Vermelho

Acordei no meio da noite, com não sei o quê. Num impulso, levantei-me e saí do quarto. Estava na casa de minha avó, e atravessei silenciosamente o corredor até o quarto de meu tio. O lugar é todo decorado em listras pretas e vermelhas, pois ele é um torcedor de futebol meio fanático. O luar entrava pela janela aberta, incidindo diretamente sobre a cama vazia. Meu tio não estava ali. Olhei ao redor do quarto, ao mesmo tempo em que uma ventania começou, escancarando ainda mais a janela e batendo a porta atrás de mim, derrubando objetos e fazendo meus cabelos açoitarem meu rosto.

Então o mais estranho aconteceu. Os móveis começaram a se desintegrar em areia vermelha, assim como todos os objetos pessoais de meu tio. A tinta das paredes começou a derreter estranhamente. O preto desbotou e foi sugado pelo piso, que absorveu a areia que havia sido os móveis, tornando-se vermelho. Era como se todo o quarto estivesse derretendo. O vento mudou repentinamente de direção e fechou a janela.

Assustada, recuei até minhas costas atingirem a porta. Tateei a maçaneta e tentei abri-la, mas estava trancada por fora. Um homem se materializou à minha frente. Era alto, com os braços e pernas vermelhos, e usava uma armadura da mesma cor. Tinha uma cauda que terminava em uma seta. O rosto era escuro, tudo o que eu podia ver eram a boca escura, torcida em um sorriso maligno, e os olhos escarlates, cheios de maldade. A figura começou a rir. Ele não tinha sombra.

- Mãe! – comecei a gritar, desesperada, esmurrando a porta. – Mãe! Socorro! Me ajuda!

- Desculpa, minha filha. – reconheci a voz de minha mãe, embora muito fraca e encoberta por desespero. – Eu tô com muito medo, você pode cuidar disso sozinha!

- Mãe... – minha voz se transformou em um sussurro quase inaudível. Lágrimas queimaram em minha garganta. A criatura vermelha à minha frente gargalhou ainda mais, uma gargalhada má e sem humor que fazia parar o coração e gelar o sangue. Finalmente, ela desapareceu com o homem. Vozes malignas começaram a berrar na minha cabeça.

Vá embora daqui.

Vê como ninguém se importa com você?

Você foi abandonada por todos...

O que ainda está fazendo aqui?

Saia daqui, garota!

Senti alguma coisa maligna, se retesando, aprontando o bote para cima de mim, prestes a me matar. Tapei os ouvidos, num último esforço para bloquear as vozes. Eu não queria que elas fossem a última coisa que ouviria. A escuridão começou a me engolir. Ajoelhei-me, segurando a cabeça, e me esforcei para me lembrar de coisas boas. Minha família. Meus amigos.

Com um rangido, a porta se abriu e um homem idoso, com uma barba branca, apareceu. Ele era meio transparente – o que me fez pensar que era o fantasma do meu avô, que morrera ali – e irradiava uma luz branca tão forte que foi capaz de afastar a escuridão. Estendeu a mão, que eu peguei com prazer. O velho me puxou para fora do quarto, finalmente me dando esperanças de ser salva.

* * *

Acordei suando frio e arfando. Levantei-me rapidamente e olhei pela janela. O sol estava nascendo, então ninguém estaria acordado ainda. Corri em silêncio até o quarto do meu tio, tomando cuidado para não entrar. Meu tio dormia profundamente em sua cama. As paredes continuavam pretas e vermelhas, e as janelas estavam fechadas.

Aliviada, voltei para o quarto, com a memória daquela risada ainda fresca em minha mente.

GabiRavenclaw
Enviado por GabiRavenclaw em 25/11/2012
Código do texto: T4004471
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