DE VOLTA AO JARDIM
"Saibam...algumas histórias são apenas estórias...mas os poetas invertem as relações..."
Naquela tarde, mal teve tempo de se despedir do sol, pois fora inadvertidamente colhida por mãos incautas.
O verão já se dispersara...eu sei que sempre sentira certo medo do silêncio do outono e a primavera ainda longínqua... poderia esperar.
Estava acostumada à diversidade daquele jardim., mas sempre que conversava com suas amigas flores, ouvia estórias, e como era rosa, precisava experimentar o amor.
Certo dia , ele lhe apareceu...e passou a freqüentar o seu jardim.
Entreolhavam-se a cada por de sol e ambos passaram a exalar o perfume do desejo.
Ela , ainda desavisada das coisas do coração,nele acreditava, passava as noites em claro, sentia saudades, e já não mais reflorescia como antes...
Ele, acostumado a colecionar rosas, lhe convenceu a partir.Não precisou de muito esforço.
Então certa tarde, sob os raios do crepúsculo do outono,ela inebriou-se de paixão...angariou coragem e abandonou seu solo fértil.
Logo na manhã seguinte, despertou num belíssimo vaso negro, um solitário de porcelana chinesa,esquecido numa cozinha de hotel.
Assustou-se.Olhou ao derredor e procurou por ele, mas apenas reconheceu algumas amigas rosas, em pétalas envelhecidas que displicentemente foram se perdendo pelas bordas daquele vaso árido, abandonadas ao chão...
Logo sentiu sede, mas ali, a água era escassa e ela percebeu que jamais conseguiria reflorescer...
-Mas o amor é isto?-pensou. Este espaço tão apertado?
Não demorou a perceber que cometera um engano.
Então, na dor da queda da sua primeira pétala, decidiu que retornaria.
Quem sabe ainda lhe haveria tempo!
Assim, recolheu seu resto de perfume, e na calada da noite, em pleno silêncio... retornou ao jardim.
A primavera me contou que ela voltou a reflorescer, mas quem a olha bem de perto, percebe que a cada florada, lhe falta a mesma pétala...sua eterna cicatriz por ter seguido a ilusão...