As máximas do papai



 
                        Suspirou aliviado, ao ler no jornal que o Papa Francisco, nosso Hermano, achava o mundo louco.
                        O Gustavo sempre suspeitou disso. E era por isso que nunca aderira a nenhum movimento dos humanos.  Via  repetidas vezes que o final de tudo era inevitavelmente ruim, inclusive as vidas das pessoas, o final jamais acaba bem. 
                        Guiou-se, na vida, por três ou quatro máximas ensinadas por seu pai. Aliás, diante das trevas e da infinita ignorância humana, o Gustavo preferia falar em mínimas.
                        Reconhecia o acerto dos conselhos do velho pai.
                        Recorda-se, ainda hoje, quando partia para o colégio interno, com a idade de 10 anos. Esperava o trem na Central do Brasil, no Rio, com destino a Caxambu. Eram quatro da manhã (naquele tempo viajava-se o dia inteiro e ele só chegaria às sete da noite). Quando ia entrando no vagão, o pai chamou-o num canto e numa frase curta, mas incisiva, ensinou-lhe a primeira máxima (ou mínima como queira o leitor). – “Filho, lá no colégio não deixe ninguém passar a mão na sua bunda”. O nosso amigo Gustavo não teve tempo de dizer ao pai que ficasse tranquilo, pois mesmo com apenas 10 anos, ele se interessava muito pelas menininhas do colégio.
                        Oito meses depois, um incidente no internato.  Um rapazola de 14 anos passa rápido pelo Gustavo, com a cara de pimentão. Final do drama:  um outro rapaz havia passado a mão na bunda do cara de pimentão.  O que passou a mão foi expulso do colégio no dia seguinte. A preocupação do pai do Gustavo tinha inteira  procedência. O velho não errava uma!
                        No casamento do Gustavo, outra máxima:  - “filho, você se casa hoje, mas aceite meu conselho.  Procure não levar nenhum amigo  para seu  lar”. Um caso típico de se evitar circunstâncias favoráveis a uma possível traição. Neste dia, o pai recusou-se a ensinar a máxima do seu avô: a do marido não voltar cedo para casa, para não acostumar mal a mulher, mesmo que tivesse que ficar sentado no meio- fio da calçada. Achava infantil essa atitude.
                        O meu leitor, a minha leitora, talvez não aprovem essas máximas e prefiram ver o mundo de modo ideal. Mas não há como negar o lado prático dessas máximas,  ou mínimas.
                        Imaginem a cena, meus amigos!  O Gustavo entrando na casa de seu vizinho  Lúcio. O que ele vê?    Cantores de ópera, oito homens e quatro mulheres. Numa roda, na grande sala da casa, cada um deles mostrando suas qualidades vocais. Tinha de tudo: contraltos, sopranos, tenores. Aliás,  tinha de tudo mesmo, como verão os amigos. Alguns faziam solos lindos, vozes maviosas.  O Lúcio, dono da casa, e sua mulher estavam extasiados. E o Gustavo admiradíssimo.  O Lúcio explicou  que encontrou esses cantores num bar da esquina e resolveu levá-los para a casa.
                        Um mês depois,  o nosso galhardo Gustavo retorna à casa do vizinho, com a esperança de encontrar os cantores. Havia gostado do espetáculo.   A casa vazia,  e o Lúcio, lamentando-se:  – “Pois é, amigo, um dos cantores fugiu com minha mulher e eu nem notei o flerte dos dois” .
                        Tinha muito ainda que falar das máximas do velho pai do Gustavo. Gostava de ensinar com frases curtas, mas de grande efeito, sem muita explicação, que só atrapalhava.  Era como um soco na boca do estômago. Eram máximas já depuradas pela experiência.  Mas encerrarei com a terceira, bem aproveitada pelo próprio Gustavo, desta vez, ele próprio o personagem principal.  É que fiquei sabendo que há um tempo máximo, ou mínimo, para que o conto mantenha a sua tensão e o leitor não se canse.
                        Essa última máxima, o filho nunca se esqueceu, já que seu pai repetia a vida toda como se comportar diante da traição do marido e  a  descoberta  pela  esposa. Dizia o sábio pai: - “Meu filho, negue sempre! Mesmo em flagrante, negue sempre. Você terá o benefício da dúvida”.  Não deu outra.  Caindo na velha fraqueza humana, o Gustavo traiu a esposa e foi descoberto.  Negando sempre, acabou por convencer a esposa de que nada havia acontecido.
                        Para dizer a verdade, houve apenas um pequeno efeito colateral.  O Gustavo, muito religioso, teve que pedir perdão à santa de sua devoção, e implorando para não ser descoberto, exagerou na penitência.  Até hoje, todo mês, passados 25 anos,  sobe os 365 degraus  da Igreja da Penha.  De joelhos...