Na Floresta Druídica
O dia alvorece numa manhã alegre. O ruído matinal da Floresta Druídica assemelha-se a uma sinfonia de vozes e mistério. Um vento fresco e doce que rasteja do meio da floresta toma toda a velha estrada de chão batido e pedras, faz emanar um perfume único de gelo e rocha do chão que sobe frio e penetrante.
O dia está parcialmente claro ainda, contudo é muito cedo. Tudo parece calmo e deserto a não ser por um vulto minúsculo e embaçado que aponta na velha estrada a oeste.
Alguns animais vespertinos, curiosos e empertigados, ensaiam sair do mato, mas timidamente escondem-se atrás dos arbustos e somem novamente.
Vagos pássaros pontilham um céu misto de azul e roxo, refletindo os poucos raios amarelados do sol da manhã, que ainda não irradia a velha e embaçada estrada Leste-Oeste.
O vulto toma forma. É uma carroça que se aproxima lentamente, puxada por um cavalo velho e um homem do mesmo estado na cocheira.
O velho manipula a rédea com precisão e o cavalo obedece presto. A carroça vira lentamente e aproxima da borda da estrada adentrando num caminho à esquerda que começa e termina logo a uns cem metros.
Param numa espécie de clareira e o velho posiciona o cavalo e a carroça num lugar estrategicamente escolhido.
- Está com fome meu velho? – Pergunta o velho, com uma voz rouca e melodiosa – Com sede talvez? Vou “plantar” minha casa aqui, mas primeiro vamos ver o que temos para comer, assim já preparo o seu café da manhã.
O cavalo resmungou com aprovação e fungou abanando a cabeça. O velho desceu uma bolsa de viagem, toda de couro, da carroça e colocou no chão. Foi tirando alguns frascos de vidros e a cada frasco que tirava resmungava alguma coisa.
- Capim cevado, humm..não. Arbusto do norte, razoável. Precisamos de alguma coisa quente. Folhas de Acácias da Montanha do Dragão? Não, quente demais. Humm... Aqui está: Capim dos Cainos.
O velho destampa o vidro: - Um cocho cheio deve dar.
Ele abre um buraco no chão com o cajado e despeja uma semente tapando a cova com o pé. Tampa o frasco novamente e pega uma garrafa de vidro de cor verde.
- Por fim, Água de Ralfenas – despeja uma mínima porção sobre a cova – isso basta.
O velho guarda a garrafa na bolsa novamente. Começa retirar mais frascos resmungando novamente alguma coisa.
Enquanto o velho retira os frascos da bolsa, a cova recém coberta estoura um rebento repentino que vai tomando forma e volume rapidamente. A planta conforme vai crescendo vai se modelando e se transformando e em poucos minutos um cocho toma lugar. Brotado da cova. Observa-se um cocho muito bem trabalhado, feito com trabalho de entalhe e já brota recheado de Capim dos Cainos. O cocho finaliza o seu brotamento e nascimento com um som oco de um estalo.
- Pof!
- Pronto meu velho camarigo. Pode se servir.
O cavalo aproxima lentamente e começa a comer. Para aliviar sua carga o velho desarreia a carroça e a põe à parte.
Enquanto o cavalo toma seu café da manhã o velho vai abrindo covas em lugares estratégicos e vai depositando em cada uma delas uma semente previamente escolhida.
- Cerca... Varanda... Árvores de jardim... Casinha, não... Casebre, tampouco... Palhoça? Menos... Casa dos Valados, não apropriada... Choupana Silvícola? Ideal.
Depois de satisfeito vem despejando um gole d’água em cada uma delas e cobrindo com terra.
Senta ao pé de uma Panguera antiga e suspira:
- Essa choupana foi uma das primeiras casas que eu “sementei”, está comigo há anos.
O velho traja uma roupa branca, surrada, mas muito limpa e sem rotura. Cinto, chapéu e botas de couro. Cajado de vara de jabuticabeira que enverga, mas não quebra. Ostenta uma grande cabeleira e uma vasta barba, ambos brancos como algodão. De olhos azuis vivos e cachimbo de barro.
É um Magomor. Vem do oeste há três dias. Seu nome é Moriot.
Enquanto o mago cochila e o cavalo termina sua refeição as covas brotam e cada renovo toma forma e volume. Uns depois dos outros vão nascendo e estalando até que nenhuma cova fique sem brotar.
Onde antes era uma clareira vaga e melancólica agora existe uma choupana silvícola com poço, jardim e cerca. Sem falar no fogão à lenha com chaminé. Varanda com rede e cadeiras de balanço. Quarto, cozinha, sala e tudo mobiliado e bem organizado.
Moriot levanta e começa a descarregar as suas coisas. Planta uma estrebaria nos fundos que arrebenta enquanto ele prepara um chá.
São nove horas da manhã...