Estrela de Belém

Lá pelas tantas, olho o céu. Nublado, penso, mas vislumbro fugazes brilhos estelares e, um pouco mais intenso, algum reflexo lunar.

Lua se encaminhando para minguante, num começo de outono com pretensão invernal. Distraidamente sigo pela estrada de terra; por isso, descubro, não é tão escura a noite.

Não é meu uso sair à noite; havia um chamado tão intenso para ir que não questionei. Ouvi o som do riacho à direita e segui pro norte. Não sou dado à localização exata, geográfica: sigo.

Um cão fareja o ar, aproxima-se e segue-me; eu e o cão, num caminho que desconheço, mas sei. Encontro um pedaço de pau, mais parece um cajado. Vejo dois vultos à frente, aperto o passo para alcançá-los. Ambos se voltam ao ouvir meus passos e esperam. Outro que ouviu o chamado, diz o mais alto. É, confirma o outro. Boa noite, respondo. Trouxe o presente? Sim, e vocês? Tudo como foi combinado.

Andamos os três, num silêncio úmido; olho o céu de novo. Sossega, tem tempo, diz Melchior. Notei que agora as nuvens são mais esparsas. A direção está certa, confirma Balthazar, mas precisamos andar mais rápido. O cão é seu? É, agora é.

Atravessamos uma ponte e Balthazar para. Devemos escolher a direção certa, diz, cadê a bússola, pergunta Melchior. Seguimos a estrada da esquerda.

O dia está certo (ou a noite), eu digo, e os dois acenam com a cabeça. Falta pouco, Melchior? Sim, respondemos.

Olho o céu e confirmo: poucas nuvens, mas cadê a Estrela? Cadê a Estrela de Belém?

Balthazar e Melchior entreolham-se; eu sei que há uma Estrela de Belém esta noite, que trouxemos os presentes, que até o cão sabe. Todos nós sabemos, diz Balthazar. Há dois mil anos que sabemos, responde Melchior.

O cão fareja, desejoso de encontrar o caminho; Balthazar anda um pouco à frente de todos; os sinais todos são os mesmos, o quadrante certo, o vento soprando, os sinais nos deixam um pouco mais confiantes. Pergunto se alguém ouviu um som abafado, um estrondo prolongado, se perdendo no vale. O cão ouviu, está alerta, responde Melchior. Deve ser para que a gente não se desespere, que a direção está certa.

Novamente devemos escolher qual caminho seguir, tentamos o da direita. Não é ilusão; ainda muito distante, há um brilho intenso, um facho de luz rastreando o espaço. Rumo certo, diz Balthazar: o cão toma a dianteira, o rabo feito uma antena, procurando seguir os sinais. E os presentes, serão aceitos?

Agora a luz é bem forte, quase não se pode olhar diretamente, já distinguimos vários vultos. Isso dá novo alento, apesar das pernas dormentes, apertamos o passo. Ofegantes, chegamos a uma depressão e notamos um objeto estranho a todos nós. Uma criança sorridente e feliz nos dá as boas vindas. Outras pessoas já se reúnem nas proximidades e começam a cantar cantigas de notícias alvissareiras. Abrimos os braços e alcançamos a Harmonia.

Geni Alves dos Santos

Geni Alves dos Santos
Enviado por Geni Alves dos Santos em 15/12/2012
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