O Príncipe Aleste
Em um reino havia um príncipe, seu nome era Aleste, ele tinha de tudo menos o que mais queria: a felicidade.
Um dia cansado das bajulações da corte e das tentativas de seus pais em deixá-lo alegre, o triste príncipe foi à uma sacada do castelo e pediu à rainha da fadas o seguinte:
- Rainha das fadas desejo ser o homem mais feliz do mundo.
Sem esperar por resposta, uma luz que pairava no ar apareceu e dela saia a voz mais doce que ele jamais tinha ouvido, dizendo:
- Belo príncipe Aleste, concedo-te este desejo, compadecida de teu infortúnio.
- Obrigado doce e clemente rainha. Obrigado, te cobrirei de ouro em agradecimento, temos um tesouro inestimável em nosso reino.
- Agradeço sua oferta, mas não estou lhe dando nada além de uma oportunidade, tua felicidade irá custar você encontrar uma alma tão triste quanto a sua, despojado de seus recursos e de suas riquezas eu lhe guardarei em segredo por tua jornada e iremos atrás desse achado que me fará lhe conceder tua felicidade.
- Sim eu assim o farei.
E naquela hora tarde da noite, o príncipe alertou o rei e a rainha de suas intenções e que não se preocupassem, assim vestido de mendigo e levando consigo apenas alguns pães, um pouco de carne seca e dois quilos de moedas de ouro o príncipe deixa o palácio no anonimato.
Rumando para o Sul, ele foi abordado por dois ladrões que o bateram e o roubaram, levaram o ouro e o alimento, não adiantou ele dizer que era filho do rei, eles não acreditaram.
Ficou caído na estrada por dois dias, uma de suas pernas doía demais, se arrastou até embaixo de uma árvore e ali ficou com fome, se lastimando por não ter sido protegido pela rainha das fadas.
Considerava-se logrado, vi-se um idiota que foi ridicularizado por uma fada metida à rainha.
Ninguém passou na estrada, o ferimento na perna, a sede e à fome o levaram à desfalecer, sentia frio, era a segunda noite ao relento, gritava por ajuda mas ninguém o ajudava, desmaiado sonhou com seus favores reais, com sua mordomia, com suas regalias de nobre, nos sonhos ele tremia de frio pensou estar morrendo, quando começou a se sentir aquecido, a se sentir mais confortável e com menos dores na perna.
Acordou com uma mulher que lhe oferecia água, não estava mais ao relento, mas em um casebre, aquecido por uma lareira central.
- Que bom que você acordou, começou a nevar lá fora, caído daquele jeito certamente os lobos o devorariam, há muitos lobos por aqui, você teve sorte em não ser atacado.
- Onde estou? Quem é você?
- Me chamo Veola e você estranho está na minha casa, eu o achei catando lenha e amoras antes que congelassem há quase uma milha daqui. Como você se chama?
- Me chamo... – mas antes de dizer ele pensou nos perigos de se revelar um nobre a uma plebéia desconhecida, ela poderia ser parte daquela corja que o roubou e o seqüestrarem para pedir resgate – me chamo Alef.
- Prazer em te conhecer Alef, sua perna não está bem, talvez esteja quebrada, você deve ter aprontado para ter apanhado tanto.
- Fui assaltado na estrada onde me achou. Você mora sozinha.
Apreensiva com a pergunta e o levantar do rapaz ela se pos na defensiva:
- Sou uma viúva moço, pessoa de respeito, meu menino foi caçar, as coisas aqui não são fáceis, mas podemos nos dar ao luxo de ajudar um desconhecido, tome a sopa que fiz.
A sopa parecia estranha ao paladar refinado do príncipe, mas ele tomava a sopa, quando a porta abre e entra um menino de mais ou menos 8 anos.
- Senhor Alef, este é meu filho Cícero.
- Mãe, não consegui apanhar nada com o arco, nem as armadilhas de coelho tinham alguma coisa.
- Tudo bem filho ainda temos os repolhos que colhemos antes da neve os estragar, amanhã você consegue algo. Este meu filho é o senhor Alef.
- Muito prazer senhor, como o senhor foi parar lá na estrada sozinho e ferido, foi atacado por um urso ou caiu do cavalo?
- Fui assaltado.
- Assaltado? Mas o que roubariam de um mendigo.
- Minhas poucas posses.
Calaram-se e em um silêncio quase tumular terminaram a refeição, no dia seguinte Veola trocou as ataduras de Aleste e o alimentou, havia um retrato pequeno na prateleira que deveria ser do marido morto de Veola.
Ela sempre chorava perto dele, e ele mesmo mancando passou a ir com Cícero caçar e coletar lenha e frutas silvestres.
Passaram-se semanas felizes a perna de Aleste fora ferida, mas não estava quebrada, até que uma noite, entram pela porta os mesmos ladrões que roubaram Aleste.
- O que é que vocês querem aqui?
- Viemos buscar o pagamento por sua segurança Veola. O que é isso, você agora tem marido novo em casa?
- Ei Pólux, veja, é o vagabundo ladrão de ouro que pegamos na estrada.
- Então você agora sustenta um mendigo e não quer pagar a gente.
Bateram em Aleste e Cícero por tentarem defender Veola, depois bateram na pobre mulher e fizeram dela o que queriam. Pegaram todos os víveres e saíram rindo pela noite gelada.
Com o rosto seriamente ferido, Aleste correu pela neve em rumo ao castelo, com medo e com fome, bateu às portas da morada dos nobres como ele, não foi reconhecido:
- Suma daqui, seu mendigo imundo! – disse um dos guardas.
- Eu sou o príncipe Aleste seu insolente, abra antes que eu mande cortar sua cabeça.
- Ha, ha, ha, suma daqui antes que atiremos em você e deixemos seu corpo aí caído até amanhã – atiram pedras e uma caiu na cabeça de Aleste que correu desorientado em meio a flechas que foram atiradas contra ele.
Aonde iria? Estava mesmo perdido, nem em sua casa podia voltar, maldita rainha das fadas, deveria ter jogado sobre ele uma maldição para não ser reconhecido em casa, o frio aumentava à medida que as horas da noite gelada avançavam e Aleste não conseguiu chegar à casa de Veola e Cícero.
Achou abrigo em uma caverna onde ali ficou tremendo até de manhã em meio as suas mais amargas lágrimas de arrependimento, tinha tudo, era feliz e agora não tinha mais, era um mendigo, por sorte tinha alguns que o queriam bem, mas e agora que tinha fugido com medo, o receberiam de volta?
Mesmo assim arriscou, chegou à casa de Veola e a achou ali arrumando as coisas, varrendo, a porta meio caída e ela ali varrendo, com um semblante que misturava dor e disposição, os cabelos caídos em seu rosto, não tinha reparado como ela era bonita por trás de tanto sofrimento incrustado em sua sempre sorridente face. Veola pobre Veola, tão sofrida e tão disposta, poderia ser ela a alma tão triste quanto a dele, com certeza não, ela mesmo no infortúnio era feliz, ele era triste na fortuna que sempre teve.
Chegou perto de Veola, que lhe sorriu com vergonha, e disse:
- Me perdoe por ter corrido como um cão miserável quando vocês precisaram de mim.
- Eles já tinham ido, e ainda precisamos de você, temos muito a fazer, vá ajudar Cícero, ele foi ao rio pescar para podermos comer, eu vou acender o fogo para nos aquecermos.
- Eu vou, obrigado por tudo.
Tocou o cabelo de Veola e saiu pela porta, neste dia algo mudou em Aleste que agora era conhecido como Alef.
Pescou com Cícero naquele dia, caçou nas semanas seguintes, com o tempo fizeram um celeiro, um curral e com esforço compraram animas e plantaram, ajudou com Cícero a expulsar de vez os ladrões e deles tomou sua adaga de ouro e jóias, que foi vendida para sustentar o sítio em que viviam.
A vida seguiu e os anos se passaram, o rei recebeu de uns mercadores as roupas que o príncipe usava quando partiu e não poupou esforços para encontrar seu filho desaparecido, ofereceu ouro e títulos a quem trouxesse notícias do paradeiro de seu filho amado que partiu sem deixar rastros. Ele mandou muitos expedicionários a terras distantes, entrevistou mercadores de todas as partes sem sucesso.
Dez anos depois da sua partida, um cavaleiro chega doente no sítio de Alef, Veola e Cícero, chegou pedindo ajuda e caiu do cavalo, acordou no calor da cama da casa, viu um moço que disse:
- Alef, ele acordou.
- Que bom Cícero fizemos um bom trabalho, ajude sua mãe com a comida ou com seu irmão.
- Boa noite cavaleiro, está melhor?
- Ainda fraco mas melhor, quanto tempo fiquei aqui?
- Dois dias, foram dias de febre intensa, me chamo Alef, esta é minha esposa Veola e meu enteado Cícero e o nosso pequeno filho curioso Cristien.
- Dois dias! Preciso ir gentil senhor, o Rei está doente e preciso dizer a ele que não fui feliz em minha busca pelo filho dele que está desaparecido, o pobre homem não tem mais vida, o desespero é imenso e agora velho e doente vai deixar o trono sem herdeiro e uma rainha triste, lamento voltar para ser o portador de más notícias, mas que durma em paz sem a dúvida se fui feliz ou não.
- De onde você vinha?
- De uma aldeia há dois dias daqui onde foi encontrada nas mãos de um ourives a adaga do príncipe.
Ao ouvir isso Veola interveio:
- Como era essa adaga?
- Ouro branco, com duas safiras imensas e um rubi.
Assustada com a descrição Veola olha surpresa para Alef e ele lhe diz:
- Sim querida, sou eu, me chamo Aleste e sou o príncipe desaparecido.
O cavaleiro assustado disse:
- Eu achei que o conhecia milord, perdoe não o reparar, mas está um pouco diferente de barba. Precisamos ir ao castelo contar ao seu pai.
Todos foram e o rei deu uma festa de 14 dias em comemoração ao encontro de seu filho pródigo, Veola, Cícero e Cristien foram viver no castelo, o rei faleceu depois de um tempo e um dia já na velhice, na mesma sacada onde pediu ajuda, lembrou da rainha das fadas.
Eis que surge o clarão e a rainha das fadas reaparece.
- Por onde andaste? Me perdi, você me fez me perder, não achei ninguém tão triste quanto eu, mas achei minha felicidade rainha das fadas.
- Achaste a pessoa que escondia a tristeza e como eu te disse Aleste, nesta hora você acharia a felicidade, teve vergonha de seu passado de inconformidade com tudo que tinha e achou na pobreza e nas mãos de uma jovem viúva sua alegria.
- Sim, isso foi obra sua?
- Não Aleste, foi obra tua, quando esquecemos a soberbia e humildes nos tornamos, os tronos perdem o valor e a felicidade então se desenha porque sempre esteve ao nosso alcance.
Disse isso e se foi, Aleste foi o rei mais feliz e justo que um dia aquele reino conheceu.
Fim