UMA JANELA PARA O CÉU

Uma janela para o céu

Giovana era jovem corajosa e destemida. Através de muita dedicação, renúncia à vida pessoal, muito estudo e muito trabalho, sentiam-se em parte realizada profissionalmente. Aos trinta e dois anos, ocupava uma posição invejável na Universidade onde lecionava, há pouco mais de um ano. Além de mestra, era também excelente médica anestesiologista, e já tinha publicado vários livros sobre seu trabalho. A realização profissional decolara juntamente com o casamento com o neurocirurgião Paulo Linhares.

Ela tinha uma vida muitíssimo agitada. Quando dormia, não tinha sonhos. Se os tinha, afirmava para os mais íntimos, que não se lembrava, e também para ela, racional como era, sonhos eram apenas sonhos. Paulo seu marido, era mais tranquilo, não se deixava levar pela ambição profissional de querer estar sempre no topo, ser o número um, estar presente a todos os Congressos, ser citados em todas as revistas médicas, etc. Após o término de seu exaustivo dia de trabalho, ele gostava de chegar a casa, e para relaxar, arriscava preparar novidades gastronômicas, que n a maioria das vezes, degustava sozinho, pois Giovana chegava muito tarde, e na maioria das vezes, sem fome, pois estava sempre de dieta. Tinha um medo excessivo de engordar.

Eles não sabiam se comemoravam ou se estavam assustados, quase sem explicação, Giovana engravidou. A primeira semana foi um verdadeiro stress, parece que se travou uma muda batalha entre eles. Ela achava que ele tinha armado para ela. Ele tinha certeza que acontecera na única vez que não se prevenira, mas que ela não se lembraria, pois estava meio tonta depois de muito vinho. A gravidez não deveria ser um problema, mas tornou-se, pelo menos para Giovana, que desejava ter escolhido com cuidado a época de gerar um filho. O relacionamento ficou muito frio entre os dois. Ele achava que era por causa da gravidez, ela estava meio revoltada com a chegada do bebê. Logo ele começou a mexer e a chutar, e por mais que ela tentasse não comer, para não engordar, era impossível.

Gabriel veio ao mundo numa manhã ensolarada de verão. Era um lindo menino de pele rosada e olhos castanhos muito brilhantes. O nascimento do menino foi apenas um capítulo a mais na vida de Giovana. A maternidade não a desafiava, nem a entusiasmava. Gabriel como todos os bebês chorava, dormia, comia, às vezes brincava e era feliz em sua vidinha. Paulo tinha loucura pelo seu pequenino anjo como o chamava. Sentia-se plenamente realizado com o bebê, até esquecia que o relacionamento com Giovana estava cada vez mais distante.

Três longos anos se passaram e eles ainda brincavam de família feliz, mostrando ao mundo que o improvável às vezes poderia acontecer, que apesar da ausência de uma das partes, no caso Giovana, que se divorciara de Paulo e entregara a guarda de Gabriel ao pai, pois alegava que o menino precisava de muita atenção e que ela não poderia se desligar de seu trabalho por causa do filho, a família ainda sobrevivia nas raríssimas vezes que se encontravam para comer uma pizza ou para qualquer outra comemoração.

A notícia chegou repentina para Giovana. A irmã de Paulo, sua ex-cunhada telefonou avisando que eles estavam na UTI de um hospital infantil. Ela não dera muitos detalhes. Gabriel tinha sofrido um acidente na aula de natação. Ela os avistou no corredor. Paulo chorava como uma criança, desconsolado abraçado à irmã. Giovana se deu conta que era mais grave do que ela esperava. Sem saber, ainda tentou falar com Paulo. Pela primeira vez, ela viu um desprezo em seu olhar tão grande, que se assustou. Sentiu-se ferida, pois Gabriel também era seu filho, e ela começou a perguntar o que tinha acontecido. Não obteve resposta, nos dois minutos seguintes só escutava o choro do ex-marido e da ex-cunhada. Em seguida, chegaram os ex-sogros, e sua mãe. Todos a olhavam com um ar misterioso, era o que ela sentia. Alguns minutos depois a ficha finalmente caiu. Ninguém pronunciava uma palavra, apenas um silêncio total.

Naquela tarde, o chão se abriu para Giovana, ela que era tão firme e racional, não sabia o que fazer, que providência tomar. Sentia-se tão fraca, tão pequena, e solitária. As pessoas amigas começaram a chegar ainda no hospital, abraçavam Paulo e os outros parentes e a cumprimentavam quase mudas, e logo se afastavam dela. Ela não teve coragem de continuar por ali, deu uma desculpa qualquer e saiu. Foi para o estacionamento pegou o carro, rodou, rodou, rodou, sem rumo, até que anoiteceu, e ela foi para casa. Tomou um banho demorado, vestiu uma camisola e tentou dormir. Não conseguia pensar, não conseguia chorar, tinha vontade de gritar, mas o grito morrera na garganta. O telefone tocou era sua mãe, querendo saber se ela estava bem, e dizendo que ela não precisava se preocupar que ela compreendia o que Giovana estava sentindo.

Durante muitas horas Giovana tentou dormir em vão. Rolou na cama, amanhecia quando ela conseguiu adormecer. Depois de muitos anos, sonhou um sonho muito bonito, estava feliz, brincando com Gabriel na beira do mar. A praia estava deserta e o dia estava amanhecendo, de repente, ele começava a correr, e ia desaparecendo, lentamente, depois foi subindo para o espaço como um anjo alado, o sol que acabava de chegar iluminava suas asas brilhantes, já lá bem no alto, antes de desaparecer totalmente, ele acenou-lhe adeus de uma espécie de janela no céu.

Aradia Rhianon
Enviado por Aradia Rhianon em 08/06/2012
Código do texto: T3713433
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