O Natal de Asgard.

Loki, na aurora de sua vida, estava entediado observando pela janela do castelo a neve que caia sobre a relva. Todos os Deuses estavam comentando que seria bem difícil manter todos os preparativos para o Yule (Festa que deu origem ao Natal cristão, como conhecemos). O inverno este ano era rigoroso.

– Quem irá cortar o pinheiro branco este ano? – indagou Odin.

– Ora, eu irei meu pai – respondeu o pequeno Thor.

Só nascia um pinheiro branco por ano, ele crescia ao norte de Midgard próximo ao monte Horn, que era cercado pela floresta de Mâule.

– Quem acompanhará Thor nesta pequena empreitada? – perguntou Odin.

Loki não pensou duas vezes, estava tão entediado dentro daquele salão gelado no topo da montanha mais alta de Asgard, que qualquer aventura que o tirasse de lá seria bem-vinda.

– Eu irei – disse o garoto Loki.

– Você!? – retorquiu Odin meio incrédulo. – Não está a aprontar nenhuma das suas seu pequeno malandro?

– Que é isso, só estou querendo ajudar.

– Você colocando-se ao dispor pra alguma coisa? Em todos esses anos você nunca moveu um dedo para auxiliar com as festividades e agora quer nos socorrer? – interrogou-lhe o jovem Balder, que também estava presente ali.

– Bom, pelo menos eu estou querendo ajudar, não ficarei entregue ao ócio como outros aqui.

– O que você está insinuando seu resquício de deus? – Balder já iria ficar frente a frente com Loki, quando Thor se interpôs entre os dois.

– Eu irei também meu senhor – disse Balder, dirigindo-se a Odin, que assentiu com um movimento de cabeça.

– Bom, então, que assim seja, tomem cuidado os três nesta caminhada. Eu aguardo vocês com o pinheiro.

O pinheiro era importantíssimo para as festas, se ele não estivesse posicionado no centro do salão principal do castelo quando fosse o dia de natal, aquele bom velhinho cheio de magia, que corria todos os nove mundos naquela época do ano presenteando deuses e mortais, passaria de largo por eles.

A curta jornada começaria ao amanhecer, e bem cedo os três meninos de Asgard já estavam prontos para ir junto à terra dos mortais surrupiar-lhes mais uma vez aquela árvore com propriedades mágicas. Esperavam fazer isso sem influência sobre a rotina humana.

– Vamos então, seus molengas – urgiu Loki com um sorriso.

– Quer desistir? Ainda dá tempo – sugeriu Balder.

– Nunca me acovardaria diante de tão pequeno esforço meu caro Balder.

Caminharam por bifrost sem muito conversar. Essa era a ponte que os levaria até Midgard. Tratava-se de uma longa jornada, e se não fosse a ajuda de seus cavalos, que descendiam de Sleipnir, demorariam muito para chegar ao seu destino. Estes, em um galope desmedido, não precisavam ser fustigados jamais. Entendiam perfeitamente o que os deuses mancebos lhes ordenavam. Eram todos alvos como a neve que caia em Asgard, sem nenhuma mancha. Porém, não tinham oito patas como seu ancestral, mas eram como os cavalos de Midgard.

Os três carregavam consigo um machado cada. Balder levava sua fiel espada, Thor não desgrudava de mjölnir, e Loki portava consigo uma espada e um escudo também.

Em questão de alguns minutos estavam sobre a relva de uma planície na terra dos homens, e os cavalos começaram a trotar em direção ao norte, onde estaria plantado o pedaço de pau encantado.

Loki, maquinava um jeito de levar vantagem sobre seu desafeto Balder, e queria de qualquer jeito chegar primeiro até o tronco natalino. Logo propôs:

– Esta caminhada está sem graça, podemos nos divertir com isso. Por que não fazemos uma competição para que esta pequena saga fique mais animada? Vamos apostar alguma coisa.

Os outros dois gostaram da ideia e, como bons deuses nórdicos, não poderiam rejeitar uma competição.

– Aceito – disse Thor

– Também aceito – confirmou Balder um instante depois.

– Pois bem, eu aposto que se eu não chegar até o pinheiro mágico primeiro e corta-lo, serei o tratador dos cavalos de ambos por cem anos – Falou Loki.

– Muito bem, se eu não chegar primeiro, limparei os vossos calçados sempre que for preciso por cem anos – disse Balder.

– Está certo, se eu não alcançar aquele lugar enfeitiçado antes de vocês eu... Servirei as suas bocas de hidromel e comida em todos os jantares por cem anos – Completou Thor.

– FECHADO! – gritaram os três conjuntamente.

Deixaram seus cavalos presos em uma grande árvore, ainda tinham um dia inteiro para acabar a tarefa, decidiram ir a pé e desfrutarem do inverno agradável daquele lugar.

Balder seguiria seu instinto e perseguiria a bela árvore. Aguçaria seus sentidos e ficaria atento para que encontrasse o caminho mais rápido que o levasse até seu destino. Começou a seguir o curso do rio.

Thor pressentiu que encontraria alguns contratempos no percurso, mas não sabia quais, no entanto não desanimou, ao contrário, se sentiu até mais excitado. Seguiu em direção a um vilarejo, colocaria sua capa para tentar se disfarçar. Tentaria se aproximar de alguém. Quem sabe descobrir quais eram as petições humanas daquele ano, já que as oferendas estavam diminuindo a cada dia, talvez descortinasse o motivo. Não se demoraria muito, queria ganhar a aposta, mas sua curiosidade também era grande.

Loki se metamorfoseou em um lobo negro, aguçou seu faro e correu para dentro da floresta que estava a sua frente. Lá, já em sua forma natural, lançou mão de suas artes ocultas para tentar distrair os dois outros concorrentes. Retirou do bolso de seu colete um mapa que indicava onde estava a localização da árvore. Percebendo que Balder seguiria junto ao leito do rio e que Thor iria pelo vilarejo, tratou de tentar atrasá-los com seus artifícios mágicos. Lançou um pó sobre o mapa que o fez ficar maior, e com isso, incrivelmente podia ver a localização dos dois oponentes sempre que quisesse, via Thor entretido com algo pelo caminho, portanto, não se preocuparia com ele neste momento, mas Balder seguia firme seu rumo. Teria que impedi-lo.

Após caminhar uma milha, Balder sentiu sede. O leito do rio, que se estendia longamente até a margem oposta, estava congelado. Caminhava entre o rio e a floresta. Viu uma cabana a sua frente. Andou até a porta e bateu. Alguns segundos depois uma encantadora menina de lindos olhos azuis, longos cabelos negros que caiam até a cintura e que aparentava ter uns doze anos mortais lhe recebeu à porta.

– Boa tarde, estou caminhando já algum tempo, seguindo pelo curso do rio e gostaria de beber um pouco de água.

– Mas é claro, por favor entre, a jarra em cima da mesa. Sente que eu vou lhe servir.

– Eu não posso demorar muito, estou em uma missão que demanda um pouco de pressa.

– Sente-se só um pouco, já vou servir-lhe a água.

O pequeno Balder ficou encantado com aqueles olhinhos, pensou que talvez fosse possível ficar ali um pouco e alcançar a árvore sem problemas logo em seguida. Sorveu a água que lhe foi servida e a menina sentou ao seu lado e perguntou.

– De onde você vem com tanto ímpeto para junto da montanha branca?

– Venho de muito longe, de uma terra que talvez se esconda da sua.

– Mas você não está cansado, se quiser pode descansar um pouco aqui.

– Acredito que não será possível agora, quem sabe em outro momento – começou a se sentir muito sonolento de uma hora para outra. A imagem daquela garotinha começou a ficar embaçada em seus olhos – acho que estou meio tonto – e logo adormeceu.

Do vilarejo em que Thor estava, podia-se ver a montanha branca. Não estava muito longe de seu objetivo. Perto do estábulo, viu um garoto de cabelos loiros e lisos, meio sujo de lama, que aparentava ter uns oito anos, esfregando um bonito cavalo. Caminhou até ele e perguntou-lhe o nome.

– Erick – foi a resposta.

– Olá, meu nome é Thor. Olha, o que você espera ganhar daquele ancião de barba branca este ano?

– Do Papai Noel! Eu espero que ele me dê um lindo cavalo. Eu trabalho aqui na estrebaria mas não tenho um, e não posso montar nenhum cavalo aqui. Os donos não permitem.

– É mesmo!

– É. Você não é daqui não é mesmo?

– Como você sabe?

– Ninguém se veste dessa maneira elegante. Você é o menino que ajuda o presenteador?

– O quê? Não... Não é isso.

– Tudo bem, eu não vou contar que vi você por aqui. Será o nosso segredo.

– Eu... Eu... Tenho que ir...

– Foi um prazer, e não se esqueça de falar com ele do meu presente – sussurrou-lhe o menino.

Saiu dali e apressou o passo rumo à montanha, floresta adentro agora, pensando na confusão que o menino tinha feito.

Loki após o seu último estratagema, endireitou o percurso que estava fazendo e empregou suas forças, agora caninas novamente, para o caminho que se propusera.

Balder acordou ao lado do leito do rio, sem entender muito bem o que havia acontecido. Ao se levantar, começou a recordar os fatos e viu que ali não tinha nem sombra de cabana ou menina.

– Maldito Loki! Como pude cair nesta armadilha! Desgraçado! Quando eu pôr minhas mãos nele vou aniquilá-lo!

Começou a dizer vários outros impropérios e empregou uma corrida alucinante a caminho do pé da montanha.

Loki avistou o lugar indicado primeiro, mas seu queixo literalmente caiu. Onde estava a droga da árvore, só via o tronco branco cortado. Quem havia feito aquela infeliz incisão no maldito pedaço de pau antes dele?

Logo atrás dele chegou Balder bufando de raiva, agarrou-lhe pelo pescoço e perguntou.

– Onde está o pinheiro seu trapaceiro?

– Eu não... eu não... sei – disse-lhe sufocando.

Foi quando Thor apareceu e conseguiu a muito custo soltar os dedos de Balder do pescoço de Loki.

– Onde está a árvore? – perguntou gritando novamente Balder.

– Eu não sei, eu juro, eu cheguei aqui e só estava esse pedaço de caule. Naturalmente alguém chegou antes, cortou-a, e a levou.

Foi quando começaram a ouvir um som de sinos. Um som como de cavalgaduras. Então, olhando pelo leito congelado do rio vislumbraram sete renas puxando com esforço um trenó, que se aproximou magicamente deles sobre o gelo.

– O que vocês procuram aqui minhas crianças asgardianas? – disse o senhor de barba branca que dirigia aquele veículo. Deixando os três meninos um pouco perplexos.

– Nós viemos de Asgard pegar o pinheiro branco para meu pai, iríamos adornar o salão de nosso castelo para poder receber sua visita e seus presentes amanhã – disse-lhe Thor que, mesmo sem nunca o ter visto, sabia de quem se tratava.

– Ora, e para que tanto esforço meninos? Eu não dou meus presentes em virtude desta ou daquela árvore, muitas famílias não podem ter árvores em suas casas e mesmo assim eu não deixo de presentear suas crianças. O que importa é seu comportamento durante ano, sua pureza de consciência e de coração. – Falava isso de modo sereno, como alguém muito sábio a revelar um segredo.

– Bom, então, todos os anos, em que o nosso povo veio aqui buscar isso, foi em vão? – retrucou Balder.

¬– Acredito que sim, mas não pense nisso mais. Pelo que vejo aqui – e neste momento aproximou-se do pedaço de tronco da árvore – não parece ter sido cortado a pouco tempo. A magia desta árvore deve ter acabado, ou algo assim. Muito da magia que há no mundo está acabando, logo, eu penso que não existirá mais nenhuma. Mas podem ficar despreocupados. Eu os visitarei como de costume este ano. Coloquem um pinheiro comum em lugar deste para enfeitar o salão. Só estou com medo de me atrasar nas entregas.

– Por quê? – perguntou-lhe Thor.

– Uma de minhas renas se acidentou e tive que prosseguir com as sete restantes, o que causa maior esforço para elas e retarda um pouco minhas entregas.

– Não seja por isso – disse Balder. – Este infeliz aqui fará as vezes de rena neste Natal para que pague o vil ardil que empregou-me nesta jornada. E empurrou o menino Loki na direção do trenó.

Loki concordou meio contrafeito em ajudar, temia a mão pesada de Balder naquele momento, mas argumentou que faria aquilo em prol do Natal, mas estava mentindo. Faria este esforço por medo de Balder e para parecer bom aos olhos do entregador de regalos.

***

Loki voltara pra Asgard naquela noite em forma de rena. Balder e Thor cavalgaram de volta com a consciência de dever cumprido. E um menino que trabalha em um estábulo ganhou um lindo cavalo branco Asgardiano naquele Natal.

Lucas Sabino
Enviado por Lucas Sabino em 18/12/2012
Código do texto: T4041075
Classificação de conteúdo: seguro