A Guilda dos Caçadores - Capítulo 3

O terreno começava a descer e algo parecido com uma rústica trilha em direção as pequenas casas á distância começava a formar-se. As árvores ficaram mais baixas e mais esparsas conforme Powling descia e arbustos foram ficando mais frequentes. Foi então que decidiu esconder a metade do mapa, não era inteligente buscar a outra portando sua semelhante. Cobriu o tubo com galhos e folhas e amarrou-o na copa da árvore mais frondosa que conseguiu achar, certificou-se de estar bem escondido e fez uma marca no tronco, uma ranhura na diagonal. Tinha boa memória espacial, portanto não teria dificuldades chegar ali novamente.

Reiniciou a caminhada e cerca de duas horas e meia depois alcançou as primeiras pequenas casas, feitas de madeira rústica e blocos cinza de pedra. Pessoas conduziam carroças carregadas de feno e hortaliças pelas ruas de terra batida, tinham cabelos encaracolados de um tom castanho claro. Usavam vestes largas de pano grosseiro, com mantas de tecido similar por sobre os ombros porém de cores vivas. Powling ouvira falar que as cores representavam suas classes sociais, porém não sabia respectivamente qual cor representava cada classe.

Deslocou-se por entre o vai e vem de burros, cavalos pequenos e bois. Ao adentrar mais pela cidade as ruas de terra batida deram lugar a ruas ladrilhadas com pedras cinzas, as mesmas usadas nas casas. Havia muita pedra nessa região e desde sempre ela foi usada na construção de tudo.

Agora as pessoas ganhavam uma certa pluralidade, os cabelos encaracolados misturavam-se com lisos, trançados, crespos ou mesmo muitos homens carecas com marcas artísticas no couro cabeludo. Uma moça de pele acobreada e olhos penetrantes estava de pé por detrás de uma bancada de hortaliças, vestia-se como os demais mas com uma pano branco por sobre os longos cabelos pretos.

- Moça, por favor, você sabe aonde fica o Clube Vermelho?

- O Clube Vermelho?! Aquela pocilga de prostituição e infâmia? O que quer daquele lugar? - Sua expressão era rude e firme.

- Tenho de encontrar uma pessoa lá ainda hoje. Quem combinou esse lugar foi ele, não sabia que era um lugar desse tipo.

- Sei, não precisa disfarçar. O Clube Vermelho é famoso e homens de toda região buscam por prazer lá. Aquela estalagem esta recheada de marginais e assassinos.

- Agora estou ciente disso e serei cauteloso. Pode me indicar onde fica?

- Tá certo. Vá direto nessa rua e vire a direita na viela com uma bandeira vermelha numa parede. Daí pra frente você consegue se virar - Falava agora com desdém, analisando Powling dos pés a cabeça.

- Obrigado - Deixou-a com uma espécie de reverência de agradecimento, algo que viu os moradores fazerem ao se despedirem, e seguiu rua abaixo.

Antes de chegar a viela parou em uma banca de objetos diversos e negociou os itens que havia pegado dos salteadores. O peso extra deles era inútil e o atrapalhava, além de que um dinheiro extra era sempre bem-vindo. Na mesma rua também trocou sua codorna selvagem por pães de tamanho médio, mais fáceis de transportar e comer. Só então seguiu rua abaixo rumo ao infame Clube Vermelho.

Andou bem uns trezentos metros de onde pegou os pães quando deparou-se com duas estalagens altas e desalinhadas separadas por uma viela. No topo da construção á sua direita tremulava uma velha e desbotada bandeira vermelha, muito barulho e fumaça saiam de suas janelas. Ao fundo da viela as construções uniam-se e uma velha porta de cedro era guarnecida por dois altos gêmeos, ambos com barba crespa castanha cobrindo a maior parte do rosto e com longos cabelos encaracolados caindo aos ombros musculosos. De suas mãos pendiam espécimes de martelos de um lado e machados do outro. Powling imaginou-se tentando levanta-los sem sucesso.

Ao ir em direção a porta ambos os guardas dirigiram a ele olhares ferozes, como se quisessem trucida-lo ali mesmo. No entanto ele estava com a vantagem, as armas dos guardas precisavam de espaço para serem manipuladas, algo difícil de se encontrar em uma viela. Cortaria a garganta de ambos em segundos com suas Karambits sem dar chance para reagirem, no entanto mantinha-as bem escondidas em suas botas.

Quando ficou cara a cara com as duas montanhas, ambas aproximaram-se uma a outra bloqueando o caminho.

- O que você quer forasteiro? - Disseram os gêmeos em uníssono.

- Tenho um compromisso a tratar aí dentro.

- E o que nós temos a ganhar com seu compromisso? - As duas vozes potentes juntas soavam sobrenaturais, como se um poderoso espectro estivesse falando.

- Bem, podem ganhar isso - Ofereceu uma moeda de ouro, proveniente da venda dos itens.

- Somos dois se não percebe - Powling pegou outra moeda e entregou uma a cada gêmeo. Ambos se afastaram da porta, o da esquerda a abriu com um forte empurrão usando o braço livre do monstruoso martelo.

Logo quando entrou sentiu um vento abafado golpeá-lo no rosto, fumaça de numerosos cachimbos pairava por todo o salão. Pessoas bebiam e comiam em mesas espalhadas pelo lugar e também em um longo balcão, a agitação geral fez sua entrada passar despercebida. Sentou-se em uma mesa ao fundo da estalagem, perto de um corredor que levava a outras salas, provavelmente usadas para serviços mais íntimos. Pediu por vinho a uma garçonete e bebericava enquanto esperava pela aparição de Kalidú. Os chefes de salteadores tinham o dever de ser os primeiros a comparecerem as reuniões segundo sua antiga tradição. Tratando-se de um encontro de divisão das pilhagens era quase certo Kalidú trazer a metade do mapa em seu poder, se escondesse a metade para si causaria desconfiança em seus capangas. O plano na mente de Powling era simples: mata-lo rapidamente, pegar o mapa e sair correndo dali por uma das janelas nos andares acima, não queria ter de passar pelos gigantes á porta. Para certificar o melhor caminho para chegar a elas deu uma boa olhada no andar de cima, usando a desculpa de procurar pelo banheiro quando alguém o interrogava.

Powling já havia visto Kalidú uma vez antes, mas ele ainda não tinha se tornado salteador, trabalhava como membro da patrulha da vila de Coltin. Era gordo porém forte, tinha uma longa barba preta e cabelos negros curtos. Quando entrou pela porta de cedro não parecia muito diferente, apenas no modo de se vestir. Ao invés da armadura característica dos patrulheiros de Coltin usava um sobretudo marrom com um largo cinto de couro apertando sua volumosa barriga. Trazia consigo dois seguranças gêmeos, estranhamente parecidos com os guardas a porta do Clube, trajados com sobretudos similares ao de seu chefe, porem pretos. Um deles carregava um saco de couro com detalhes em prata, no fundo algo fazia estica-lo em formato cilíndrico. "Então você trouxe, muito bom, muito bom".

Sentaram-se em uma mesa perto do balcão, a uma distância considerável de onde Powling estava, pediram por cerveja e continuaram a conversa ruidosa que tratavam ao entrarem. Kalidú estava de costas para ele e os seguranças sentaram um de cada lado da mesa ficando um de frente para o outro. Passaram bem uns dez minutos de gargalhadas e cornos de cerveja quando Powling entrou em ação. Fingiu arrumar suas botas e pegou ambas karambits, após o que empunhou-as firmemente, escondendo as mãos habilidosamente usando a mobília e as pessoas em pé conforme andava ao encontro dos alvos. O salão estava cheio, então não foi difícil chegar bem perto do trio sem ser percebido. Degolaria kalidú primeiro e logo após ambos os seguranças, fazendo cada uma de suas Karambits morderem seus pescoços.

Porém, algo estava errado. Ao chegar perto de Kalidú este soltou uma ruidosa gargalhada, quase que forçada ao extremo, mais alta do que qualquer outra que havia dado anteriormente. Simultaneamente as montanhas gêmeas entraram no salão bloqueando a porta pela qual Powling havia entrado, três homens esguios pularam do balcão, dois deles seguraram seus braços num piscar de olhos. "São bem treinados, não, são profissionais, mas que merda, como fui descob...". Foi então que sentiu um forte golpe na cabeça e tudo escureceu.

Gabriel Freitas
Enviado por Gabriel Freitas em 24/04/2013
Reeditado em 30/04/2013
Código do texto: T4257806
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