Sangue de Dragão - cap. 77

O General Mais Sombrio

Os dois dragões em corpos humanos entraram na montanha por uma passagem estreita em uma de suas encostas. Nenhum ser vivo parecia viver naquele lugar amaldiçoado, apenas a densa névoa, as árvores retorcidas e um céu escuro eram testemunhas do avanço de Balgast e Alzimuth. Há mil anos o Pântano do Fim não era assim. Aqui era uma região repleta de um belo campo verdejante, com uma flora e fauna abundante. Mas com a chegada da Guerra Draconiana tudo mudou, pois as forças do mal se instalaram neste lugar sob o comando de uma personificação das sombras chamada Sirek.

Temido até pelos seus irmãos maiores, Sirek, também era conhecido como a Adaga de Zagaroth, o Lorde Negro. Tinha como principal missão realizar assassinatos dos mais importantes heróis e reis humanos. Muitos homens de valor caíram sob sua magia negra, incluindo os primeiros seis reis que formaram a aliança entre humanos e o Povo Ancestral. Sob as ordens diretas de Sirek também estava o conhecido e repugnante Calabouço das Profundezas, onde o dragão mantinha seus prisioneiros a mercê de terríveis torturas e onde também realizava seus experimentos na criação de perversas criaturas híbridas, verdadeiros flagelos nos campos de batalha.

Balgast não acreditava que pudesse ainda sentir as energias de Sirek, mas sabia que ele tinha se refugiado em suas masmorras no final da guerra. Diziam as lendas que tinha sido perseguido por um batalhão élfico armado com poderosas armas mágicas e que uma violenta luta foi travada nas portas do calabouço onde os elfos utilizaram toda sua energia vital para matar o perverso dragão. Parece que não tiveram êxito, apenas conseguindo aprisionar Sirek.

Balgast e Alzimuth andaram por túneis tortuosos e sombrios, sempre descendo e descendo até chegarem a uma imensa caverna a muitos metros de profundidade. Uma luz sobrenatural iluminava o local, mas os dragões sabiam que emanava do próprio Sirek. No centro da caverna existia uma imensa construção de rocha, na verdade um sarcófago coberto por inúmeras inscrições rústicas representando a língua profana criada por Sirek para falar com suas criaturas. Balgast identificou as inscrições e deu um leve sorriso, lembrando do quanto seu irmão era excêntrico em suas criações. O quanto o Quinto possuía de maldade também tinha de presunção.

---- Então os malditos elfos não conseguiram destruí-lo --- falou Alzimuth.

---- Sirek sempre foi um general precavido. Trouxe a batalha para suas portas porque com certeza tinha planos para se defender. Ele possuía muitos servos aqui --- disse Balgast olhando em volta.

---- Devem ter realizado a última luta pelo seu mestre e cumpriram seu papel --- Alzimuth caminhou em direção ao sarcófago, já começando a sentir com mais intensidade as energias do quinto general. Balgast não o acompanhou, pois começou a sentir outra energia se formando no ambiente. Levantou a cabeça e avistou logo acima de onde Alzimuth se encontrava algo grande se movendo, saindo de uma toca escura no meio da rocha.

---- Olhe para cima! --- alertou Balgast calmamente.

Uma imensa sombra se jogou das paredes da caverna e caiu rapidamente sobre Alzimuth, provocando uma explosão de poeira e rochas partidas. Quando a fumaça se dispersou, uma estrutura de pedra tinha sido erguida pelo segundo general, protegendo-o do impacto. Ao lado se encontrava uma grande serpente gigante de duas cabeças. Sua mandíbula aberta ameaçadoramente e mostrando suas presas pontiagudas. Os olhos vermelhos da criatura exalavam fúria. Balgast a encarava seriamente.

“Seu principal bichinho de estimação ainda está vivo, não é Sirek” pensou o primeiro.

A fera avançou na direção de Balgast, mas foi interrompida quando a redoma de Alzimuth se desfez e vários pedaços de rocha voaram e se chocaram contra seu imenso corpo reptiliano. A serpente foi arrastada alguns metros para trás e esbarrou-se contra a parede lateral da caverna. As pedras incomodaram, mas não fizeram nenhum dano sério à criatura, apenas deixando-a mais furiosa.

A serpente avançou com rapidez mostrando seus dentes e salivando bastante. Surpreendentemente Alzimuth aguardou a chegada da cobra. Ela deu um poderoso bote quando o segundo interceptou sua imensa cabeça com um soco igualmente forte. O impacto gerou uma onda de choque, criando uma cratera no chão onde o corpo de Alzimuth afundou até a metade. Com sua segunda cabeça a serpente realizou um novo ataque. Desta vez Alzimuth não tinha como se defender e resolveu esquivar do golpe sumindo para dentro do chão. A cabeça da serpente gigante atingiu o local onde ele estava com mais uma explosão de poeira. Balgast acompanhava tudo a distância pacientemente.

Segundos depois Alzimuth apareceu logo atrás da fera surpreendendo-a com um ataque no qual criou uma grande bola de pedra, arremessando-a contra seu oponente. Mas a temida serpente de duas cabeças de Sirek também tinha suas estratégias interessantes. Prestes a ser atingida pela bola mortal, a criatura dividiu seu corpo esquivando do golpe. A grande bola se chocou contra a parede vários metros a frente numa explosão forte.

Como um raio as serpentes atacaram pelos flancos de Alzimuth. A da esquerda se enrolou em seu corpo num abraço constritor, já a da direita abriu sua grande boca e esguichou um jato de um líquido viscoso e escuro como breu. Era seu poderoso veneno, capaz de matar um pequeno exército de homens. Para escapar daquela situação difícil, o segundo general apelou para uma de suas técnicas mais poderosas, que consumia muita energia. Era sua única chance naquele momento.

Numa fração de segundos Alzimuth dispersou uma quantidade imensa de sua própria energia mágica no ambiente a sua volta. O corpo da serpente foi rapidamente se transformando em pedra e depois se esfacelou em vários pedaços, libertando o dragão de seu abraço mortal. Alzimuth caiu no chão bem no momento em que viu o jato de veneno passar por sobre sua cabeça e atingir a parede da caverna, provocando uma coluna de fumaça ácida. O segundo general ofegava cansado, mas a grande serpente não lhe deu trégua e avançou como um raio em sua direção. Desta vez Alzimuth não teve como esquivar e foi atingido pela cauda da fera, sendo arremessado contra o sarcófago. O impacto danificou a estrutura derrubando o que parecia ser a tampa da tumba no chão. Uma estranha fumaça escura saiu de dentro do imenso caixão de pedra.

Alzimuth não tinha percebido o fenômeno, pois estava concentrado na serpente gigante a sua frente, que estranhamente parou de atacar e ficou mais calma. Ao perceber que algo acontecia atrás dele, o segundo general foi surpreendido por uma cauda draconiana que se enroscou em seu corpo, começando pelos pés até chegar à cabeça, exibindo em sua ponta um grande e assustador ferrão negro de onde pingava o mesmo líquido viscoso disparado pela serpente anteriormente. O restante do corpo do dragão apareceu lentamente de dentro do sarcófago. Não era tão grande quanto Balgast ou Alzimuth em suas formas verdadeiras, mas tinha um aspecto amedrontador, com suas escamas pálidas e vários chifres na cabeça.

Sirek tinha despertado. Alzimuth cerrou os olhos. Pensava em utilizar mais uma vez sua técnica de petrificação, mas foi interrompido pela voz da Balgast.

---- Não faça nenhum movimento brusco ou morrerá instantaneamente. O veneno que o nosso irmão carrega em seu corpo foi criado pelo próprio Lorde Negro através do seu sangue. Ele não destrói apenas a parte física, mas também a essência energética de quem toca. Você morre por completo.

---- Quem.....são.....vocês?! --- Sirek falou com sua voz arrastada.

---- Seus olhos podem te enganar irmão, mas está diante do Primeiro e do Segundo generais! --- explicou Balgast. Sirek o encarou e deu uma risada sinistra que ecoou por todo o lugar.

---- Talvez uma demonstração fale mais alto do que minhas palavras --- Balgast fechou os olhos e ao abri-los já tinham o aspecto dos dragões. Logo após o primeiro general liberou sua energia escarlate, que subiu a grande altura e formou sua antiga aparência ancestral de dragão, um imenso dragão vermelho. Sirek observava seriamente aquela grande forma a sua frente sem se abalar.

---- Ora....ora....ora......é você mesmo Primeiro...embora me pergunte....como rebaixaram tanto sua forma física --- Sirek também olhou para Alzimuth logo abaixo ---- Ah....me perdoe....Segundo...pela minha falta de delicadeza.....é que pensei que vocês fossem o que parecem ser.....humanos.....e como não me encontro em...minha melhor forma......precisava me precaver....eu e minha querida Zaraka --- a grande serpente se aproximou do seu mestre e o reverenciou baixando a cabeça.

Sirek afastou a cauda de Alzimuth. O segundo general suspirou de leve aliviado. Balgast retraiu sua forma de energia e voltou ao normal.

---- Foi difícil encontrá-lo irmão. Seu corpo está em alto estado de deteriorização e sua essência mágica se enfraqueceu também. Mas ainda há uma esperança, que como brincadeira do destino veio de um ritual mágico humano. A Junção.

---- Entendo....... --- falou Sirek, que se manteve por uns instantes pensativo ---- Você sabe......que sempre fui um sobrevivente por excelência....portanto....onde está....meu hospedeiro.

Balgast olhou para Alzimuth. O segundo tirou um pergaminho do manto e o abriu no chão revelando alguns símbolos inscritos. Logo em seguida bateu com a palma da mão sobre o papel, gerando uma pequena explosão de fumaça branca, de onde surgiu o corpo de um homem de cabelos longos, lisos e pretos, albino e de estatura mediana. Sirek olhou aquele corpo humano com certa admiração. Parecia tão asqueroso quanto ele.

---- Não foi fácil achar algo que lhe agradasse --- falou Balgast.

---- Mas você sabe que para mim tudo tem um preço, Primeiro --- disse Sirek.

---- Eu te conheço irmão. Então, Quinto, o que quer para aceitar me seguir?

---- Presa Negra --- respondeu o dragão branco.

MiloSantos
Enviado por MiloSantos em 13/10/2011
Código do texto: T3274441
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