E era Branco...
As carteiras da sala eram brancas... A blusa da colega da frente também era branca. Na blusa da professora tinha branco. Mas tinha algo mais branco na sala. Tão branco que brilhava visto um pouco mais de longe. Era puro, limpo. Não tinha mácula alguma. Parecia até vestido de noiva do século XV.
Quando eu olhava para ele, me sentia fascinada. Admirava-me sua brancura naquele momento. E ele olhava para mim. O desejo dele era o de ser tocado com suavidade e força. Ele queria sentir prazer. Não queria ser virgem. Não fora feito para a pureza.
E ele me olhava mais ardente, firme, insinuando-se para minhas mãos, que nada tinham de inocentes. E seu olhar me interpelava avidamente. Perseguia-me por entre as fileiras de alunos e carteiras. Eu fugia do seu olhar, abaixava a cabeça, escondia-me atrás da blusa branca à minha frente.
Ele não tinha língua, falava com os olhos. E nunca parou de olhar para mim.
Eu, na minha angústia e inquietude, sempre fugia. Claro que fugia. Eu já possuía um amante. Preto. Fino. Sedutor. Aquela negritude me conquistara na primeira infância. Os traços, eternos, que saíam do seu íntimo, deixavam-me feliz, realizada. Meu Amante não tinha medo de nada. Aquele que me desejava não trazia aventuras no seu currículo. Só possuía a missão de deixar-se ser lido, copiado. Não se deslocava vagarosa e rapidamente sobre a folha, só esperando...
Meu amante preto rebola, corre, luta com minha Língua e busca minhas palavras. Basta colocá-lo entre meus dedos e deixá-lo ir. É por isso que o amo.
Meu fino lápis preto.
Aquele que me olha agora chora. Recusei-me a tocá-lo, desvirginá-lo, sujá-lo. Não havia graça. Tudo o que o sujasse seria desfeito facilmente. Parado ali, só servia para uso breve. Não havia graça.
O lápis, meu amante, era sensual, potente. Esse meu admirador não. Era só um objeto. Triste. Tímido. Infeliz. Solitário. Fixo. Esperando para ser tocado. Meu amante se impunha na folha de papel. Ele não, nem se importava com isso.
E era Branco...
DESESPERADAMENTEBRANCO.
Lucieni B. Santos