A Caravana do Porto Noroeste - Parte 01
01
Quando os primeiros raios do sol surgiram na colina Valco, o cavaleiro e Portaventos, seu fiel e garboso cavalo, pararam.
– Vamos tomar o café da manhã companheiro, olhe só que lindas pastagens têm essas paragens. – Tinham cavalgado sessenta quilômetros pela planície até o amanhecer.
Valco recolheu lenha e fez uma fogueira, comeu um pouco e depois dormiu. Portaventos pastava por perto e uma ou duas vezes bebeu água de um fio que corria ali perto. Uma brisa vinha do norte e um vento fresco, de vez em quando, farfalhavam as folhas no chão e balançavam as copas das pequenas árvores lentamente. O sol vespertino ainda era frio e agradável.
Depois de algum tempo Portaventos dera um relincho alto e alarmante olhando concentradamente para o leste. Valco despertou repentinamente. Levantou e pegou um dos cantis com água e tomou um gole enquanto olhava para a mesma direção que Portaventos. Ao sudeste.
– Cavalos! Meu amigo. E com seus cavaleiros. Uma caravana de mercadores passava a uns trezentos metros dali. Vinham do leste. Valco montou o cavalo e foi ao encontro deles.
Cinco ou seus homens a cavalo iam à frente de duas carruagens e algumas pessoas a pé logo atrás destas.
As carruagens eram de madeiras entalhadas, tinham rodas revestidas de metal e eram puxadas por quatro cavalos cada. Continham mercadorias, frutos de manufaturas dos homens artesões e safras do sudeste.
As pessoas que viam atrás, alguns eram pastores, mas não guiavam nenhum rebanho, eram três os pastores e mais suas famílias, duas mulheres e algumas crianças que levavam roupas em pequenos fardos nas costas.
Valco se aproximou dos cavaleiros, a uma distância de setenta metros e disse uma saudação com grande voz.
- É um belo dia, cavaleiros!
O primeiro respondeu:
- Que a fênix abençoe a sua colheita.
E Valco novamente:
- Quais as notícias do Sudeste?
- Queira ouvi-las apreciando um belo chá? – disse o forasteiro.
Quando se aproximaram Valco ficou um tempo em silêncio olhando para os peregrinos e eles pararam e fizeram o mesmo. Um silêncio reinou por alguns segundos. Esses cumprimentos e estas trocas de palavras fazem parte do treinamento de cavaleiros. Tudo indicava que havia paz, por enquanto.
Em Castélia, o reino de Valco e em toda a Terra Gládia a figura de um cavaleiro era notável, sempre usavam coletes, perneiras e ombreiras de couro sobre a roupa, botas de couro e alforje. Sempre a cavalo. Espadas, facas, arcos e flechas também eram comumente usados. Sua fala era sempre direta e objetiva, não faziam muitos rodeios e ostentavam sempre um ar grave e austero no rosto.
Trocaram cumprimentos e senhas costumeiras. Só um cavaleiro treinado entendê-las-iam.
Valco colocara sua faca na bainha. Havia pegado antes de começar a falar com os cavaleiros. Os cavaleiros fizeram o mesmo com as espadas.
- Venham! – disse Valco num alto e bom tom – tenho fogo e água preparados, estou sozinho e no meio de um café da manhã. - Era quase nove horas. Valco confirmara isso olhando para o sol sentando à beira da fogueira. Embaixo de um Ipê amarelo.
Os ocupantes da caravana encheram o lugar, os homens adultos sentaram com Valco à beira do fogo, uma das mulheres foi até a nascente lavar roupas enquanto a outra fazia um chá. Portaventos pastava com os outros cavalos que foram precisamente despojados de seus arreios. As crianças brincavam por perto com espadas de madeira e gritos de guerra. As batalhas e as Guerras parecem fazer parte do cotidiano desses meninos – Pensou.
- Qual o seu nome forasteiro? – Perguntou um dos cavaleiros. Não o que o saudara. – Ou é peregrino aqui?
- Nenhum dos dois. – disse Valco – Sou nato destas paragens. Do reino de Castélia. Valco é meu nome. Valco dos Ventos.
Deixara o sobrenome Renyn para trás, como aconselhara o mestre. Era perigoso usar seu próprio sobrenome e não faria diferença em lugares estranhos.
- E vós, quem sois?
- Sou Maitran, o Negro. – disse o que o saudara no caminho. – Este é Falian, meu irmão, o Severo. Um homem de grande valor e soldado corajoso, muito importante para o nosso seleto grupo – disse apontando para o que pedira o nome a Valco. – Os outros três cavaleiros são amigos nossos e soldados também; Fenos, o Justo; Belarco, o Caçador e In’carvalho, o Touro. Os dois moços são os cocheiros Collen e Benah.
Os pastores são Peloponeso, o Velho; Miró, o Contador e Cachetto, o Virtuoso. Perambulam conosco a procura de trabalho. As mulheres são Fairah e Benca, as crianças são Fabian, Arthur, Legho e Thudo.
E eu sou o capitão desta caravana.
- Muito bem, Maitran – disse Valco animadamente – Bem sei que não decorarei metade dos vossos nomes, porém não esquecerei cada um dos seus rostos, creia nisso. Caminham para o oeste enquanto eu venho de lá, nossos caminhos se cruzam, obra do poder da poderosa e divina Fênix. Devo então dizer que há um dia deparei com cinco Morlocs, batedores ou espiões, ou Warlocs talvez, iam para oeste.
- Muito obrigado por nos alertar, portador dos ventos - disse o capitão - Ficaremos atentos na nossa jornada. Podemos dizer que quase chegamos ao nosso destino. Terminaremos a nossa jornada em breve. Ou morreremos tentando.
- Sábias palavras! – disse Valco – E quais as novas do Leste? E do sul?
Antes que alguém respondesse, uma das mulheres veio com chá, uma menina de uns doze anos trouxera uma cesta com bolos. Serviram-se e a menina sentou na roda olhando para Valco, que a observou por um instante.
Algumas mechas de cabelos, lisos e duros, desciam pela testa da garota, despenteados e semi-amarrados. No rosto da menina o suor e a poeira da estrada deixaram algumas manchas como raias marrons que iam das bochechas para o queixo. As pequenas, porém calejadas mãos da jovenzinha, denunciavam que precocemente ajudava no trabalho. As roupas eram velhas, mas bem limpas.
- O que haverá de ter em Castélia que não haveria no leste, capitão? – disse Valco pensativo – Há rumores de uma guerra, e de uma sangrenta batalha no reino e temo que não haja um futuro muito próspero em Castélia. Nem para ti ou para estes pequenos.
- Para a esperança não existem marcos cavaleiro – disse o capitão. - Que haja um lugar para um pouso somente, em suas terras. – disse o mais novo – Temos mãos para o trabalho e um pouco de habilidade, não será difícil plantar o que comer. – explicou-se, mostrando ambas as mãos para Valco.
- Depois nós nos arranjaremos. Ouvimos falar de Castélia, que lá tem comércio, temos alguma coisa para vendermos, faremos um dinheiro para começar.
Valco olhou novamente para a menina e disse:
- Anseio que mãozinhas tão frágeis não se esforcem muito no trabalho senão não haverá nem mesmo um futuro inseguro. Qual o seu nome menina?
A garota baixou o rosto, todas as crianças criadas pelos cavaleiros sabem que não podem falam diretamente com um adulto. Assim são ensinados pelos mestres de Castélia e também por toda a Terra Gládia. Até onde houver a boa educação.
Esperava uma aprovação ou mediação de um adulto.
- Permito que fale! – Ordenara o capitão – Saúde-o.
- Que a Fênix ilumine seus caminhos, cavaleiro! – disse a menina fazendo uma reverência, com os dois joelhos no chão e tocando o pé de Valco com a costa do punho – Meu nome é Fabian, a Guerreira, ao seu dispor.
- Pode se levantar garota. – disse Valco – Não sou da nobreza nem tenho tanta ocupação que careça dos seus serviços.
A garota é filha de um dos pastores, Cachetto, o virtuoso e sua mãe é uma das mulheres. Precisamente a que lhes serviu o chá. Fairah, mãos de Ouro.
(continua...)