Sangue de Dragão - Cap. 03 - Conhecendo a Ordem da Magia

O dia seguinte foi de descanso para Orogi. A experiência pela qual passara tinha retirado suas forças físicas e psíquicas. Seu corpo estava dolorido e sentia uma dor de cabeça que teimava em não lhe abandonar, alem de uma queimação irritante na nuca. O intenso sonho que teve vinha a sua mente consciente através de imagens rápidas e sem sentido, fazendo com que ele não se lembrasse dos detalhes. Mesmo assim o mestre Farmenis não permitiu que ficasse somente na cama a se medicar, aproveitou a oportunidade para oferecer um enriquecedor passeio pelas dependências da Ordem da Magia. Oportunidade que Orogi aproveitou com bastante interesse.

Não só de magos vive a Ordem, na verdade os magos correspondem a cerca de quarenta por cento dos que circulam dentro de sua estrutura. Para que ela se mantenha funcionando é necessário que um verdadeiro mini exército de pessoas trabalhem em suas dependências. São cozinheiros, encarregados pela limpeza, arquivistas dedicados a administração das três bibliotecas existentes, artesãos, pintores, ferreiros, ourives, entre outras funções praticadas por diversas pessoas. A ordem também conta com um pequeno serviço de vigilância exercido por soldados treinados cedidos pela guarda do Rei. As várias seções de trabalho são divididas pelos anéis das cinco torres do complexo, sendo que algumas atividades ocupam mais de um anel, como a biblioteca por exemplo.

A chamada biblioteca central é o maior patrimônio da Ordem, como de qualquer outra instituição que lide com as artes arcanas, pois a maior parte do conhecimento mágico está contida em antigos livros e pergaminhos, alguns deles com mais de quinhentos anos. Eles são uma fonte inestimável de informação arcana passada de geração a geração desde os primeiros magos de que se tem notícia. Não são a toa que as três bibliotecas da Ordem da Magia são as áreas mais bem protegidas de sua estrutura. Orogi viu muitos guardas naquela área e teve curiosidade de ler alguns livros, mas não foi permitido pelo mestre Farmenis. Apenas os Magos têm acesso ao seu interior.

Por volta do meio dia aluno e mestre pararam para almoçar no refeitório. A estrutura deste local era um pouco mais modesta, contendo várias e grandes mesas retangulares com dez cadeiras. Orogi percebeu que a hierarquia era levada a risca na Ordem, pois até na hora de comer os aprendizes e professores utilizavam-se de áreas diferentes. Obviamente ele se separou do mestre Farmenis e foi almoçar junto dos alunos. Pegou sua bandeja e saiu à procura de um lugar pra sentar, tarefa que demorou um pouco, pois o refeitório já estava cheio e muitos garotos e garotas, vestindo mantos verde-escuros com detalhes pretos, se apressavam para pegar os lugares ainda vazios. Depois de uns dois minutos rodando, Orogi se sentou timidamente ao lado de um grupo de pessoas que devoravam seu almoço e conversavam sobre feitiços, pergaminhos e, em voz baixa acompanhada de risinhos, também falavam mal de alguns professores.

Orogi saboreava devagar seu almoço a base de verduras, frutas, uma pasta estranha feita a partir de uma raiz, mas muito saborosa, e um pedaço de peixe assado em brasa. A conversa dos garotos ao seu lado não parava, e quando já achava que ia ser ignorado durante toda a refeição, uma garota, aparentando ter não mais de treze anos, com cabelos castanhos claros, pele clara e olhos cor de mel, lhe chamou a atenção.

---- Eu nunca te vi aqui no refeitório. É novato? Se for já deve saber que as aulas começaram há duas semanas não é?

---- Eu não freqüento as aulas. Não sou aprendiz de mago --- respondeu Orogi.

---- ah, certo --- falou a garotinha ---- Então o que faz aqui? Por que se não sabe, funcionários são proibidos de almoçarem junto dos aprendizes e professores.

---- Pois é moleque, se for faxineiro, pedreiro, ou se trabalha na cozinha seu lugar não é aqui, portanto aconselho que se retire --- falou um garoto de cabelos pretos raspados e olhos castanhos. A rispidez em sua voz deixou Orogi um pouco nervoso.

---- N..não, também não sou funcionário. Só estou acompanhando meu mestre. Eu sou de Ardas.

---- Conheço Ardas --- disse um outro garoto --- pra quem quer ter seu dinheiro roubado não existe lugar melhor --- Ao dizer isso todos riram do seu comentário.

---- Quem é esse seu mestre? E porque ele te trouxe de uma cidade tão distante como Ardas? --- perguntou a garotinha de cabelos castanhos.

---- Mestre Farmenis é o nome dele. Ele me trouxe para fazer parte da Ordem da Magia --- respondeu Orogi.

---- Fazer parte? Como assim se você mesmo disse que não é aprendiz de mago.

---- Eu também não entendi --- Orogi se sentia cada vez mais envergonhado, apesar da falta de atenção que as demais pessoas da mesa lhe davam ---- Eu passei por um ritual mágico e o meu mestre disse que depois disso eu serviria à Ordem.

---- Ritual? Eu nunca soube da necessidade de um ritual para ingressar na Ordem da Magia. Que ritual é esse?

---- O mestre Farmenis diz que se chama Ritual de Indução...ou Junção eu acho

---- E para que serve esse tal ritual? Ele te disse? --- a garota parecia bem mais interessada agora na conversa.

---- Meu mestre disse que era necessário para me tornar um Sangue de Dragão.

As gargalhadas cessaram. O som dos talheres batendo na bandeja de metal também cessou. A conversa teve fim. Um silêncio repentino tomou conta da mesa onde Orogi estava depois do que disse. Olhos arregalados o encaravam. A garota com quem conversava afastou a cadeira e parecia assustada. A tensão no ar ficou tão inconfortável que Orogi não conseguiu resistir em saber o porquê.

---- Desculpe, algum problema?

---- Sim, tem um problema. E o problema é você --- respondeu o garoto de cabelos raspados, que parecia ser o mais velho do grupo ---- Já terminei de almoçar, preciso retornar para minha aula --- ao dizer isso se levantou d a mesa, sendo acompanhado pelos demais. Apenas a garota ao lado de Orogi não tinha se mexido ---- Você não vem Sarina?

---- Hã...ah, sim Azura, estou indo --- Sarina não parava de olhar para Orogi, numa mistura de curiosidade e receio. Quando se levantou foi segura de leve pelo braço.

---- Espere! O que está acontecendo? Fiz alguma coisa errada? --- Orogi estava se sentindo bastante constrangido e envergonhado pela aquela situação. A coisa se agravou quando foi atingido no rosto por um pedaço de peixe.

---- Afaste-se dela sua aberração! --- ameaçou Azura ---- Coordenador! Temos um problema aqui --- gritou.

---- O que foi desta vez Azura? --- perguntou um homem alto, careca e de barbas longas e pretas, que circulava por entre as mesas fiscalizando os aprendizes.

---- Sangue de Dragão senhor. Temos um sangue de dragão aqui --- Azura apontava o dedo indicador na direção de Orogi, que ainda limpava o rosto sujo de peixe. A simples menção do nome sangue de dragão despertou o interesse dos muitos alunos que estavam ali. Alguns começaram a andar em direção da mesa onde Orogi estava. Em poucos segundos estava cercado por vários alunos e alunas que demonstravam diferentes tipos de reação, indo da indiferença, passando pelo exame curioso até a agressividade verbal. Entre eles Orogi viu Sarina, que se encontrava em pé no meio do aglomerado de pessoas. Seu olhar tinha mudado, demonstrando tristeza.

---- Muito bem pessoal, acabou a festa. Voltem aos seus lugares --- ordenou o coordenador.

---- Mas isso é inadmissível coordenador! Quem permitiu a entrada desta coisa no refeitório? Quem é o responsável? --- indagava Azura.

---- Eu determinei sua entrada. Alguma objeção aprendiz? --- questionou Farmenis, que se aproximava da aglomeração. Ele encarou Azura com um poderoso olhar que fez o garoto baixar a cabeça. Orogi ficou feliz em vê-lo.

---- Não, professor, nenhuma objeção.

---- Me perdoe pela confusão Carmus. Vou levar o garoto pra fora daqui --- se desculpou Farmenis ao coordenador

---- Sábia decisão Farmenis --- Carmus dava um leve sorriso ---- Depois conversaremos sobre esse assunto.

O mestre Farmenis pegou Orogi pelo braço e saiu arrastando-o pelo refeitório em direção à saída enquanto esbravejava em voz baixa.

---- Eu devia saber que isso poderia acontecer. Você não sabe manter a boca fechada.

---- Desculpe mestre, não sabia que era pra manter segr...

---- Silêncio! --- ordenou Farmenis ---- Aqueles garotos não têm culpa de agirem daquela forma. Eles agiram de acordo com o que sabem a respeito de pessoas como você. E estão corretos, não os culpo pelo seu medo.

---- Mas mestre, porque teriam medo de mim? --- falou Orogi, desafiando a ordem para ficar calado ---- E porque me chamaram de aberração?

---- Como já disse, não os culpo pelas suas reações. Mas não se preocupe, Orogi, você não é uma aberração. Você é uma arma.

MiloSantos
Enviado por MiloSantos em 18/07/2013
Código do texto: T4393185
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