Dizei uma só palavra e serei salvo
“Se você der um passo eu lhe seguro pela mão” – dizia a voz. “Se você der um passo vai se esborrachar no chão”-- dizia a outra voz. “Tudo depende do que você quer”, dizia a primeira voz. “Tudo depende do que você não quer”, dizia a segunda. “O que você quer?” Uma perguntava. “O que você não quer?” A outra retrucava. “Pule”, dizia uma. “Não pule”, dizia a outra.
Enquanto as vozes duelavam dentro de minha cabeça meu corpo não resistiu. Desabei de onde estava.
Quando estava caindo senti como se alguém muito forte me segurasse pelos ombros. Imediatamente comecei a gritar com medo de morrer. As vozes voltaram! Uma dizia-me: “Você vai sobreviver”. A outra dizia: “Você vai morrer”. Uma dizia que o que eu escolhesse assim seria. A outra retrucava que o que eu não escolhesse era o que seria. A pressão e o medo foram aumentando a tal ponto que eu senti como se tivesse levado uma descarga elétrica. Tremi todo. Comecei a gemer alto e a bater o queixo descontroladamente.
Acordei com a enfermeira e o médico ao lado da cama. Depois de algum tempo reuni um resto de coragem e força de vontade e perguntei se corria risco de vida. Eles garantiram que não.
Antes de sair, o médico me disse que o único problema era o coma em que eu estivera por três dias. Ele afirmou com sinceridade que esperava que eu não fosse acordar assim de uma hora para outra. A enfermeira que estivera no meu quarto afirmou que tinha certeza que eu acordaria a qualquer momento. Disseram, ainda, que ficaram conversando lá embaixo no pátio. Uma dizia: sim, ele vai conseguir acordar logo. O outro dizia: não, provavelmente não vai conseguir.
Quando os dois saíram do meu quarto fiquei pensando durante muito tempo nas palavras que nós ouvimos quando estamos acordados. Será que elas seriam tão diferentes daquelas que ouvimos durante o sono? Será que quando estamos dormindo não estamos acordados em outro mundo?