha tentado passar por ali, mas não tinha conseguido, era muito grande. O jovem não entendia por que ele (supondo que era “ele” não “ela”) não tinha saído pelo mesmo lugar que tinha entrando, o buraco que o grifo tinha aberto ao colidir com a montanha era grande o bastante para o grifo passar, mas a fera não tinha saído, será que havia algo o impedindo?
O menino se levantou e foi até o rombo, o grifo tinha colidido com a parte da montanha que dava para o deserto, não com a face que dava para o pátio do palácio, provavelmente ninguém do palácio tinha visto a nova falha na montanha, e nenhum viajante notaria também; mas tirando isso não havia nada de estranho, nada que impedisse o grifo de voar por ali.
“Por que você não vai embora?”
O sol começou a mudar de posição e o garoto notou como estava tarde, ele tinha que ir antes que alguém notasse sua ausência. Quando o menino sentiu o grifo o olhando quando chegou ao portal que levava a escada, ele se virou e sentiu o medo e tristeza da criatura, então ficou com pena da fera. O garoto encarou o grifo nos olhos.
- Eu vou voltar.
O menino e o grifo
Parte 1.
A luz da manhã entrava cálida pelas frestas na rocha amarela, o menino tinha subido até ali para observar o deserto pela manhã; ele gostava de ver o sol inclemente surgir escarlate pela borda das terras áridas que cercavam o seu cárcere, subir até o topo e observar a imensidão dava uma sensação de liberdade.
O garoto estava preso naquele palácio desde que nasceu. Não odiava o lugar, o palácio era enorme construído em uma formação rochosa, sendo que parte do complexo eram cavernas naturais dentro das montanhas ou escavadas nessas; assim como a torre natural onde o menino se encontrava. Mas mesmo vivendo neste palácio, com serviçais que cumpriam todas as necessidades de sua família, eles ainda eram reféns, sem liberdade, prisioneiros.
Seus pensamentos voavam enquanto ele subia pela caverna poeirenta, com o sol entrando por frestas naturais e pelas feitas por mãos humanas. Tecnicamente falando era proibido para o jovem subir até o topo, mas ninguém nunca ficava vigiando, então não fazia diferença. Ele foi chegando ao topo da torre; distraído em seus pensamentos demorou alguns momentos para perceber que havia algo errado.
Seus pés chutaram algumas pedras e a luz do sol bateu direto em sua face, o menino protegeu o rosto com a mão direita, não deveria haver tanta luz ali em cima, as janelas eram muito estreitas, e nem tantos pedregulhos no chão. Antes do garoto poder se mexer uma silueta cortou a luz forte, algo grande, forte. Grandes asas se abriram em fúria, poeira e pedras se levantaram do chão, um grito estridente percorreu o interior da montanha enquanto o menino, paralisado, morria de medo.
Então a silueta despencou, o garoto ouviu o som de algo pesado caindo no chão. Ele ficou parado alguns segundos, as pernas tremendo, suor frio descendo pela face, um pio baixinho veio do chão, isso pegou o garoto de surpresa, ele se mexeu, tirando a luz dos olhos. No chão a sua frente havia uma criatura grande; asas poderosas da cor das areias do deserto; pelagem dourada, metálica, sobre o corpo felino. As patas se mexeram com desconforto, revelando garras brancas e afiadas, a criatura mexeu a cabeça, olhando para o garoto; sua cabeça era de um pássaro, uma ave de rapina, como um gavião ou uma águia, seu bico era de um amarelo profundo, os olhos eram estranhos, ele tinha uma íris dourada, mas a parte que deveria ser branca era negra como ébano. Era um grifo.
O menino nunca tinha visto um de perto, sempre houve vários grifos em volta do palácio, pelo menos umas três vezes por mês um bando deles atacava o lugar e era repelido pelos carcereiros; seu professor tinha lhe explicado que isso acontecia por que o palácio tinha sido construído dentro do território dos grifos, e estes são territorialistas; sua mãe sempre reclamava dos ataques, ela dizia que o tio do garoto os tinha mandado para lá por que os grifos eram mais um obstáculo; ninguém poderia tentar passar pelas criaturas sem vários guerreiros, então uma fuga era improvável.
O grifo piou irritado, acordando o garoto de sua contemplação, ele olhou em volta, e um pensamento lhe veio, “e se alguém tiver ouvido?” com certeza alguém deveria ter ouvido, a torre era alta, mas a besta tinha pulmões muito fortes, os ouvidos do menino ainda não tinham se recuperado do primeiro guincho. Ele olhou nervoso para a passagem de onde veio, não ouviu nada, mas os guardas poderiam estar subindo com cuidado, talvez até soubessem que o grifo estava ali, se o garoto fosse encontrado seria punido. Ele olhou para a saída, com muito cuidado foi se aproximando, não ouviu nada vindo de baixo, então começou a descer, tinha que ir embora antes que alguém o descobrisse, mas então outro pio o deteve. O grifo o olhava, parecia perguntar se o menino o ia deixar ali, largado. “Droga” praguejou o garoto e desceu correndo. Ele chegou ao pé da torre em tempo recorde (realmente não havia ninguém subindo) e se aproximou com muito cuidado da porta, abriu uma fresta mínima. Dois guardas passavam pela frente da pesada porta, seus rifles iam á posição de descanso.
-Acho que a gente deveria subir lá, tenho certeza que ouvi.
-Afe!! Você ta ouvindo coisas! Você acha que um desses bichos ia conseguir entrar aqui??
-Eu não estou ouvindo coisas, tenho certeza!
Os dois pararam na frente da porta, o garoto segurou a respiração e ficou imóvel, tentando apagar a sua presença o máximo possível.
-Pode estar lá em cima! O Fasir me disse que viu uma dessas coisas batendo na montanha enquanto a gente atirava neles ontem!!
-Olha garoto você é novo aqui, só ta impressionado, e eu não vou subir lá em cima, nessa porcaria de torre só pra você ficar tranquilo...
-Mas...
-Mais nada!! Para de torrar meu saco!
Os dois foram se afastando, o guarda mais novo parecia contrariado, mas seguiu o companheiro, o garoto respirou aliviado e fechou a porta. A torre era alta o bastante, e as pedras grossas o bastante para abafar os ruídos da besta. No dia anterior um bando de grifos tinha avançado contra o castelo, vários foram abatidos, mas em todos esses anos ele nunca tinha ouvido falar de um caindo vivo dentro do palácio.
O menino subiu até o topo de novo, o grifo ainda estava lá, na mesma posição que ele tinha deixado, ele foi se aproximando com cuidado, pé ante pé, da criatura. O grifo o olhava com cuidado, sua calda de leão começou a chicotear o chão, como a de um gato. O rosto da criatura não tinha expressão, como a de um pássaro, mas ia ficando mais inquieto á medida que o garoto se aproximava, ele foi tentando chegar perto até que o grifo abriu seu bico dourado e soltou um bufo, como o de um gato. O menino olhou para os olhos da criatura, as pupilas estavam dilatadas, e o grifo respirava rápido, ele estava com medo. Ele recuou alguns paços, até perceber que a fera se acalmava um pouco; então o garoto entendeu que não podia se aproximar mais de dois metros. Ele rodeou o grifo, mantendo a distancia permitida pela criatura; foi olhando a atentamente, o garoto conseguiu identificar algumas escoriações na fera, mas nada que explicasse o porquê dela estar deste jeito. Então o menino começou a observar a caverna com cuidado, aqui e ali podia ver marcas de sangue nas paredes, as pedras estavam largadas em várias direções, como se tivessem sido jogadas através do lugar.
O garoto sentou num canto, ele achava que o grifo tinha ficado a noite inteira se batendo nas paredes, pelas marcas no portal de saída a fera tinha tentado passar por ali, mas não tinha conseguido, era muito grande. O jovem não entendia por que ele (supondo que era “ele” não “ela”) não tinha saído pelo mesmo lugar que tinha entrando, o buraco que o grifo tinha aberto ao colidir com a montanha era grande o bastante para o grifo passar, mas a fera não tinha saído, será que havia algo o impedindo?
O menino se levantou e foi até o rombo, o grifo tinha colidido com a parte da montanha que dava para o deserto, não com a face que dava para o pátio do palácio, provavelmente ninguém do palácio tinha visto a nova falha na montanha, e nenhum viajante notaria também; mas tirando isso não havia nada de estranho, nada que impedisse o grifo de voar por ali.
“Por que você não vai embora?”
O sol começou a mudar de posição e o garoto notou como estava tarde, ele tinha que ir antes que alguém notasse sua ausência. Quando o menino sentiu o grifo o olhando quando chegou ao portal que levava a escada, ele se virou e sentiu o medo e tristeza da criatura, então ficou com pena da fera. O garoto encarou o grifo nos olhos.
- Eu vou voltar.