O Inferno dos Gnomos - Parte 04
superstição
Quando anoiteceu, Miphelangel escutou batidas na janela do seu quarto e abriu, seu coração pulou, era a moça que te chacoalhava o interior:
-Morah! Já esta tarde, vá embora, o louco do silencio deve estar rondando – disse cercando os olhos pela rua.
-Eu precisava vir – Disse Morah com o tinir dos brincos argolados escondidos por cabelos negros – Fiquei sabendo, que amanhã vai alem do reino, Verdade?
-Sim, vou sim – Desejou que o mundo parasse o tempo no “hoje” para sempre.
-Nossa, me conta como é lá quando voltar? – a curiosidade brilho pelos olhos.
- Ah sim, eu conto –“se eu voltar né” pensou.
-Nossa Miph, queria viver uma aventura dessas com você.
-Morah, eu queria viver uma aventura só... - “com você” pensou, mas... deu branco – aqui em casa em segurança – Morah riu.
Miphelangel olhou pro chão, raciocinou algo. Parecia longe. Voltou a olhar pra Morah e perguntou:
- Morah, o nômade que me curou, como ele era?
- Estava com manto escuro e longo, mas nada chamativo. Devia ter entrado no reino escondida, por isso estava toda coberta. Tinha também uns panos no rosto, acho que fingia ser queimaduras, mas duvido que seja.
-Mas isso não comprova que ele seja nômade – desconfiou Miphelangel
-Comprova sim – disse sorrindo com tom harmonioso – pois tinha uma voz suave e melódica nunca visto em Prata, e não é ele Miph, é ELA.
As coisas começavam a se encaixar, mesmo de forma supersticiosa para Miph .“Ela?” Refletiu... O pai de Morah apareceu do outro lado da rua banhado a lua, deu bronca na moça e já ia levando pelo braço quando Miph Gritou:
- Mas isso ainda não prova nada! – debruçou na janela
- Eu sei, mas a mecha de cabelo que escapou dos panos comprova - gritou a moça se esforçando para olhar pra traz, retida pelo braço do pai que a puxava para casa - não existe moças ruivas aqui no reino - e virou a esquina.
“Ruiva?” se assustou, não é possível. É muita coincidência. Entardeceu pensando nisso, naquele frio de entrar nos poros, no silencio de ampliar a imaginação e no desespero do amanhã. Por cerca de uma da madrugada, Miph adormeceu, e não escutou os gritos da vitima do louco do silencio naquela noite, pelo menos não consciente, por que todos os berros ecoaram no seu companheiro pesadelo.
Escravidão e Liberdade
Miphelys já tinha ido para seu posto, e a casa ficou só com Miphelangel, que estava comendo um pão de sal assado na hora por ele mesmo, o cheiro quente tomava ar. Após comer Miph ficou um tempo estirado na cadeira fadigado, mas não por muito tempo, pois ouviu som de cascos do lado de fora da casa que parou em frente à porta fechada.
- Miphelangel! – gritou a voz do outro lado da porta – Temos que ir, estamos atrasados!.
- Já vou! – gritou Miph. Já quase se desacreditara que teria de ir alem dos muros com os escravos, afastar as arvores. Era época de ataques dos gosmentos alem das muralhas, e para proteger o reino deles, mandavam pessoas sem valor, como escravos, para cortar as arvores, que assim caso fosse morto por um gosmento não faria diferença a Prata. As madeiras eram trazidas para dentro e vendida e com um campo mais aberto pela ausência das arvores, daria para visualizar melhor os inimigos que quisessem penetrar o reino, em especial, os gosmentos.
Miph Colocou roupas velhas com o intuito de preservar as novas, da sujeira do mundo aberto. Abriu a porta e viu uma carroça formigada de escravos imundos e fedendo a esterco. O capitão, chamado Alawyer, fez algum gracejo rústico e pediu a Miph para que suba, mas não ousou chama-lo de Ashwine, provavelmente conhecia Miphelys.
A carroça começou a desfilar pelo reino rumo ao portão principal. O som dos cascos chamava atenção das pessoas. Miph ficou em silencio no meio dos escravos, esmagado pela falta de espaço, com suor se misturando na pele quente do vizinho. O transporte desajeitado balançava de um lado para o outro, e às vezes saltitava com os buracos na rua. De minuto a minuto mais carroças lotadas, saiam das esquinas em destino ao portão principal. Todas somavam seis carroças.
A Rua oito A, estava um enxame, pessoas de todas as classes para todos os lados. Aqui vive cheio por ser a Rua das Artes, havia teatro, musica, dança, historiadores, tinha de tudo nesse ramo. La longe perto de um prostibulo Miph viu Bryan com um sorriso malicioso no rosto. Os olhares se cruzaram. Aquilo causou uma profunda ira no intimo de Miphelangel, mas por fim o medo veio e o sentimento se transformou em submissão. Logo uma moça linda e morena puxou Alincer pelo braço e lhe deu um chupão no pescoço, outra o pegou pelo outro braço e trocaram línguas. Bryan voltou a olhar para o garoto, riu e cuspiu. As moças Puxaram o cavaleiro, que agora vestia capa Roxa, e o levou para a casa dos prazeres. Miph abaixou a cabeça, e negou o mundo.
- Garoto, onde esta sua arma? – perguntou um escravo sem camisa, descalço, usando apenas calça rasgada.
- Não trouxe – respondeu levantando a cabeça – e você cadê a sua? – O escravo mergulhou os dedos no esterco fofo ao chão da carroça e puxou uma adaga enferrujada.
- Aqui está. E tem mais varias aqui embaixo, cada trabalhador trouxe a sua.
- Posso me defender com o machado de arvore – sugeriu Miph.
- O haste é de madeira, os gosmentos derretem.
- Como são os gosmentos? – Perguntou Miph, temendo a resposta. O homem ficou em silêncio por segundos analisando a face do novato.
-Eles são...- Disse escolhendo as palavras – parecidos conosco... só que com um pouquinho de... fome a mais. – O homem parecia ter poupado a imaginação de Miphelangel.
- Cavaleiros estarão lá?
- Não
- Nem capas brancas?
- nenhum.
A carroça já estava perto do grande portão de madeira, defendido por estacas de ferro no topo. O Capitão da primeira carroça gritou algo para o guarda porteiro que estava numa torre próxima, e ele abriu os portões, que rangeram trazendo a Miphelangel o frio de enfrentar o desconhecido, afinal a maioria das pessoas não foram alem dos muros e ele era mais um inocente cheirando a Prata. O caminho já estava livre, já se via as arvores densas praticamente beijando os muros. A segunda carroça já atravessava, e a do novato era a terceira, que quando ia passando, um Cavaleiro gritou vindo das ruas de trás.
- Capitão Alawyer, só um minuto! – gritou Miphelys caminhando a passos longos, fazendo flutuar a capa verde de que tanto se honrava. Aproximou-se do irmão.
– Miphelangel, como pode? Dinheiro jogado fora Miphelangel, fora! Eu te dou força, pago professores e você me retribui com isso?
Os escravos observaram o discurso de Miphelys. Miph pensou em responder algo mas ... deu branco e o cavaleiro continuou.
-Toma! – jogou como um ataque, um pergaminho amassado no irmão – Fique com isso de lembrança. E se puder me faça um favor!
-Favor? –se perdeu.
-É. Se encontrar um gosmento, sirva-se de alimento para ele – E deu as costas, a capa fez um som com a rigidez, e se foi a em andar firme.
Os escravos, com calças velhas e sem camisa desviaram os olhos e fingiram que nada aconteceu. Miph agradeceu internamente, se sentia compreendido. Abriu o pergaminho amassado, viu no topo escrito “Exame Casa Negra”, no pé, “Reprovado”, e mais uma vez se decepcionara consigo mesmo. Sua cabeça pesou, e a obrigou a abaixa-la novamente. Estava tão caído que, olhar para o chão em movimento, foi seu melhor consolo.
Continua ...