A FOGUEIRA DE SÃO JOÃO
A FOGUEIRA DE SÃO JOÃO
O terreiro está varrido, tudo limpo, tudo lindo, margeando a estrada, a ramada floresceu, tudo está florido, brotaram tanta margarida, boa noite, bonina e malmequer, rosa vermelha e bambu, a natureza está em festa. Magestosa a fogueira espera incendiar a noite do sertão. No centro do terreiro o pau da bandeira está, um pano branco com estampa de São João, lembra ao distraído passante que ali o novenário na boca da noite acontecerá. Zefa e Xica Banguela ralam o milho, pamonha garantida com certeza, que beleza! Lindeza é peru cevado, depenado, todo cortado, a lenha em brasa no fogão da casa, amolece a carne, tempero bom, cabidela pronta, pé de moleque, cuscuz e arroz, requeijão depois, manteiga de garrafa, batata doce prá adoçar a vida. Depois da novena, a comilança começa, é tanta a conversa, gente festiva, alegre e ativa, a beberragem espera de bem esperar.: é cachaça, cerveja gelada, bate bate e licor, um primor de se beber... A fome não espera a fartura, dizem alguns, mas a fartura está presente no meio daquela gente. É acesa a fogueira que queimará a noite inteira, o mugido da vaca estocando leite, o estampido do rojão, começa a festa, que deleite! A batida forte da zabumba, o doce repicar do triângulo, os acordes da sanfona e aquela voz inconfundível de José Edvaldo, muito animado, ele começa a cantoria com Asa Branca em primazia. Marcante, como sempre, dolente e comovente, arranca lágrimas da gente, "asa branca bateu asas" e, por mais que seja repetitivo, vale a pena ouvir de novo, principalmente na noite de São João.
Em volta à fogueira, pela noite inteira, nenhuma notícia ruim, não existe policial envolvido com droga ou bandidagem, mulher que retalha marido ou marido que retalha mulher. O forró esquenta a noite, a poeira levanta do assento, rosto se contrae de aceitação ou rejeição ao que o parceiro dita ao ouvido, é festa pura, o colorido do balão...
São João do Carneirinho, do carneirinho João, é festa no sertão, ficando no coração da gente, uma saudade ausente, de toda aquela gente que se foi e não voltará mais... Fincando no lado de cá, o pé de Manacá, encanta nossas vidas com suas flores coloridas nos lembrando que vale a pena viver vida plena, na beleza de ser nordestino, sem medo ou desatino, feliz viver até morrer. Essa planta se agiganta, e sua sombra nos encanta, escondendo no escuro a saudade, hoje só vale felicidade, afinal o melhor é beber, do coração a chama acender, e beber, beber à vontade, sorrir de alegria e ver a fogueira arder...
Carlos Lira