O Ministério - Capítulo Um: Gato Negro - PARTE 01

Era inerente a Victor lembranças daquele lugar. Quantas vezes já havia brincado ali? Quantas vezes já havia dormido enquanto observava as estrelas? Quantas vezes aquele local não foi testemunha de sua solidão? E quantas outras aquele local serviu de refúgio para sua singular existência? Acredite, não foram poucas. Aquele era um local quase sagrado, tamanho o número de lembranças e sentimentos que ele carregava.

Os olhos de Victor brilhavam a cada vez que ele observava aquele horizonte, apesar de hoje não estar tão belo, mesmo sob o crepúsculo, a lua havia simplesmente sumido, nenhum sinal desta era perceptível naquela imensidão azul. Parecia que ela estava se reservando para os grandes acontecimentos que estavam por vir. Mas se assim o fosse, o Destino estava a brincar e, também, a conspirar, mais uma vez, aliás.

E de novo, Victor olhou para o horizonte e por mais que olhasse e cansasse de olhar, aquela vista jamais deixava de agradá-lo. A sensação nostálgica que aquela visão lhe transmitia era extremamente satisfatória.

– Ah, que Nostálgico... – Disse de forma melancólica o homem cujos cabelos somente as pontas eram vermelhas e todo o resto era branco, tão branco quanto à neve, porém tão luminescente quanto a Lua. Enquanto seus olhos brilhavam, Victor se aconchegou um pouco mais em sua cadeira improvisada: o Elevador Lacerda. Suas pernas estavam agora estiradas enquanto seus braços estavam apoiando o resto do corpo e sua coluna estava um pouco inclinada.

Houve uma breve brisa, seus cabelos foram suspensos de forma majestosa, o sol finalmente se pôs. O dia agora era noite. A cidade? Mais bela impossível. Os faróis dos carros iluminavam as ruas, enquanto os as lâmpadas dispostas nos postes de energia buscavam fazer o mesmo, porém ajudados pelos prédios e casas que ali estavam. Por um breve instante Victor sorriu, ajeitando seus cabelos e pondo uma mecha atrás da orelha e enquanto fazia isso, disse: “Seja bem vindo, My Lord. Seja bem vindo, Gato Negro”.

E após dizer isto, diante dele surgiu um homem alto, vestido dos pés a cabeça de preto. Seus cabelos eram negros, mas um negro profundo que transmitia uma escuridão quase profana. Mais obscuro do que todo o seu visual gótico, era a calma de seus olhos negros que pareciam engolir tudo aquilo que viam. Aquele era Gato Negro, O Ministro Universal.

Gato Negro. Este era seu nome, o nome do Maior de Todos os Ministros Universais. O mais poderoso, o mais sábio, o mais inteligente, o mais forte, o mais rápido e o “mais” em tudo o que você puder imaginar. Gato Negro era sinônimo de Perfeição. Tudo nele era de um sincronismo extremo. Suas botas, altas e com um leve salto, vinham inscritas de forma quase invisível – talvez pelo fato das inscrições possuírem a mesma cor de suas botas, porém um negro luminescente –, eram símbolos mágicos e camadas densas de proteção que iriam impedir danos graves em suas pernas, ao menos, nas áreas protegidas por elas – ou será que não? – Ele bem sabia que dependendo do inimigo este tipo de preparo era inútil. Provavelmente, este era o caso. Afinal seu inimigo, por mais que jovem, era formidável.

Sua calça era justa e igualmente negra e luminosa, parecia até uma única peça com a bota. Era possível ver a luminosidade emitida por pequenas letras e inscrições (ou seja lá o que fosse aquilo!), mas sua função era clara: proteger o usuário de danos graves – ou, mais uma vez, talvez não? – De qualquer sorte, este usava uma camisa de manga, assim como todo o resto: preta, tão justa quanto suas botas e calças. Na verdade, aquela roupa parecia muito com uma peça única totalmente inscrita de forma mágica e que se assemelhava muito com as roupas usadas por espiões de filmes. Mas sobre essa peça única havia um grande sobretudo que descia até seus pés. A cor? Negra e repleta de inscrições.

Seus cabelos negros e lisos iam até seus ombros e eram repicados, uma franja diagonal completamente reta cobria um de seus olhos, aquela era a única coisa reta em seu cabelo. Suas mãos estavam cobertas por luvas iguais a todo o resto. Mas havia uma coisa que chamava mais atenção do que todo o conjunto negro, a única coisa que fugia a esse tom e que não poderia ser escondida: a cor rosada de sua face.

A única camada de pele visível parecia ser extremamente macia e fofa, dava até vontade de apertar, mas quando entrava em contraste com aqueles olhos, talvez – um talvez com muita certeza, diga-se – essa ideia fosse repelida tão rapidamente quanto à luz.

Victor ainda sorria quando o Gato Negro o respondeu:

– Obrigado, Victor. – Disse em um tom completamente cortês e com uma educação digna de um Lorde. Suas expressões, sua forma de falar, de agir, de respirar, tudo. Tudo naquele ser era onipotente. Ele transmitia uma segurança tão grande que dava até medo estar no mesmo local que ele. Sua presença era forte, decidida e gentil. Ele parecia ser um ser de outra dimensão, tamanho o porte e a elegância dele. – Ainda persiste com essa ideia? Ou optou por um caminho mais ameno e menos doloroso para nós dois?

– Para nós dois? – Falou com ar de desafio o, agora, desajeitado menino. Desajeitado não por medo, mas sim porque comparar qualquer pessoa, por mais educada que seja, a Gato Negro, significava pô-la em um nível de quase grossura, tamanho o porte elegância do Ministro, mas quando isso é somado à deselegância natural de Victor: sim, ele é desajeitado!

– Inegavelmente. Para você em carne, para mim em alma. Não fazes ideia de meu sofrimento ao ter de ferir uma criança, especialmente uma criança tão talentosa quanto você. Então meu menino, lhe imploro, desista dessa ideia imatura e deixá-lo-ei retornar ao local de onde jamais deveria ter saído: o seu lar.

Victor sorriu ao escutar o que para ele era um disparate, apesar de soar estranho: aquilo era uma verdade. Gato Negro era tão velho quanto aquele Universo. Ele é conhecido por ser uma das “Obras Primas de Deus”, afinal foi Fé ou Deus, como queira chamar, em pessoa quem deu vida à Gato Negro, após o Grande Conflito da Criação. Chamar Victor de criança era quase um elogio, mas, obviamente, não naquele momento.

Ele encarou Gato Negro fixamente. Seu olhar agora beirava a irritação, seu coração batia de forma acelerada, suas mãos suavam, cada célula de seu corpo gritava pelo sangue de Gato Negro, mas ele sabia que não podia perder o controle, pois perder o controle seria a maior falha contra aquele gênio da manipulação. Retomando o controle sobre si mesmo, encarou o velho fixamente e olhando bem fundo nos seus olhos falou:

– Pois que hoje, não apenas sua alma irá sofrer, mas a sua carne também, Gato Negro. Prepare-se, pois hoje será o dia da deposição do cargo que vem ocupando desde sempre. – O clima ameno de antes, agora estava se tornando completamente hostil. O ar ao redor transbordava de energia, energia dispersa de forma intensa por Victor que agora se punha em posição de defesa, e de forma calma e controlada pelo ser negro. O Ministro Santo olhou uma última vez, encarando-o, e com um suspiro disse:

 Que assim seja. Sua decisão está tomada... Espero que não se arrependa, Victor. – Era muito raro aquele homem chamar outros indivíduos pelo nome. Eram sempre através de adjetivos, pronomes ou o que fosse. Chamá-lo pelo nome era uma demonstração clara da criticidade da situação. – Lembre-se das correntes que lhe foram impostas, e que jamais foram soltas, lembre-se do medo e da solidão. Lembre-se de sua prisão: Retenção Apocalíptica! – Eu os invoco, pois este é seu nome. Eu os invoco, pois este sou eu. Eu os invoco, por que esta é a minha vontade. Venham, pois este é O Chamado Ministerial.

Como em um passe de mágica surgiram ao redor de Gato Negro treze triângulos 2D, cada um contendo um grande círculo completamente fechado e com cores especificas. À medida que os círculos se materializavam – o que levou não mais do que 1 segundo –, iam surgindo números e abaixo dos números, nomes.

O Chamado de Gato Negro havia funcionado. Atrás deste, os trezes triângulos se organizavam de forma a representar um segundo triângulo maior, porém não tão uniforme quanto um triângulo de fato. Ele possuía pontas e espaços vazios que formavam triângulos invertidos, mas não triângulos como os outros, triângulos invertidos. O grande triângulo de pontas estava agora completo. Os treze nomes. Os treze números.

Aquela era a união de duas técnicas: Retenção Apocalíptica e O Chamado Ministerial. A primeira técnica consistia na construção de uma ligação forçada entre duas ou mais entidades distintas, a qual permitiria a quem iniciou a técnica localizar, comunicar, monitorar ou invocar a entidade conectada. Sendo que esta técnica só pode ser desfeita por quem a executou. Já a segunda é uma técnica de invocação brusca utilizada para invocar apenas os Ministros Santos e que só pode ser utilizada pelo Ministro Universal.

Victor encarou-o, agora sério. Contudo, sua seriedade não vinha por medo, mas sim pelo o que via. Dentro daqueles círculos, inscritos dentro dos triângulos estava escrito o nome dos treze ministros e suas respectivas posições, indo do mais forte ao mais fraco, do menor ao maior. Duas coisas chamaram a atenção de Victor: o porquê de ele ser o segundo e não Scorpion e por que seu nome estava naquela lista.

Victor Said ss
Enviado por Victor Said ss em 14/04/2013
Reeditado em 14/04/2013
Código do texto: T4239639
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