A criatura
... Em quanto eu me esgueirava com cuidado pelo caminho eu pude ver sua silhueta, aquilo de forma alguma era humano. De antemão eu quis fingir que não o notara, mas todos os meus sentidos denunciavam que eu havia percebido o tal ser que, se fosse metade de sua silhueta, poderia me segurar com as mãos juntas como um adulto segura um recém-nascido. Era de fato aterrorizante, mas algo bem fundo dentro de mim o queria conhecer. Esse algo queria enfrentar a morte e entende-la. Tal sentimento desconhecido me possuiu e, em vez de continuar rastejando no sentindo contrário, ele me guiou até a criatura. As pernas tremiam a cada passo e eu mal me aguentava nas mesmas, se elas estivessem juntas fariam barulhos de ossos batendo uma na outra. Minhas mãos se esconderam atrás da cintura e se agarraram. Dedos firmes com apenas um propósito, segurar aquela sensação que já não era mais medo. A criatura estava agachada e assim que eu me aproximei a uma distancia razoável, ela se levantou; como pode existir tal criatura entre nós? Alguém deve o ter visto, mas de tanto pavor, achou que se tratava mais de um sonho ou de algo fabricado pela sua mente amedrontada. Ou ninguém nunca saiu vivo desse encontro. Depois de ter sido tomado por um súbito surto de questionamento, volto à realidade e, ela não é nada agradável aparentemente. De seus olhos vermelhos saem fumaça com cheiro de enxofre. Suas mãos parecem mais garras do que mãos humanas e estão tomadas por pelos. A criatura respira ofegante enquanto me finta diretamente nos olhos. Parece que busca algo em mim. Parece que olha através dos meus olhos a ponto de ver a minha alma e, parece também que quer devora-la assim que tiver a primeira oportunidade. Inclino a cabeça o suficiente para poder olhar seus olhos e pergunto.
-Por que me segue e o que eu tenho para te oferecer? - Digo em tom alto e forte. A criatura se abaixa um pouco e diz.
-Medo... Mas você o consumiu antes que eu chegasse mais perto. Eu pude ver sua alma de longe viajante, ela gritava tão alto que me acordou do meu sono profundo. Não é a coragem que o move por essas terras. Não é amor ou loucura. Não é dor nem tristeza. Então viajante de terras distantes, o que te trazes aqui?
Não consigo mais me controlar nesse momento. Parece que fui tomado por uma força estranha. Possuído? Mas pelo que? Minhas mãos se soltam e meu braço aponta para a criatura. Minha mão que outrora estava tremula agora está firme e forte.
-Eu vim por você. E vim buscar o que me tomou há muitos séculos atrás!
A criatura se ergue novamente e seus olhos começam a brilhar em tom avermelhado. Ela sorrir e começa a se transformar em fumaça preta e com cheiro de tulipa. Em apenas alguns segundos eu estou sozinho novamente naquele lugar estranho. Não consigo me mover por hora e só me vem uma coisa à cabeça. Como vim para aqui?